FELIZES PARA SEMPRE
FELIZES PARA SEMPRE
O infeliz era um amarelinho, mofino, sem vigor; e ainda levava às costas uma mochila que com certeza continha seu peso ou mais. Ele vinha rasgando, literalmente, o espaço e as pessoas que estavam no corredor do ônibus. Não que este ônibus estivesse lotado, contudo também não estava vazio, pois no corredor havia uma renca de passageiros de pé.
O ônibus parou para descer alguém, o franzininho aproveitou para levar algumas pessoas no peito, desde a entrada, após a catraca, até próximo da primeira porta de saída. Ali parou, deu uma respirada, tipo bufando, pelo esforço feito, arriou a pesada carga no piso do corredor do ônibus, levantou um braço na tentativa vã de alcançar o corrimão horizontal, quase no teto (sua estatura não permitia). O coletivo arrancou, nosso pouca sombra se espatifou nos degraus da porta, deu um grito escandaloso e se aquietou.
Alguns passageiros se prontificaram em socorrer o cabrinha, mas este quando viu as mãos que o levantaria, se aprumou nos cascos, levantou o corpo e ainda foi grosso:
- Não preciso da ajuda de ninguém!
Uma desmilinguida, franzininha e pouca sombra, tal qual nosso desafeto, aparentando ter a mesma idade dele (mais de vinte e menos de trinta anos), se condoeu com as pessoas que o pequeno ofendeu e o repreendeu:
- Seu mequetrefe! Despudorado e sem educação! Isso não se faz! As pessoas estão sendo gentis com você e recebem ingratidão como pagamento.
O casal estava próximo um do outro, ela sentada na primeira cadeira depois da porta de saída, para o fundo do ônibus; e ele de pé de frente para esta porta.
Quando ele ouviu a admoestação se virou rápido para a direção da voz, ele ainda não havia visto a sirigaita; e no que viu a beldade, para não dizer “Olívia Palito”, mudou radicalmente em tudo: postura defensiva do corpo, semblante do rosto, que passou da raiva para sorriso de exaltação; e todo solícito, num tom de voz meigo, disse:
- Minhas desculpas, princesa. Você tem absoluta razão, fui mal educado.
Ela ainda não de todo apaziguada retrucou:
- Você tem que pedir desculpas não para mim, mas para as pessoas que queriam ajudá-lo.
Mas via-se que ela já o olhava com olhos de vivacidade e benfazeja.
Ao ouvi-la, novamente se virou para os outros passageiros e todo dengoso falou para ninguém em especial, mas para todos:
- Minhas desculpas! Não tive a intensão de ofender. Estava nervoso no momento. Mas de coração peço perdão.
Novamente se voltou para a feiosinha e praticamente se declarou:
- Como disse antes, você para mim é uma princesa. É a nora que minha mãe pediu a Deus. Que a muitos e muitos anos venho buscando; e enfim a encontrei.
Ela, também melosa, olhando-o nos olhos, aceitou:
- Oh, meu príncipe! Santo Antônio ouviu minhas preces, mandou-me você.
Levantou-se, deu as mãos ao agora todo inchado príncipe.
E eu, assistindo de camarote pensei lá comigo: “realmente, não existe chinelo velho que não ache um pé que o calce”.
Se vão ser felizes para sempre quem viver verá!