Na Estrada

Seja lá qual fosse à idéia que cultivava na mente, ela saiu sem rumo de casa. Dizia que precisava de coisas novas e agradáveis. De fato, era verdade. Ela precisava parar de ouvir velhos discos, rever velhos filmes, e ler os mesmo autores. Repetia toda manhã para si "não quero mais isso pra mim", mas nunca era o suficiente. Nunca essa repetição a lançou para lugar algum que não fosse de um cômodo da casa para outro.

Quando surgiram os primeiros raios de luz entre as nuvens, avistou um livro sobre a mesa. Não lembrava se aquele livro tinha sido deixado por ela, ou quando foi deixado. Talvez Armando tivesse posto lá, numa das vezes em que "fizeram amor" sem compromisso. Grande coisa! Não era essa vida que ela sonhava, definitivamente. Tomou o livro nas mãos, constatou que ele tinha algo diferente. Era quente e novo. Livro novo? Porque não vida nova?Sim, claro.

Pegou a mochila, o livro, o carro e foi-se.

O som tocava "but you can say baby...baby can I hold you tonight", música maldita que ela gostava, mas abominava no momento. Bem que poderia tocar uma mais feliz, que não a fizesse repensar as atitudes. Queria mesmo era ouvir algo mais empolgante e menos nostálgico. Então começou a cantar bem alto outra musica que se encaixava melhor na ocasião. Sua voz era mais alta que o som do carro. Era outra coisa. Outra pessoa aparecia. Uma mais idiota, mais feliz e mais iludida.

Tudo que precisava era de um bar no meio da estrada, onde pudesse tomar um café forte e comer uma fatia de torta de limão, pensava ela. A combinação nem era das melhores... Mas tudo que queria era fugir da rotina de coca-cola light e torta de chocolate e cereja. Chega! Precisava dar carona a algum forasteiro e saber de suas historias. Talvez assim pudesse sentir o que é estar noutra pele, sentindo outra vida.

- Opa! Pra onde você está indo?

- Não sei! Saí de casa apenas, mas ainda pretendo voltar hoje mesmo! - mudou de idéia.

- Ah é? Então se você pudesse adiantar minha caminhada, ficaria grata!

-Entra aí! Por acaso você sabe se existe algum lugar na redondeza que venda torta de limão?

-Não. Mas posso te ajudar a procurar.

-Que ótimo então!

Ela era bem exótica. Uma mochila surrada, roupas sem combinação, cabelos desgrenhados e cheios de coisinhas coloridas. Não disse de onde vinha, e nem para onde ia. Mas, parecia estar feliz sendo nômade. Seu jeito liberto era tão fantástico e atraente, que despertava um sentimento de inveja dentro de qualquer um que vivesse preso a rotinas várias.

No fim das contas, a estrada não as levou a lugar algum. Nem a ela e nem a forasteira que encontrou. O dia inteiro perdido? Que nada! Não degustou sua torta de limão, acabou ouvindo velhas musicas, lembrou que o livro era dela e que ainda que estivesse bem conservado, era velho também. Lembrou-se que Armando voltaria fazendo tudo do mesmo jeito e que estava voltando pra casa. Só a forasteira foi novidade, mesmo sabendo que ela iria embora. Se é que ela iria embora um dia. Então chegou a conclusão que a velha-rotina-cansativa, não estava nas coisas. Era ela quem tornava as coisas sempre enfadonhas. Por mais que saia, ou conheça, ou se arrisque... Tudo sempre acabava na estrada de volta pra casa. Seu peito era velho demais para os sonhos novos que tentava cultivar.

Iris Helena
Enviado por Iris Helena em 09/06/2007
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