649-O BAR DO INO- Histórias do Carteiro Henrique 1o.
Não é que Ricão fosse burro. Mas que seu QI era baixo... lá isso era. Entretanto, como carteiro, era dos mais eficientes e cumpria à risca a sua obrigação: entregar o mais rápido possível as cartas, encomendas, telegramas, enfim, tudo o que chegava à agência do correio destinado aos residentes de Dores da Grota Funda
A cidade era pequena e os serviços de entrega de correspondência eram da responsabilidade de apenas dois carteiros: Henrique Serra e Carlos Dias. A cidade era dividida ao meio e cada um entregava a correspondência na sua metade.
Na parte que lhe competia — bairros da Moquinha, Bela Vista e Caixa D’água — não havia rua, casa, loja nem tapera que Henrique desconhecesse. Mas um dia...
— Carlinhos, olha só esta carta aqui. — disse Ricão ao colega. — Veio sem endereço e não consigo descobrir o destinatário. Já faz mais de uma semana que estou quebrando a cabeça, procurando o bar do Ino, mas não tem nenhum bar com esse nome na minha parte da cidade.
Carlos pegou o envelope, já um pouco sujo pelo manuseio. Olhou na frente e leu as palavras escritas numa caligrafia muito ruim:
— Bar do ino — Dores da Grota Funda. — É, companheiro, eu também não conheço nenhum bar com esse nome. Quem escreveu esse nome aí, de certo tava ruim da cabeça, pois não escreveu nem a rua nem o número. (Naquele tempo ainda não havia o CEP). Assim fica difícil.
Virando o envelope, Carlos lê o nome do remetente e exclama:
— Mais, Ricão, essa carta é pro seu pai.
— Pro meu pai? Uai, Carlão, ce ta brincando comigo, sô?
— Não, olha aqui. Foi escrita pelo seu tio Jesuino. Está aqui: Jesuino Serra. Não é seu tio?
— É sim, mas...
— Intão, a carta é pro seu pai. Barduino. Ele separou as letras e ficou essa confusão.
Henrique demorou ainda alguns instantes para entender. Olhou a carta na frente e atrás, balbuciando:
— Bar do Ino... Bardo-do-ino... Bardoino! É mesmo! E eu procurando o bar...
— Num precisa dar explicação, disse Carlinhos, saindo com sua sacola de cartas. — Vai lá, entrega logo a carta pro seu pai.
ANTONIO GOBBO
Belo Horizonte, 10 de fev. de 2011
Conto # 650 da série 1OOO HISTÓRIAS
Os contos da Série Milistórias são arquivados na
Biblioteca Nacional do Rio de Janeiro