GATO
Li, algures,
que a palavra gato
é a mais perfeita da língua portuguesa,
no que se refere símbolo/imagem.
Talvez.
Essa noite um gato atazanou meu sossego;
essa manhã atazanou-me minha mulher.
Tudo por causa do gato.
Apareceu aqui,
No meu quintal,
No meu telhado,
No meu muro,
um gato.
Cinza, listrado.
Gordo e sadio.
Adulto.
Delicia-se a desfilar pelo muro,
como uma deusa,
(Seria uma gata?),
de modo a ser vista pelos cães.
Depois deita-se nas alturas,
a mirar paisagens,
A lançar o rabo para baixo,
A balançar, prá lá, prá cá.
Cães a enlouquecerem,
A não alcançarem.
O gato sabe e disso
se aproveita.
Não crio gatos;
só cães.
Em casa
o único gato sou eu.
Gato velho,
a dormir sobre o saco,
como gato de armazém.
No entanto deve haver um gato em cada casa,
não só para espantar as ratazanas,
(gato ainda come rato?),
mas também por sua beleza.
Em atitude de repouso,
o gato é benéfico ao homem e a mulher.
Ás mulheres ensina-as a caminhar solene,
Passo levíssimo,
cauda erguida em ângulo certo,
a pausa repentina,
o olhar ligeiro,
tranqüilo sob o ombro esquerdo,
e,
finalmente,
a atitude magnifica com que,
cerimonioso,
enrola-se a um canto.
Mulheres, desde o tempo das cavernas,
aprendem a boa lição,
de postura e elegância
com ele, o gato.
Poucas são as pessoas
que compreendem perfeitamente a arte do repouso.
Principalmente nos dias de hoje
tão agitados.
Mas, quando o gato resolve descansar,
não se limita a ficar deitado,
derrama-se.
Amolda-se ao chão ou lugar que escolheu.
Como se fosse água.
Só de olhá-lo sentimos calma e serenidade.
E ele olha para nós,
com aquele olhar lânguido,
e nos manda uma mensagem telepática:
"que calor, meu senhor".
E quando quer distrair-se,
e diverte-se como poucos,
escolhe aborrecer cachorros.
Por natureza idiotas.
Ou faz como esse gato danado,
que aportou em minha casa.
Desfila tranquilo,
pelos caminhos onde há segurança,
vai até a garagem
e escolhe o carro mais novo,
ou aquele ao qual mais gostamos.
Porque gato tem sexto sentido...
Olha-o
e arrisca um salto.
Claro,
é treinamento.
Porque irá repartir a tarefa
várias vezes.
Alcança o capô,
de pintura metálica e lisa,
e escorrega.
Aciona as unhas afiadas,
Nas quatro patas,
A calcá-as na lisa pintura,
A deixar a gravidade fazer o resto.
Ou seja,
Desliza ate cair.
Com as unhas a fazer:
Créééééé ...
A riscar a pintura.
E torna a subir,
E a patinar,
Para que os riscos
Apontem em toda direção.
E fiquem emaranhados
Difíceis de recuperar.
Quando se firma,
No capô mais elevado,
Derrama-se,
Como água,
E dorme,
Tranquilo.
Se acordá-lo
por certo dirá:
"algum problema, meu senhor!"
Sajob - fevereiro ou março 2015
Sei lá !