APPROACH
Sexta-feira na boca da noite. Eu sentado no barzinho de sempre, fazendo o rescaldo dos incêndios e terremotos da semana que passou quando uma BMW que descia a ladeira reduziu a velocidade. De sua janela foi brotando um cabeção loiro que berrou:
_ Oi Roberto, preciso falar contigo! Em seguida acelerou e sumiu na curva.
Fiquei rodando o HD da memória para ver se me lembrava de onde o conhecia – gastei quinze minutos e um chope na pesquisa até encontrar, lá no fundo das lembranças, o nome do fulano. Era o Jorginho cabeção, colega de sala do Ensino Fundamental.
Mas o que será que o Jorginho poderia querer comigo, depois de mais de 30 anos sem nos vermos? Decerto soube que eu era corretor de seguros e estava querendo renovar o seguro da BMW.
Dois dias depois me deparei com Jorginho no restaurante em que eu almoçava frequentemente. Veio se aproximando todo sorridente e me abraçou emocionado. Fiquei um pouco sem graça e o convidei para sentar-se. Chamou o garçom e, como eu não havia feito o pedido, escolheu um Bacalhau à Gomes de Sá e um vinho verde. Fez um resumo de sua vida; mulher, três filhos, empresário do ramo da construção. Lembramos da nossa adolescência, rimos um pouco e só, a conversa parou por aí. Insistiu em pagar o total da conta e saiu apressado para um compromisso.
Na sexta-feira seguinte, no mesmo barzinho, quando comemorávamos o aniversário de um colega do escritório, eis que surge o Jorginho cabeção, todo solícito, com seu sorriso largo. Pediu licença e juntou-se a nós. Bebeu, contou piadas e disse em voz alta, erguendo um brinde:
_ Aqui só quem paga a conta sou eu!
Quando levantei-me para ir ao banheiro ele foi atrás. Pensei comigo: _ Hum, aí tem coisa! Dinheiro ele não vai me pedir, será que é gay, não sei não. Vai ver que tem alguém na família precisando de transplante de medula óssea, ou coisa assim.
Antes de atravessar o salão ele me abordou:
_ Sabe Roberto, eu preciso lhe pedir uma coisa... Fiz cara de poucos amigos e ele deve ter percebido porque rebateu:
_ Não, não é nada disto que você está pensando, é que eu estou candidato a Deputado Estadual e gostaria de contar com seu voto e de sua família.
_ Ah, é isto então – respondi deixando escapar um suspiro de alívio.
Ao voltarmos para a mesa, expliquei a ele a minha situação:
_ Sabe Jorginho, no dia da eleição nem eu nem minha esposa estaremos aqui, infelizmente não votaremos no primeiro turno pois estamos de viagem marcada. Minhas filhas estão fora do país e minha mãe não vota porque é estrangeira. Me desculpe mas não poderei lhe ajudar.
Jorginho puxou do bolso um bolo de santinhos de sua candidatura, espalhou sobre a mesa, chamou o garçom, pagou a conta e fechou a cara, saindo sem se despedir.
Depois daquele dia, nunca mais eu tornei a ver o Jorginho cabeção.