O DIA D
Conto de Gustavo do Carmo
Esperava por esse dia há meses. Convidou todos os amigos e parentes que conhecia. Pelo telefone e pela internet. Comprou roupas novas especialmente para a noite de autógrafos.
Acordou confiante. O tão sonhado lançamento do seu livro seria à noite. Esperava vender, pelo menos, metade da tiragem de duzentos exemplares que mandou imprimir.
Sim. Foi uma tiragem paga, mas esperava fazer tanto sucesso que atrairia a atenção de uma editora disposta a contratá-lo e patrocinar a segunda edição. No evento também leria alguns contos. Selecionou os melhores e mais curtos, para não cansar os convidados. Os demais seriam reservados para a coletânea que pretendia lançar em breve.
Acordou confiante. Pediu folga no serviço de office-boy que fazia para uma firma de contabilidade. Queria estar de cabeça leve para o grande dia do lançamento. Não foi atendido pelo patrão mal-humorado. Foi trabalhar, mas não deixou a confiança, a ansiedade e bom humor de lado. “Quero ver todos vocês lá hoje à noite, hein!”, exigiu dos colegas. Convidou até o patrão, que em solidariedade, o liberou mais cedo.
Chegou em casa, pediu para a empregada passar a camisa social de seda vermelha e a calça de linho verde. Fez a barba, tomou banho, escovou os dentes, engraxou os sapatos. Colocou os quatro contosem quatro pastas com grampo. Arrumou-se. Vestiu o blazer que custou seiscentos reais e teve que pagar parcelado. A mãe, esperançosa, rezou ajoelhada pedindo a Deus que o filho fizesse sucesso no lançamento.
Colocou dois jatos de spray do perfume importado que ganhou de uma tia. Quis sair cedo para chegar com, pelo menos, meia hora de antecedência à livraria na Barra da Tijuca.
Pegou um táxi na porta de casa. Meia hora e trinta e cinco reais no taxímetro depois, chegou ao shopping que abriga a livraria. Acabou chegando uma hora mais cedo. O lançamento estava marcado para as dezenove horas. Encontrou a mesa pronta, os livros de capa verde empilhados em uma estante logo atrás. Os galhardetes com a chamada para o lançamento estavam ao lado da mesa e na vitrine da loja.
A livraria estava vazia. Os poucos fregueses que entravam sequer folheavam o seu livro. A mesa do lançamento parecia invisível para eles.
Às dezenove horas, a gerente da filial da livraria apresentou-se. Avisou que o autor já poderia sentar-se na mesa e esperar alguém pedir um autógrafo. Os editores não vieram. A diretora regional da rede de livrarias também não apareceu. Os parentes também não. Os amigos da faculdade muito menos. Os do trabalho não deram sinal de vida.
Já eram dez horas da noite. Não autografou nenhum livro. Não vendeu nada. Saiu em silêncio. Não leu conto nenhum. Não tocou uma palavra com a mãe dentro do táxi, no caminho de volta da Barra para o Méier.
Chegou em casa. Trocou de roupa. Tirou o blazer de seiscentos reais, a camisa social de seda vermelha e a calça de linho verde. Vestiu o short e a camiseta desbotada de casa. Calçou os chinelos.
Guardou toda a roupa nova no armário. Sentou-se no computador. Desabou. Chorou copiosamente.
No dia seguinte, voltou para a vida medíocre de office-boy que achava que largaria no dia anterior com o sucesso do livro. Acordou para a realidade.