SÓ PARA VIVER UM GRANDE AMOR

Foi tudo assim… intenso demais. Não estava acostumada a viver amores selvagens. Tudo na minha vida sempre foi muito simples, muito medido, muito cronometrado. Cada passo tinha o tamanho certo, cada palavra, a direção exata. Tudo planejando nos mínimos detalhes.

Aí apareceu o Caê. Lindo de morrer. Conheci ele na praia. O Caê jogava bola, corria atrás dela como se lançasse a uma batalha de morte. E eu ali, deitada embaixo do guarda-sol, passando protetor solar n° 50 de dez em dez minutos para não ganhar um melanoma. Eu já tinha reparado no Caê. Já tinha visto que era um baita de um gostoso. Mas não era para mim. Ele nunca que iria reparar em uma magricela no meio de tantas bundas e silicones desfilando nas areias da praia.

Acontece que ele reparou. Foi meio forçado. Quando a bola acertou minha cabeça me deixando zonza, o Caê surgiu na minha frente cheio de desculpas. Se não fosse por isto, eu teria furado aquela bola de futebol ridícula, mas logo vi que o rapaz estava sendo sincero. Acreditei nas desculpas dele, menti que a bola tinha pegado de leve bem no meio da minha testa e encerrei o assunto, mas louca para continuar. Sei lá, me deu uma vontade de me pendurar naquele pescoço, dar um beijo e… Cruzes, eu não era assim. Sempre fui meio fria com meus namorados. Acho que foi por isto que sempre fui abandonada. Me faltava calor. Faltava.

O Caê me perturbou tanto – e eu não estava acostumada a sentir este tipo de perturbação – que peguei minhas coisinhas e vazei da praia. Queria ficar, mas eu sentia calores subindo e descendo pelo meu corpo e quando eles não subiam e nem desciam, se alojavam em um lugar que… bom, deixa para lá. Cheguei em casa e me enfiei na ducha fria e fiquei meia hora ali, tentando me acalmar.

Não me acalmei. O calor foi embora, mas a visão do Caê lindo não sumiu. Decidi que no outro dia eu iria fazer plantão na areia. Vai que ele lembra de mim? Mas, e se não lembrasse? Bom, aí eu me mataria e fim.

Ainda bem que não precisei enfiar a cabeça dentro do forno. Para minha felicidade, o Caê tinha me seguido até o meu edifício. Quando eu desci mais tarde para ir no mercado, encontrei ele de papo com o zelador. Enxerguei luzes na minha frente, tonteei, as pernas ficaram bambas. Até pensei que o Caê tinha alguma namorada por ali, mas o motivo da presença dele no meu prédio era eu. Eu! Impressionante.

Não preciso dizer que minha vida deu uma virada de 180 graus ali mesmo, na frente do zelador. Ele se apresentou, eu também e fomos juntos ao mercado. Quando voltamos, meia hora depois, a gente já estava namorando. A mulher fria e cinzenta que eu era, esta tinha morrido. Renasceu outra, quente, romântica, apaixonada. As roupas sem graça que eu usava, aquelas comportadas demais, eu doei para um asilo de velhinhas. No lugar, comprei jeans apertados, blusas transparentes e com decotes, mudei o corte do cabelo e deixei de ser a chata que eu era. Salve o Caê.

E agora, olhando para trás, fico pensando no tempo que perdi, nas chances de que deixei para trás quando fechei as portas e não vivi os amores que passaram pela minha vida. De que me adiantou eu querer mostrar que era uma mulher tão séria, se a única coisa que me tinha restado era a solidão e um protetor solar n° 50, que nem para me deixar bronzeada servia? Ainda bem que acordei. Já que este mundo não é sério mesmo, só me resta viver um grande amor.

Patrícia da Fonseca
Enviado por Patrícia da Fonseca em 26/05/2007
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