Almoço à portuguesa
Cioso de suas raízes lusitanas - que se encaixaram e se mesclaram bem no pluriétnico Brasil, Arimndo Branco primava por receber e entreter. Diplomata de carreira, não podia ter feito escolha mais certeira.
Alternando passagens pelo Brasil com prolongadas permanências no exterior, foi refinando postos e gostos, no que era muito bem assessorado pela companheira Maria Amarante, descendente direta do mais alto pedigree autóctone, com um adocicado pendor por tudo de europeu - y compris la langue de Montesquieu.
E justo quando serviu no mais alto cargo da diplomacia, em Varsóvia, e ascendido a decano dos Embaixadores latinos, coube a Armindo, fazer um almoço de despedida para o colega luso, que encerrava sua missão na capital polaca.
Bacalhau, o gadus morhua, ou o mais fino do Porto, foi a escolha do menu, para se não romper um tabu. Nada de feijão com angu. E vinho verde para acompanhar. E para completar menção à cozinheira, cabe paragrafar: era uma exímia Panie (Sra) Teresa, com certeza polonesa, mas que surpresa: tudo assimilava e se pouco da cozinha saía é medo da cobiça alheia que a cabeça de Armindo presidia, pois já houvera antes tentativa de suborno por parte da representação belga para subtraí-la da casa brasilis, com vantagens ostensabusivas a ela oferecidas.
E vamos ao plat de résistance, servido avec toute élégance: um show de apresentação e de nutrição. Os vinte e tantos convivas, enquanto se refestelavam daquele sabor inigualável, mal antegozavam a sobremesa, crème brulée, que acabava de ser servida. Ah, isso é que era ser vida...Até serem interrompoidos pelo anfitrião, que em breve discurso, saudaria o colega partente.
Poucas e sucintas, mas acertadas palavras agradecendo o Dr Manuel pelo prazer de sua companhia, desejando-lhe renovados êxitos profissionais na volta ao torrão natal e, finalmente, estimando que lhe houvesse sabido bem a bacalhoada. E palmas, de cambulhada.
Ao tomar a palavra, entre o feliz e o atônito, dom Manuel, agradeceu, fez alusão ao companheirismo desfrutado ao longo de seus três anos varsovianos e, candidamente, reconheceu:
- Mas que bela surpresa, meus queridos Armindo e Maria, foi perfeita a vossa recepção, comida, vinho e companhia deliciosos, entretanto, somente agora, ao ouvir, foi que me veio esta revelação: como eu comi somente do que estava por cima da travessa, as deliciosas rodelas de batata, é que venho de perceber que, no fundo, no fundo bacalhau havia...