Cabeleira

Regina caminhava pela rua com seu cabelo Black Power. Dirigia-se para um ponto de táxi no centro da cidade. No caminho, trabalhadores da construção civil soltaram gracejos racistas:

_Olha a sarará!

_Tão bonitinha, tão novinha e com preguiça de ir no salão.Ó a falta que uma chapinha faz.

Dentre outras preciosidades do gênero. Ela pensou em responder, entretanto estava com pressa e no fundo tinha pena dessas pessoas reprodutoras de preconceitos e escravas de conceitos de beleza artificial e excludentemente gerados. Seguiu seu caminho em paz, até mesmo porque está se sentindo cada vez mais bonita ao valorizar suas características étnicas. E seu amado a tinha como a suprema princesa de ébano.

Quando estava quase chegando ao local em que tomaria um táxi foi surpreendida pelo reencontro com uma antiga amiga.

_Regina, quanto tempo? Que maravilha te rever.

_Puxa Patrícia, deve fazer uns dois anos que não nos vemos. Desde a festa de formatura no Ensino Médio.

A amiga começa a falar mais baixo e em tom levemente pedagógico:

_Puxa Regina, ouvi o que aqueles homens mal-educados te falaram. Infelizmente, ninguém valoriza a beleza natural. Se a mulher de cabelo crespo, mesmo sendo tão linda como você, não alisar, vai ser alvo de críticas de tudo quanto é lado_depois de uma breve pausa, ela retoma o discurso_Desculpe a sinceridade, mas eu achava você muito mais bonita antes com os cabelos alisados e bem tratados. Não que você esteja feia, muito pelo contrário. Mas...

Regina já estava ficando cansada deste tipo de comentários desde que passou a usar o cabelo afro. Então resolveu encerrar a conversa:

_Patrícia, querida, foi um prazer enorme te rever, mas estou atrasada para um compromisso.

_Já sei, salão de beleza. Pra relaxar e alisar.

Regina gritou interiormente que essa menina estava fazendo doutorado em chatice. Porém, respondeu educadamente como aprendeu com a mãe:

_Na verdade, estou indo para um ensaio fotográfico.

_Ensaio fotográfico!? Pra qual revista?

_Você não deve conhecer, é uma revista internacional. E por falar nisso, você mora no mesmo endereço dos tempos da escola?

_Moro.

_Então depois eu passo lá pra pegar aquele DVD da Beyoncé que te emprestei. É que eu vou pra Paris mês que vem a trabalho e vou assistir à diva nas horas vagas. Beijos querida, vou pegar este carro. Táxi!

Regina se foi e Patrícia ficou sozinha, com a inveja corroendo o coração.