Auto julgamento
Na estrada para o tribunal, avistei um menino, brincando alegremente neste local estranho e sombrio, aproximei dele e lhe perguntei:
- Garoto o que faz aqui?
- Nada, estou brincando de Amarelinha, o senhor quer brincar comigo?
-Não, estou ocupado, preciso chegar logo ao tribunal.
Continuando meu caminho, percebi que aquele garoto me era familiar, e seu modo de agir sem se preocupar com quase nada, apenas em se divertir, me intrigava. No meio do caminho, encontrei-me com um homem. Aparentava ter 35 anos e estar nervoso. Seu carro estava quebrado e enferrujado, parecia estar parado ali há muito tempo, caminhei um pouco e ofereci-lhe ajuda:
- Olá, o senhor precisa de ajuda?
Rudemente o homem responde:
- Não, estou esperando meus amigos chegarem para me ajudar.
Continuei a caminhar e novamente me veio aquele sentimento estranho de já ter visto aquele homem e pensei comigo mesmo:
- Nossa, que sujeito mais grosso, não aceita nossa ajuda, quem seria louco para ser seu amigo?
Chegando ao tribunal havia uma placa que apontava para uma porta de vidro e nela estava escrito: A vida passa muito rápido. E depois que ela passar, já era, acabou.
Estranhando a placa, me pus frente a porta, observei minha imagem e refleti:
- Estou velho, como consegui caminhar aquela estrada até este tribunal? E aqueles dois, o menino e o homem, se parecem tanto comigo, será que... Não, devo estar enganado, o garoto realmente me fez lembrar a melhor fase da minha vida, minha infância, mas aquele homem não sou eu, eu não tenho amigos, como posso estar esperando por alguém?
Enfim, abri-a e cheguei a uma sala vazia e escura contendo apenas livros escolares, uma escrivaninha, cadeiras vazias e logo a frente apenas outra porta com os dizeres: “A morte nunca fala sobre si mesma. Ela só fala sobre a vida” – Rubem Alves.