Amor Platônico

Me irritava profundamente o modo como ele chegava junto a mim, o mesmo sorriso dado de canto da boca, parecia ter preguiça de sorrir abrindo a boca , não sei porque, tinha dentes tão alvos, mas era assim que sorria pelo menos para mim.

Eu o odiava, aquele cheiro de perfume barato, e a flor que roubava de algum jardim eu sabia que ele deveria arrancar brutalmente a pobre florzinha, detestava isso, pensava em recusar sua oferta, mas a mão segurando a rosa, ficava ali naquela posição até que eu a segurasse, um dia aproveitei que o ônibus vinha chegando, acenei e subi rapidamente o deixei segurando a flor, vi o ônibus se distanciando ele me ofertando o singelo presente, senti um pouco de arrependimento que logo passou, assim talvez ele parasse de insistir...

Nada adiantou no outro dia ele estava lá, segurando a flor. Assim muitos dias se passaram ,até que certa vez chegando ao ponto ele não estava , fiquei aliviada, pensei comigo, perdeu a hora hoje que bom.

No Trabalho vez ou outra lembrava o seu semblante. Parecia que algo me incomodava.

-Tudo bem Graça?

-Graça? não está escutando?

-Sim, desculpe estava longe.

-Deu para perceber...

-Onde estavas então?

-Eu?

-Sim, você, Planeta Terra chamando...

Desculpe, estava pensando , num colega meu, um conhecido, alguém que não sei o nome não conheço, mas que todos os dias me leva um flor no ponto do ônibus. É amável, mas eu não lhe dou atenção, o desprezo.

_ Não compreendi, é um colega seu um conhecido ou um desconhecido?

-O conheço, e ao mesmo tempo não sei quem é.

_Cuidado amiga, pode ser um maníaco , Está cheio de historias nos tele jornais cuidado hein.

_Ele não parece ser mau, mas porque não fala comigo?

- Fale com ele você, dê um basta nessa situação.

-Vou fazer isso, vou fazer isso.

Os dias passaram e ele nunca mais voltou, eu também fui esquecendo aquela história maluca.um dia porém, No ponto do ônibus uma senhora de cabelos grisalhos me puxa pelo braço

_Que susto senhora posso ajuda-la

-Gostaria que pudesse, mas não pode me devolver o que perdi.

_Não estou entendendo, o que perdeu?

-Ele , ele perdeu você e eu o perdi para sempre.

-Fiquei numa situação embaraçosa não sabia do que e de quem ela estava falando.Pensei comigo

-Este lugar não me dá sorte um chega não sei de onde me oferecendo rosas, quando me livro dele, chega agora essa senhora me dizendo que perdi alguém que ela perdeu alguém , eu já nem sei o que está acontecendo...a partir de amanhã vou mudar de ponto.

Ela enxugou as lágrimas e mostrou-me uma foto, tomei um choque.

Era ele de quem ela falara, o Rapaz que me trazia flores, ele mesmo.

Não podia conversar com ela ali naquele lugar os transeuntes passavam, outros acenavam para os ônibus, não podia conversar ali, resolvi então chama-la para conversarmos melhor em uma padaria ali próximo, ela aceitou.

Sentamos , pedi dois cafés com leite, e perguntei-lhe o porque daquilo tudo, não estava entendendo.

Ela começou a falar, com voz cansada e arrastada que denunciava sua idade avançada.

_Esse rapaz era meu neto, os pais dele morreram e eu o criei com grandes dificuldades , meu marido também logo morreu, eu e ele ficamos sozinhos, não sei se percebeu o quanto ele gostava de você. Eu ia falar mas ela não permitiu .

_Me escute, apenas escute.

Um dia a viu passar, e creio foi amor a primeira vista. Mostrou-me

você, e nos seus olhos haviam tanto brilho , que logo entendi que a tinha admirado.

Mas pensei que só isso, no outro dia ele esperou você passar e muito dias seguidos, um dia porém arrancou da minha roseira uma rosa, e seguiu você, fiquei com medo e o segui também, vi quando ele lhe entregou a rosa e vi também no dia que a rejeitou.

_Senhora perdoe-me, eu não sabia o que fazer ele nada falava, eu confesso que senti até um pouco de medo, não o conhecia.

_Sim eu sei, ele não podia falar. Nasceu surdo, não falava, não escutava, eu tentei ajuda-lo mas sozinha não consegui... tinha alguns outros problemas,foi minha culpa..

-O que foi sua culpa?

Eu sempre o acompanhava, quando ele a via passar , mas um dia me irritei, e o proibi, pois vi que você não prestava atenção nele, ele se entristeceu por uns dias e parecia que tinha esquecido, mas para minha infelicidade, um dia sem que eu percebesse saiu as escondidas e veio a seu encontro, então um carro o atropelou, meu neto morreu com a rosa na mão. A segurava firmemente e nem o impacto o fez largar a flor.

Chorei por dias e só hoje vim te procurar, tamanha minha tristeza ,me sinto culpada.

Segurei suas mãos

_Eu me sinto culpada, eu sou a culpada, não entendi porque não falava comigo, nunca imaginei, pensei até que ele estivesse de brincadeira . Lamento muito ter sido a Causa de tamanho infortúnio.

Entre soluços ela nada respondeu.

Onde ele está? Quero dizer Enterrado.

-No cemitério da Boa Vista, poderei leva-la até lá em outra hora.

-Quero ir agora.

-Fomos nós duas mulheres diferentes até então desconhecidas chorando pela mesma dor.

-Nunca o tive e tenho a sensação que o perdi. No caminho comprei flores , rosas que são as suas preferidas, depositei no seu túmulo, li o seu nome pela primeira vez, lamentei pelo amor platônico que ele viveu. Pedi-lhe desculpas em pensamento.

-Esqueci que tinha que trabalhar, não me preocupei com isso. Fui a casa daquela senhora e lá ficamos conversando. Prometi voltar outras vezes e voltei, e minhas visitas foram tornando-se mais e mais frequentes , até que ela me fez um convite;

_ Sei que você mora sozinha , não é?

-Sim moro sozinha, meus pais vivem longe daqui, eu preferi morar com uma amiga mas não deu certo.

_Então venha morar comigo me sinto só a casa é grande, você me fará companhia, não vou pertubar você, te prometo, e sorriu, seu sorriso me fez lembrar o Afonso que era aquele pobre moço.

Eu pedi um tempo para pensar mas depois aceitei , hoje vivo com minha vozinha é assim que a chamo, nós duas ficamos as vezes a relembrar o Afonso, e como ele nos uniu sem querer.Um amor platônico que o levou para sempre.

Quando converso com umas colegas sobre o assunto elas falam que isso é coisa do outro mundo que minha consciência pesada me fez ir morar com a vó do Afonso, mas não é nada disso, entre eu e ela nasceu uma grande amizade, de neta e avó, e falando nisso desculpe caro leitor tenho que interromper minha história pois aí já vem ela com um delicioso chocolate quente que só ela sabe fazer...

Polly hundson.

polly hundson
Enviado por polly hundson em 03/11/2014
Código do texto: T5021707
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