Um diálogo pedagógico
―Mariana, lembra-se que eu te contei que em 1990 um filhote de beija-flor caiu do ninho? ― Lembro-me. ― E que eu, depois de servir água para ele, soltei-o para que alçasse o seu primeiro vôo? – Sim, mas por quê você está me perguntando isso? ― É que hoje, enquanto eu lanchava na casa da Teresa, um beija-flor caiu moribundo próximo a mim. Ventava forte na hora e ele, quase morto, soltava seus últimos sofridos e compassados gaveados. Sem opor resistência, ele era arrastado e virado de um lado para o outro. Por alguns instantes, enquanto me fartava, fiquei ali, atônito, observando a cena. Num misto de tristeza e alegria, pensava se era possível fazer alguma coisa para mudar o funesto destino daquela avezinha tão fragilizada. Percebi que não poderia perder aquela oportunidade que Deus me dera. Interrompi momentaneamente o lanche e carinhosamente o acolhi em minhas mãos, observando suas tristes feições. Caminhei então em direção a uma torneira, com o intuito de servir-lhe água e quem sabe fazer com que se reanimasse. No caminho deparei-me com a Conceição, esposa do Dirceu, que por sua vez é irmão da Teresa, tendo explicado a ela a minha aflição. Ela então se prontificou a cuidar dele.
Retomei o meu lanche e, antes mesmo de tê-lo findado, a Conceição retornou dando-me a triste notícia: “não teve jeito, o pobrezinho morreu”. Entristeci-me mas não muito, pois logo que vi aquela avezinha agonizante, percebi que estava prestes o seu fim. Assim é que é, não tem jeito; toda a existência é finita.
― Pai! Será que esse beija-flor não é aquele do qual você cuidou em 1990? ― Boa e pertinente pergunta Mariana, mas isso não e possível. ― Por quê não? ― Estamos em setembro de 2010, portanto, decorridos vinte anos daquele episódio. ― E daí? ― Daí que um beija-flor vive em média apenas doze anos, sendo assim... ― Mas será que esse não viveu mais, muito mais? ― Impossível. Seria como se hoje existisse alguém com aproximadamente cento e sessenta anos de idade. Ou ainda, por exemplo: você tem hoje 13 anos; é como se fosse possível você viver 12 vezes a sua idade atual. ― Então pode ser o filho dele?! ― Formidável. Isso faz todo sentido. Na hipótese de aquele beija-flor do qual eu cuidei ter procriado quando contava oito ou nove anos, seu filho então estaria hoje com onze a doze anos. ― Será que é? ― Existe a possibilidade, afinal a natureza é tão surpreendente! A propósito, só para lembrar, por se tratar de substantivo epiceno, beija-flor tanto pode ser macho como fêmea.
―Pai! Quer sejam os beija-flores machos ou fêmeas, considero você um felizardo por ter vivenciado essas duas e fantásticas experiências.
― É mesmo Mariana sou verdadeiramente um felizardo. Por essas e por muitas outras razões.