REVÓLVER, CORDA, COMPRIMIDO OU POESIA?
O poeta sorri e levanta. Talvez tenha sonhado com ela. Toma café e caminha até o telefone, 3325... Mário ou Regina, por favor. O estúdio novo fica pronto só daqui a 30 dias, vamos te ligar, seu currículo está na pasta verde. O poeta levanta do sofá, toma mais uma xícara de café, caminha até o quarto e para no beiral. A cama está vazia, o retrato continua virado de costas. O quarto do poeta é marrom e pastel, como tudo na sua vida sem graça. Ele volta a dormir, pensa em sonhar com o futuro, reza, porém começa a perder a esperança.
Tem acupuntura depois do almoço, mas o poeta sequer almoça. Levanta, escova os dentes, toma mais meio litro de café e chama um táxi. Dez agulhas espalhadas pelo corpo e meia hora de sono tranqüilo, ar condicionado no máximo, pés gélidos e música sacra. O poeta não consegue dormir e lembra que sequer teve um trocado para a gorjeta do taxista, a rádio tocava Tom Jobim, o coração tocava em ritmo acelerado por sair de casa.
O poeta pensa em ligar para a sua ex-mulher, número cinco na discagem rápida, e quantas vezes ele ligou fingindo que é engano já nem lembra. Três anos e meio de separação, e o poeta no máximo conseguiu uma decisão judicial que o faz ficar a 1.500 metros de distância da sua antiga casa e a 300 metros da Janaina. O poeta tem uma péssima mira, de quatro tiros só acertou um no ombro do seu rival; Janaina convenceu o seu novo marido a não prestar queixa, sorte do poeta.
FIM DA PARTE 1