AS TRÊS AMIGAS


Sofia acenou-lhes de uma mesa ao fundo da esplanada. Luisa e Fernanda encaminharam-se para ela, serpenteando por entre as mesas apinhadas. O dia estivera abafado, felizmente que a tarde estava no seu ocaso, notava-se alguma frescura no ar.
Cumprimentaram-se e lá se ajeitaram nas cadeiras de alumínio, ficando sentadas em triângulo.

- Então que tens feito, Luísa?
- Bem, por onde queres que começe?
- Dá-me as últimas novidades…
- A última, já sabes qual é, divorciei-me…
- Sim, essa já sabia.
- Também mudei naturalmente de casa, fui viver com a minha mãe, fiquei com os meus filhos, o meu ex. paga pontualmente a pensão mensal, generosa, diga-se de passagem. No aspeto financeiro nunca tive razão de queixa. Só nos ciúmes, eram demais… Tornou-se insuportável. E foi o que rebentou com a relação…
- Pois - disse a Fernanda - e por isso deu o que deu…
- Como sabem, a minha mãe sempre ajudou muito, ficava com os miúdos sempre que necessário e assim continua. Eu levo-os à escola e por vezes ela vai buscá-los e trata deles.É um grande bem que tenho, reconheço. Bem, mudemos de assunto… Agora é pra frentex, respirar fundo e gozar a vida. Sabes que quero a Itália? Este ano não dá, gostava de lá ir em Junho, no ano que vem.
- Ah sim? É uma boa ideia, eu também não conheço. Vamos pensar nisso, eu e o meu Mário. E tu, Sofia, como vai a tua vida?
- Olha, o trabalho é o costume, ser secretária tem coisas boas e más, como sabes. Tenho tido alguns problemas com o Carlos, o meu filho mais velho. Acha que sabe tudo e é muito rebelde…Isso aliado às más companhias dá-me imensas dores de cabeça e já me apareceram os primeiros cabelos brancos.
Luísa retorquiu: - Sabes bem que hoje em dia isso é vulgar, os miúdos são muito permeáveis a modas. Acho que a sociedade aponta para estereótipos e a juventude é a maior vítima, por ser também o alvo mais vulnerável.
- Pois é, mas agora a onda de tatuagens e piercings anda por tudo quanto é sítio. Se recuasse uma geração, nem imagino o meu pai perante essas modernices. Caía para o lado, certamente… E a Rita, a minha mais nova, fez-me uma cena por causa de uns sapatos, sabem, daqueles que agora se usam com grandes solas e tacões, parecem sapatos ortopédicos. Tive de ceder… Estou sempre à espera que ela telefone a dizer que fez um entorse.
Riram-se todas, imaginando a cena.
- É a vida, quem tem filhos tem cadilhos - respondeu-lhe Luísa.
Sofia abriu a mala e retocou a maquilhagem, passando um pouco de baton pelos lábios.
- Não sei porquê, este baton pequenino lembra-me do meu Tomás.
As outras desataram a rir abertamente, chamando a atenção dos clientes vizinhos.
- Ainda bem que ele não está aqui para ouvir. Não merece... É tão querido, tão atencioso comigo. Adora-me, não merece...
- És danadinha… - Disse a Fernanda. - Sobre mim tenho algo a dizer-vos. - Fez uma pausa. - Acabei com o Rui…- Olhou-as e mudou de tom, a sua face adquirindo uma expressão dura. - Convenci-me finalmente que ele apenas andava a empatar comigo, queria era cama e nunca mais dava o passe definitivo: divorciar-se… Fartei-me. Foi bom enquanto durou…
- Mas parecias tão apaixonada, se calhar eras a mais feliz das três… Sempre disseste que ele era o homem da tua vida - disse a Sofia.
- Nesse aspeto acho que sim e não mudarei de ideias… Nunca amei assim ninguém como o Rui. Mas o sonho acabou quando soube que ele tinha comprado um colar de pérolas à mulher e depois me confessou que tão cedo não se separaria. Afinal apenas queria manter a situação enquanto pudesse, ter as duas à mão. E sempre com desculpas para não passearmos, sempre com medo de ser visto. Só estava comigo por causa do sexo, uma escapadinha para o motel, tudo muito bom, o êxtase total e no fim " tenho de ir, querida"… Demorei a abrir os olhos mas mais vale tarde que nunca… - Baixou o rosto e os seus olhos humedeceram, sentiu-se a tristeza que a avassalava.
- Vá lá, nunca digas nunca. Quem sabe um dia encontrarás alguém que realmente te mereça…
- Pois sim, Sofia, mas são quase dois anos… Em certa medida fui feliz… Mas afinal era tudo fantasia, um sonho que acabou… - A voz era sussurrante, magoada.
- Vá lá, querida. Acabarás por esquecer. E nós somos tuas amigas, não te abandonaremos.
Fernanda, emocionada, deu-lhes as mãos sobre a mesa e depois, prestaram finalmente atenção ao empregado, que em postura paciente, aguardava que fizessem os pedidos.




 
Ferreira Estêvão
Enviado por Ferreira Estêvão em 06/11/2014
Reeditado em 23/02/2015
Código do texto: T5025676
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