O PRIMEIRO DO ANO
Por Gustavo do Carmo
O filho que estava na barriga de sua esposa era a esperança de Juvenal esquecer o péssimo ano que teve no trabalho. Jogador de futebol profissional, seu clube foi rebaixado no campeonato nacional com o último lugar.
O jovem atleta lembrou-se de uma coincidência que poderia sepultar de vez o ano velho: havia a possibilidade do neném nascer na virada do ano. Se Johnson fosse o primeiro bebê de 2015 a imprensa o procuraria, pararia de culpá-lo pela queda de divisão do time e ele ficaria orgulhoso de conquistar o primeiro lugar em alguma coisa.
Depois de muita insistência do marido, Ravielli tentou marcar uma cesariana para o dia 31 de dezembro às onze e meia da noite. Ética, a obstetra recusou o agendamento. Além de não querer uma cesariana desnecessária por vaidade e egoísmo, a médica queria passar a virada de ano com a família. Só aceitaria realizar o parto se ele fosse natural. Aí sim teria o maior prazer de ser chamada às pressas para trabalhar.
Juvenal foi obrigado a se conformar e contar com a sorte que lhe faltou durante todo o campeonato. Ravielli deu graças a Deus por não poder se submeter aos caprichos do marido. Ela mesma preferia o parto normal.
A festa de réveillon na Marina da Glória teve de ser adiada para o ano seguinte. A família se reuniria na maternidade. Ravielli teve as primeiras contrações em casa por volta de nove da noite. Às onze entrou em trabalho de parto. Johnson nasceu com quatro quilos e duzentos gramas no dia 31 de dezembro de 2014, às onze e cinqüenta e nove da noite. O primogênito de Juvenal foi o último bebê do ano.
Recebeu a notícia do nascimento do filho juntamente com os votos de Feliz Ano Novo diretamente da obstetra, ainda com a touca, a máscara no queixo e o avental. Juvenal ficou paralisado por dez segundos. Uma hora depois, o escrivão da delegacia do bairro emitiu o primeiro boletim de ocorrência do ano.