Todo dia é sempre igual - é a vida.

Aquelas quatro mulheres todos os dias se encontram na estação de trem num subúrbio. Seus nomes: Maria – 62 anos, viúva, cria o neto mais velho: - “Não tem jeito! Não consegue se dar bem com o padrasto”.Berenice – 58 anos, casada, mas jura que ficaria feliz se o marido sumisse: “Não agüento mais!”; Olinda – 52 anos, separada, que tem um namorado que ninguém conhece: “Melhor assim, sem conhecer todo mundo já se mete, imagina se conhece!” e Jussara – 49 anos, que diz não querer saber de homem “tão cedo! ”. Elas diariamente saem de suas casas, em bairros diferentes e trocam de trem naquela estação para seguirem para o trabalho. Em comum, têm apenas a profissão – diaristas. Um dia perceberam que diariamente no mesmo horário – sete horas da manhã se encontravam e então passaram a ficar no banco da estação a espera uma da outra ou às vezes aguardando a retardatária. Depois combinaram de chegar um pouco mais cedo, para poderem conversar um pouco: - “jogar conversa fora” como diz Maria. Falam dos filhos, dos netos. Uma comenta da obra em casa que “não anda” porque fica na dependência do marido que é pedreiro estar de folga e tirar o domingo para “virar a massa” e levantar a laje para o novo cômodo; outra lamenta a falta de juízo da filha que tem apenas 23 anos e está grávida: “indo para a terceira barriga”. Trocam receitas de bolos e salgadinhos. Alguém se lembra de trazer um xarope caseiro que é “tiro e queda” para a tosse da amiga. Se uma se lamuria e conta que está sem dinheiro para pagar a conta de luz, uma logo se oferece de emprestar algum dinheiro até a próxima quinzena. Tem aquela que está triste e preocupada com a saúde da mãe idosa, que não tem dinheiro para ir ao médico e depende do posto de saúde que vive em greve: “Uma vergonha!”. Falam mal das patroas, reclamam do excesso de trabalho e do salário que não dá para nada. Lembram que quando chega o final de semana estão tão cansadas que falta ânimo para se cuidarem e então se dão conta que o tempo está passando tão rápido que daqui a pouco já será Natal. Até que uma olha para o relógio e alerta que já são sete e vinte. O trem aponta na estação e elas entram no vagão que pára em frente. Agora seguirão para os seus empregos.

Amanhã estarão de volta para “começarem tudo de novo” como sempre repetem em coro. Trarão novos assuntos ou mesmo irão remoer velhos temas, mas Berenice não vai contar que a obra em casa não anda, porque o marido é alcoólatra e normalmente nos finais de semana “enche a cara” e fica jogado no sofá da sala; Maria mesmo se consumindo de tristeza não vai ter coragem de contar que o neto está andando em companhia de maus elementos, já Olinda apesar de feliz e ansiosa prefere não contar “pelo menos por enquanto” que vai se juntar com Manuel (o namorado que ninguém conhece), porteiro do prédio onde trabalha e que até o final do ano vai estar morando em Copacabana no conjugado que ele tem direito no prédio onde trabalha e Jussara com medo de “olho grande” também não contará que está trocando de emprego: “para melhor” com direito até a plano de saúde, ou novos segredos surgirão.

Enfim, tudo igual. É a vida.

Wanda Recker
Enviado por Wanda Recker em 10/09/2005
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