Um conto no Dia de Finados
Pela sombra na calçada pôde ver a morte subir no seu corpo..., seu corpo não sente mais nada, enquanto, a sua alma pode sentir tudo! Muita gente conhecida se acotovela, empurra uns aos outros, ao redor do seu corpo inerte, quebrado, exaurindo os últimos vestígios da vida.
Um homem grita ao telefone para o resgate, não o conheço! Só pode ser algum transeunte solícito, popularmente conhecido, como bom samaritano! A cidade está enlouquecida. Motos circulam pelas calçadas, a tal da mobilidade urbana não é posta em pratica!
Justo neste dia isto foi acontecer comigo? O aniversário do meu amigo vai ter que esperar! Como, isto foi acontecer comigo? Sou um pedestre precavido, estou sempre de olhos bem abertos. Penso que, o trânsito caótico das nossas cidades consegue transformar as pessoas saudáveis em doentes! Ali, confinadas em seus carros deixam à ansiedade e o mau humor se instalar. A má qualidade do transporte público faz as pessoas andarem de carros gerando a solidão, com isso, a falta de convivência no espaço urbano, e, a violência no trânsito, aumenta!
O SAMU chega para fazer o resgate, o médico é um velho conhecido da minha família, seu rosto demonstra amizade, compaixão, tristeza. Pela abertura da perna da mulher a minha frente, posso ver a bicicleta seguir pela rua, não consigo acenar, meu corpo está imóvel! Andar de bicicleta foi a minha paixão, desde sempre, pedalando, ganhei resistência física. No ritmo das pedaladas, a paisagem passa pelos meus olhos, devagar, aceno para os conhecidos num largo sorriso! Juro, andar de bicicleta alivia o estresse.
Uma vez estive bem doente, a bicicleta me salvou! Pedalar estimula o sistema imunológico, aumenta o número de glóbulos brancos, assim, o meu organismo se defende do vírus e das bactérias, logo, fiquei curado.
Dois jovens vestidos a caráter estão me olhando! Percebo que são policiais! Fazem perguntas para as pessoas que, se prontificam a falar, deste modo, consegui descobrir o que houve!
“Um Fiorino branco não respeita a sinalização, em alta velocidade entra na contramão passa por cima desta criatura!” A voz emocionada se cala, após, o relato, muitas outras vozes falam ao mesmo tempo... A placa do carro foi fotografada por um transeunte, antes de o motorista fugir.
“A criatura sou eu!”
Dia de Finados! No local do atropelamento, seguido de morte, uma bicicleta branca é fixada ao poste! Mais uma bicicleta fantasma para marcar mais uma vítima da imprudência no trânsito! Na bicicleta um aviso:
“Correr para quê? Para ficar mais perto da morte!”
## Publicado na Gazeta de Piracicaba de 02/11/2014
In memoria da minha prima Tirza de Oliveira e ao estudante da Esalq e para todas as vítimas do abuso de motoristas irresponsáveis.