O Aprendiz de escritor

Terminou de ler o livro do Guy Bradbury, O Zen e a arte da escrita e caiu na estrada, atirando para todos os lados, afinal a lição era, trabalhar e não pensar, ou melhor trabalhar e relaxar e não pensar, até que o trabalhar e o relaxar se confundissem e se tornassem uma coisa só. Ele sorriu quando pensou nisso, porque o fez lembrar de que o Romário fazia para relaxar, jogava Futvoley. E continuou disparando, isto é escrevendo sem pensar muito, simplesmente dando evasão ao que lhe vinha a mente.

Desde criança sentia o desejo de se tonar um escritor, acho que antes mesmo de aprender a escrever, no fundo era um desejo de aprender a contar histórias, habilidade que aos olhos dele, distinguiria quem as possuíssem naqueles tempos de infância, tempos em que vivera na roça, e que não havia televisão, rádio e os livros eram raros por lá; Mas este desejo de se tornar um escritor ou melhor um contador de casos ficou apenas no desejo, já que durante muitos anos a sua preocupação principal era sempre dirigida a atender as necessidades dos primeiros degraus da escala de Maslow. Será que havia desejo mas faltava talento, ou não era necessariamente falta de talento, mas sim ausência daquele fogo interno, daquela vontade louca da qual falam tanto os escritores consagrados ou que á já estão há muito tempo na estrada? Isso não sabemos, mas durante toda a sua vida esta vontade de ser escritor só fez crescer. Ele se tornou executivo, foi até relativamente longe em sua carreira, aprendeu muitas coisas e influenciou a vida de muitas gente, e deu até para fazer um pezinho de meia para embarcar na aposentadoria com um pouco de tranquilidade.. Bom! Pelo menos agora, em termos de necessidades, a escala de de Maslow estava sendo atendida e continuaria atendida durante o resto de sua vida, isto é considerando apenas uma volta da espiral, e caso nenhuma crise brava acontecesse no país, e acima de tudo se ele fosse capaz de manter seu estilo de vida atual, talvez desse de até para melhorar um pouquinho, digo viajar de vez em quando para o exterior e , manter uma 4x4 nova, boas bikes, para continuar alimentando o sonho de uma vida off road.

Fora do mundo corporativo já há algum tempo, dizia que era consultor, cargo que ele inventou para facilitar a conversa com os amigos, que achavam estranho ele tão jovem, ficar o dia todo sem fazer nada.; Quando o perguntavam o que ele estava fazendo, agora ele respondia , sou consultor, a conversa parava por aí. Um amigo lhe sugeriu dizer, contemplador, que era o que este amigo que havia sido CEO de uma grande multinacional, dizia quando deixou de trabalhar aos quarenta e quatro anos, mas ele achou mais complicado , porque as pessoas se espantariam mais ainda.

Enfim como Contemplador, digo consultor, ele tinha todo tempo livre e voltou a ler com grande intensidade, e aquele desejo de ser escritor reacendeu e desta vez se transformou em uma chama intensa que fazia arder seu coração e sua mente.

Inspirado pelo seu guia, escreveu a esmo umas mil palavras e se deu conta que precisava de um tema, de um norte; Então começou a lembrar de idéias antigas,assuntos que passaram por sua mente e que ele não encontrou o jeito ou o momento de transforma- los em um caso, crônica ou mesmo uma poesia, um haikai. Sei lá.

Pensou, vou relacionar primeiro estas idéias e ver se alguma pode dar leite ainda. Vamos lá:

Ah! Aquela idéia do cara que falava por música, letras de rock e de pop, que foi aos estados Unido e fez muito sucesso por lá. Ah! e aquela outra da velha senhora benzedeira, que também lia a sorte, e que disse para o José jogar na Mega-Sena porque ela havia tido uma intuição, e ela era famosa por sempre acertar suas previsões, havia muitas histórias a respeito dela na boca do povo, sua fama ia longe, vinha gente de todos os lados para consultar com ela. Ele lembrou da tremenda confusão que deu na cidade por causa desta previsão da velha senhora e que terminou em uma grande tragédia, e fez com que todas as paixões baixas do humano humos viessem a tona. Lembrou também da história daquele bar-escola de inglês para que as pessoas dessem continuidade a pratica do idioma mesmo depois que terminassem o curso regular. Muitas histórias aconteceram ali, à sombra de Joyce, Tennessee Williams, Faulkner, Hemingway, que as pessoas conheciam através de palestras, filmes, Work Shops etc.

Lembrou-se também de uma idéia sobre um bibliotecário, que que resolveu botar ordem no mundo reconciliando os desafetos da história da filosofia e da literatura, condenando por exemplo Nietzsche e Sócrates a ser vizinhos e conversar sobre suas diferenças; Colocou Bilac ao lado de Castro Alves pedindo para que ele pedisse perdão por te- lo chamado de O batateiro da Língua. Esta gente toda se encontravam do lado de lá e se punham a conversar sobre seus pontos de vistas, movidos pela vizinhança na estante.

Havia também aquela história acontecida com um parente de sua esposa, um tio que se comporta como um bravo cavaleiro medieval, que vai à luta para conseguir a rosa azul e oferecer a sua amada como prova de amor; Neste caso, o cavaleiro usa de suas habilidades como pedreiro, para desmontar o vaso sanitário e recuperar a dentadura da sua amada, que por um descuido, quando ela deu uma risada exagerada com um vídeo que assistia no facebook. Ah! Houve uma segunda vez em que a mesma dentadura caiu no mar, na praia grande, a Meca dos farofeiros naquela época, e novamente o bravo guerreiro prontamente age; Ele mergulha, vai lá no fundo do mar e recupera o sorriso de sua amada. Também Lembrou-se de uma terceira história sobre dentaduras ocorrida nos tempos das privadas de fossas, aqueles quartinhos no fundo quintal, não havia um vaso e o serviço era feito agachado; A aliança da amada caiu no buraco e foi parar no poço de merda e ele, teve que por em pratica suas habilidades de pescador para recupera-la e ver de novo o sorriso no rosto de sua companheira. Depois disso nunca mais ela reclamou das tardes de domingo que ele passava na beira do rio.

Ao lembrar-se destas sementes de idéias, ele se deu conta de que era exatamente como o Guy Bradbury havia dito, os casos estão por ai em toda parte, pedido para serem contados. A vida de cada um daria uma biblioteca de Alexandria de histórias; Tudo que viu, tudo que sonhou, o que não viu mas sentiu, amores, desamores, pessoas, casos de casos em fim, uma imensidão de possibilidades.

Bom, idéias não é mais o problema, então o que ele precisaria agora era aprender uns macetes, digo umas dicas para começar a escrever, não digo, o pulo do gato, por que cada caso é um caso.

-Aprender a escrever, pensou: Por que aprender? Afinal os melhores contadores de casos que ele havia conhecido na infância, e nos filmes e nos livros eram pessoas que nunca frequentaram escolas, não sabiam ler, nem escrever. Ah! mas eles sabiam contar o caso, e como sabiam; Neste momento parou de escrever e pois se a lembrar do Dito, trabalhador de enxada, analfabeto das letras, mas que sabia contar filmes, e começou logo a se recordar das histórias dos filmes que havia conhecido através do Dito. Muitos destes filmes le se recusou a assistir na na TV ou a aluga-los no vídeo Club, para não quebrar o encanto, não desmanchar a magia , afinal foi baseado naqueles personagens, do jeito que Dito havia contado, que se formaram suas referencias, foi a partir deles que ele construiu sua escala de valores, a sabedoria deles foi que o orientou e lhe ajudou nos momento difíceis da sua vida pessoal e profissional e ele nunca quis, de jeito nenhum quebrar este encanto.

Lembrou dos anciões nas aldeia e dos pais e dos jovens e crianças sentados em volta do fogo. Lembrou também que nas casa dos seus tios e do seu avô com os quais havia vivido, no tempo em que não havia luz elétrica, todos se sentavam próximo ao fogão, enquanto o feijão cozinhava, ou à luz tenra de uma lamparina na sala pobre, e as crianças sentadas no chão ficavam ouvindo os casos sobre seus antepassado, parentes que viviam em outras fazendas que pareciam tão distantes. Lembrou que os lugares na infância assim como as casas, as cidades, tudo parece maior e mais distantes um do outro, muito mais do que verdadeiramente eram na realidade.

Ele lembrou da escola e do quanto adorava o dia da semana em que professora lia histórias.

Pensou com seus botões que nenhuma destas pessoas eram famosos escritores, mas sem dúvidas eram excelentes contadores de casos; Então começou a pensar em aplicar o método de analise comparativa, e a encontrar um algoritmo, o padrão comum entre o Guy, Borges, Machado de Assis, Joyce , Faukner e outros famosos contadores de casos e esta turma toda que ele havia conhecido em sua a infância. E, começou a relacionar aleatoriamente tudo que vinha à sua mente:

Palavras simples, períodos curtos, com exceção de Saramago; Repetições estratégicas de de certas palavras, respiração do narrador, neste momento Lembrou -se da respiração do Dito, seu tom de voz, e do gestual do seu Francisco, um afro-descendente famoso contador de casos, que morava naquela casinha de pau a pique na Colônia velha na antiga usina Vassununga, e se perguntou : __ Na linguística o que isso tem a ver, bom teria a ver com o ritmo, com a pontuação correta, tamanho das frases.

Concluiu que para todos eles, escritores e contadores antigos de casos, o foco principal era que ouvinte ou o leitor compreendessem , captassem o DNA do caso, da história e que pudessem ir interagindo e contando simultaneamente para si mesmo em pensamento o caso.

De repente, sua mulher o chamou para almoçar e ele despertou do transe, e olhou para a tela do seu Mac e viu que já tinha digitado mais de mil e quinhentas palavras e disse, bom, a ginástica para o cérebro, de hoje está feita.

Subitamente lembrou das palavras do Guy , e disse, nada disso, escrever é transpiração, trabalho duro, não acreditem nesta coisa de sentar alí meia horinha, e receber dos céus, por iluminação a idéia central ou a sequência do seu conto .

E decidiu voltar a tarde ao trabalho, assim que terminasse seu encontro com Carlos Lorca, diretor financeiro desempregado, que um Coach amigo seu havia lhe pedido para que o aconselhasse; Esta coisa de Net Work, falar sobre a mercado, criar conexões, ou simplesmente melhorar o moral dele; Como ele já havia passado por estes momentos de cais, compreendeu quanto esta ajuda poderia ser importante.

Para conciliar resolveu marcar o encontro na Livraria Cultura, e quem sabe fuçaria nas prateleiras e veria alguns livros; Quem sabe voltaria para casa com algum peixe bom de inspiração.

Sabe o quê? Foi um bom encontro e por fim acabou dando de cara com um livro do grande Henry James, A lição do Mestre.

Exatamente o que precisava para empurrar com a barriga, digo procrastinar, isto é, evitar pegar o touro pelos chifres.

Leu a orelha do livro e ficou mais animado ainda ao ver que a história se tratava do talentoso e ambicioso jovem escritor Paulo Overt que conhece numa casa de campo um escritor mais velho a quem muito admira, Henry St. George.

Pelo titulo e por estas dicas ele antecipou sobre do que se trata, e se entusiasmou com a possibilidade de conseguir do Senhor Henry james a Silver Bullet.

Hum!! Lembrou-se de novo das palavras de Guy Bludbury sobre, trabalho, trabalho e trabalho, para se tornar um escritor, não existe Silver Bullet, digo bala de prata, pulo do gato; Mas considerando o que poderia aprender lendo Henry James, ele comprou o livro;

Enquanto pagava a consciência pesou e ele assumiu consigo mesmo o compromisso de dividir bem o tempo entre o exercício da escrita e a leitura do livro.

Vou ficar de olho nele.