O Conto do desabafo
Mais um dia comum e eis que entro no ônibus e abro um pacotinho de amendoim japonês para comer. Entra então uma mulher pela porta de trás e fica ao lado da minha cadeira meio que perdida, desamparada psicologicamente acredito, como em uma cidade como Vitória esse tipo de cena cotidiana é comum, não dei muita atenção ao fato e continuei com minha cabeça afundada no horário da faculdade que eu já havia perdido. Meio que de repente ela olhou em volta e retirou uma folha de papel que estava numa caderneta e pediu que eu lesse porque a letra era impossível de entender (e era mesmo) , ai eu mecanicamente peguei o papel e comecei a ler. Não sei se eu lembro exatamente o que dizia, mas era algo mais ou menos assim: “ Encaminho a sra. Fulana, a um abrigo pois a mesma não tem onde ficar, a mesma parece preocupada e informa que tem um irmão de criação mas os dois brigam muito e ela está em situação de rua...” bom, por ai vai, o encaminhamento era de uma assistente social e tinha algumas palavras que tive que me esforçar muito para entender, mas isso não vem ao caso...
Minutos depois ela pegou a folha, agradeceu e pareci realmente preocupada em localizar o tal abrigo, mas acho que ela nem percebeu meus pensamentos naquele instante pois me senti feliz em poder ajudá-la mesmo com muito pouco e ao mesmo fiquei triste imaginando a real situação daquela mulher.Aqui já é um pouco mais complicado pois tentarei narrar os fatos que se passaram na minha cabeça, por um momento parei de pensar na minha vida , nos meus problemas e nas angústias e comecei a imaginar como a vida daquela pessoa tinha afetado a minha e como a partir daquele momento eu fazia parte da vida dela mesmo que por alguns segundos. Depois de tudo que fiquei pensando na viagem de ônibus até a faculdade, veio a idéia de escrever o que tinha se passado para dividir com alguns poucos leitores ou nenhum, mas a verdade é que um momento como esse não é possível de ser relatado apenas num conto, crônica ou seja lá que diabos quiserem...o fato fatídico é que entra mais uma personagem na minha dentre tantas outras que de agora em diante passo a observa com mais cuidado e cautela do que antes são pessoas com histórias de vida, rotinas de vida, e pessoas que estão a margem numa cidade grande fria e infecunda socialmente. É claro que nada escapa a visão literária que tenho das coisas, e muito menos política, mas penso que um pedacinho do dia hoje ficou diferente, brilhou através dos olhos daquela mulher através de mim.
03/09/14