E o Bento levou
E o Bento levou
Da vasta galeria de tipos e personagens exóticos de minha Velha Serrana dos sessenta, o Bentoca era um caso a parte. Embora sem os traços desconcertantes do nanismo, era diminuto - e, sobretudo, resoluto. Se curto lhe era o pavio, caudaloso lhe era o enxurrio, de impropérios e vitupérios quando ferido em sua dignidade. O que mais o incomodava era o refrão:
Bento, bentoca, farinha de mandioca!
Vagava pela cidade, incerto, e parecia estar sempre por perto, tal o temor que despertava na meninada que dele - quando rugia - fugia em disparada. O que se recomendava à criançada era não mexer, não olhar e, se possível, evitar com ele se cruzar. Difícil em tudo acertar.
E foi numa das quebradas do burgo, bem na pracinha do jardim que com ele nos deparamos, três irmãos pequerruchos e, ainda mais atracado, o Bento supra-citado. Tenho dois testumunhas de que não fomos nós que começamos o tiroteio, muito embora, tenhamos os três mudado de passeio. E o gracejo nos veio, talvez até para desanuviar a tensão, daquele homúnculo, ou não?
- Treis peidorreiro!
A resposta foi espontânea, em coro, feridos que fomos nos brios fugazes, ainda que sem violência - ou flatulência:
- Bento, bentoca, farinha de mandioca!
Ah, pra quê, os céus tremeram enquanto pedras choveram. Só a pontaria que, felizmente, desapontaria, enquanto a gurizada se escafedia. E se hoje do embate com saudade estou, entre pedras e impropérios, o Bento levou.