Leblon- Nossa eterna ilha

Leblon - Nossa eterna ilha

Dory Le Mer do seu palácio no Alto monitora com seu telescópio o Baixo Leblon. Nostálgica, lembra-se dos anos cinquenta. Que saudade das praias paradisíacas, da Rua do Pau, hoje a malfadada Dias Ferreira, as chácaras carregadas de frutos, o ar puro, a paz. Hoje essa adorável ilha se foi. O Leblon não é mais aquele. Foi invadido por forasteiros, flanelinhas, arrastões. Acabaram os casarões, a especulação imobiliária destruiu a poesia.

Resta a Dory Le Mer caminhar nos seus vastos jardins, inspecionar suas pratarias, controlar a criadagem.

Nos anos cinqüenta foi uma vedete do teatro revista. Dory Le Mer era ovacionada pelo seu talento e suas belas formas. Os homens ficavam extasiados quando ela descia daquela escada triunfante em cima de sapatos altíssimos, com maiôs acetinados expondo suas pernas de alabastro. “Dory Le Mer,” ovacionava a platéia. A deusa sob uma chuva de rosas agradecia. Ficou rica. Muitos homens lhe deram fortunas. Dory Le Mer investiu seu patrimônio em imóveis. Tinha fazendas no Nordeste, fazia parte de um grupo seleto de oligarcas. Mesmo famosa adorava passear pelas ruas do Leblon, curtir as pequenas lojas, as calçadas largas, as amendoeiras, falar com o povo.

Mas agora confinada neste elefante branco, sozinha, tentava dar um sentido a essa vida besta. Ligava para o prefeito sugerindo melhorias. Que tal transformar o canal da Visconde de Albuquerque numa nova Veneza com gôndolas embaladas pelos cantos maviosos de barqueiros evocando Puccini, Verdi. Tornar as águas do Canal límpidas, criar resorts no Vidigal e Rocinha para esse povo. Na Lagoa Rodrigo de Freitas, presente dos deuses, deslumbrar os visitantes com plantas raras, orquídeas, hibiscos, cannabis, querubins com olhos esgazeados inflamando a luxúria? Em vez das malditas calçadas de pedra portuguesa responsáveis por tantos tombos que enchem as clínicas de fisioterapia, calçadas de mármore Carrara. Tudo em vão. O prefeito não a levava a sério. Um perfeito idiota.

A tarde estava linda. Um crepúsculo róseo abraçava o Morro Dois Irmãos, a Chácara do Céu e o Mirante. A natureza foi generosa com o Leblon. Uma brisa suave acariciava os pensamentos de Dory Le Mer. Ambição o que é que você está fazendo com essa ilha? Pra que este maldito metrô com horrorosos canteiros de obras desorientando os pedestres, provocando falta de luz, dando prejuízo aos comerciantes, entristecendo as pessoas? Leblon é poesia não é concreto. É tomar uma cerveja num pé sujo, jogar conversa fora, se permitir ao ócio tão criativo. Daqui a pouco a velha tinturaria vai embora. A casa de bicicletas do seu Manuel que eu gostava tanto de prosear já foi vendida. O dinheiro está expulsando os menos favorecidos. Que saudades que tenho do bonde que atravessava toda a Dias Ferreira virando na curva para pegar a Ataulfo de Paiva. Do sorriso das pessoas que nem se conheciam, acenos como se fossem velhos amigos...

Dory Le Mer gostaria de ter uma varinha mágica para que aquele Leblon antigo voltasse.

Paschoal Villaboim Neto

07/11/2014

Paschoal Villaboim
Enviado por Paschoal Villaboim em 15/01/2015
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