De calças na mão
Foi contrafeito que freqüentei, de calças curtas, aquele curso de admissão, sanduichado entre a conclusão do primário e o sonho do secundário. Mas calça comprida não ere secundário.
Eu devia ser o único naquela turma que ainda não tinha botado um par delas. E não é que tivesse pernas dignas de serem escondidas. A rapaziada daquela turma noturna me tratava como uma criança, o que era um conforto até, em relação à indiferença das meninas e moças. Um pirralho!
Na luz quase mortiça e incerta daqueles tempos pre-CEMIG, fazia sentido, em meio aos cochilos, sonhar com aquilo, aos quilos. E já renunciado Jânio, também eu, Deus meu, fi-los.
Aí vieram, em data solene, e temida, os exames, rumo para as nossas vidas. Diante da exigência de calças compridas, antevi minha liberdade, nelas com as pernas metidas. Papai me fez duas delas. Comprou as fazendas, um morim, acho que sim, cores achocolatadas, mediu, cortou e costurou. Sempre foi bamba na costura.
Hora de experimentá-las. O coração se agita, palpita. E eu que tanto as almejava, sinto súbito, em cada perna pesada trava. Sensação escrava.
Mas recuar, já não dava.