UM BANQUETE

UM BANQUETE

Dentro de mais duas horas chegariam os convivas.

Ela correu os olhos apreciando a perfeita arrumação da mesa: a toalha de linho; os pratos de fina louça; os copos de cristal; os talheres de prata. Orquídeas ornamentando, davam ao ambiente um ar suntuoso e primaveril.

Nada faltava para a recepção que ofereceria aos amigos que convidara para conhecer seu apartamento.

Concluíra seu curso de desenho e decoração; recebera da mãe, o apartamento que lhe coubera por herança do pai, e a ajuda financeira para torna-lo, como era agora, aprazível, confortável. Havia conquistado tudo o que sonhara: independência, uma profissão que lhe oferecia a própria manutenção. Agora era tocar a vida com sabedoria.

Percorreu os outros cômodos conferindo detalhes, admirando mais uma vez o bom gosto da decoração que criara para seu próprio deleite. Chegando à cozinha equipada com os sofisticados petrechos para desempenho dos mais exigentes cozinheiros, o descontentamento nublou seu olhar. Sobre a bancada, ainda aberto, o livro de receitas: O CHEF ENSINA COMO SERVIR UM BANQUETE. Escolhera no livro, com cuidado, as receitas com que pretendera encantar os amigos. Seguira atentamente os passos das receitas escolhidas: ingredientes, medidas... Entretanto... Destampou uma das panelas e, mais uma vez estremeceu, revendo o resultado... Os pedaços do frango tão esmeradamente temperados (como estipulara a receita), boiavam no molho, carne e ossos separados. Seria impossível montar o prato para a apresentação. Reabriu a porta do forno, devagarinho, olhou para dentro (esperando um milagre), nada... O file-mignon continuava como já o havia visto: escuro, ressecado, uma posta de carne sem qualquer salvação. Reconheceu seu fracasso. Seus olhos se encheram de lágrimas. Deu-se conta de que teria que enfrentar os amigos com a realidade, ou pedir o serviço de um restaurante, como já fizera na rotisseria, encomendando as taboas de frios, as entradas, as sobremesas. No entanto havia desejado dar um toque pessoal ao jantar, esquecera sua imperícia em manobras culinárias, confiara que, consultando um livro de receitas, lhe seriam abertas as portas do sucesso.

Lembrou-se de que ao comentar com a mãe, excelente cozinheira, os planos para o jantar, ela se oferecera para ajuda-la no empreendimento. Recusara o obséquio, deixando transparecer seu desejo de apresentar à mesa, algo mais sofisticado do que um prato caseiro.

Agora diante do impasse, teria que escolher: confessar aos amigos sua incompetência, ou buscar socorro junto à mãe. O tempo corria... Optou pelo melhor: Ligou para a mãe, ( sentindo as mãos geladas, o coração aos pulos).

- Diga-me, querida, de que precisa? (A mãe atendeu-a, prestimosamente).

Desmanchou-se em lágrimas, ouvindo o tom doce e paciente daquele acolhimento. Tentou falar, expor o problema, os soluços embargavam-lhe a voz. Com delicadeza, a mãe acalmou-a, sem pressa, cheia de candura.

- Estraguei o jantar..., conseguiu falar, entrecortando o pranto. Estou em apuros, mãe, que devo fazer?

- Conte-me, disse a mãe, com delicadeza, de que forma o estragou?

- O frango, mãe, cozinhou demais, separou-se a carne dos ossos... Não tenho tempo para fazer outro prato... O filé mignon, torrou no forno...Descreveu como seria a apresentação do prato feito com o frango.

- Acalme-se, aconselhou a mãe. Em tudo se pode dar um jeito. A que horas chegarão seus amigos?

- Entre 20:30h e 21 horas.

- Temos tempo... Faça o seguinte: escorra o caldo do frango. Reserve-o. Separe os ossos e peles e desfie a carne, prove o tempero e ajuste-o, caso precise. Vamos fazer um risoto. Use arroz arbóreo, mais ou menos 300 grs. Refogue-o, coloque os temperos, acrescente uma taça de vinho branco, o caldo do frango, pouco a pouco, até o ponto desejado, junte os palmitos, bastante parmesão ralado. Junte ao arroz o frango desfiado. Isso feito coloque a mistura numa de suas travessas italianas, regue com azeite e adorne o prato com folhas de louro. Faça uma salada verde, aproveite nela os legumes que seriam usados na receita que não deu certo.. (Quanto ao filé-mignon, guarde-o no freezer para aproveitamento futuro). Prepare-se, fique tranquila, receba seus convidados sem medo de estar fazendo feio. Você já tem como respaldo as taboas de frios e as entradas. Tudo correrá bem.

Executou cuidadosamente a receita sugerida. Escondeu no fundo de uma gaveta, o livro de receitas, tentando esquecer a agonia sofrida.

Os amigos ao chegarem, trazendo bombons e flores, encontraram-na alegre, confiante. O aconselhamento materno incutira-lhe segurança. Acolheu as visitas com entusiasmo, percorreu com elas o apartamento, encantando-se, com aprovação manifestada, por todos, ao seu trabalho como decoradora.

Ao degustarem os vinhos, frios e entradas, recebendo os elogios feitos ao seu bom gosto, ela aproveitou o momento para informar com simplicidade e modéstia:

- Como prato principal, vou oferecer-lhes um risoto de frango, acompanhando uma salada... Comida caseira... Preparada por mim... Espero que aprovem...

O risoto ao vir à mesa, foi avidamente consumido, e apreciado com louvores.

- Esse prato valeu como um banquete!... Alguém comentou com entusiasmo.

Após serem servidos as sobremesas os licores e o café da despedida, os amigos partiram.

Guardou as sobras, organizou a cozinha... As emoções vividas voltaram-lhe à memoria. Sentindo-se satisfeita, realizada, tranquila, acomodou-se nos travesseiros, sentindo uma leve sonolência aproximar-se. Um derradeiro pensamento sobreveio-lhe e ela sorriu. Tomou o telefone... A mãe bem merecia receber seus votos de boa noite e muitos agradecimentos.

hortencia de alencar pereira lima
Enviado por hortencia de alencar pereira lima em 18/08/2014
Código do texto: T4927892
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