Uma mulher na mesa de um bar
A mulher já estava cansada de ficar sentada naquela mesa, a mesma de todas as noites, escutando a conversa do seu companheiro , com algum eventual amigo.Seria muito melhor que ela e o Lauro estivessem já na cama, deixando rolar as emoções ou dormindo.O que importaria a ela problemas do Estado, políticos, coisas que não eram de fácil solução?Não gostava mais de bares , já perdera muito tempo em outras mesas como aquela, na caça de companhia que pudesse lhe render algo.A sua vida tinha sido sempre, muito dura.Nunca fora teúda e manteúda, como falava suas tia Diva, até encontrar o Lauro.Ele era um bom moço, isto é, não tão moço assim, mas ela o amava muito.Ele era um boêmio só de mesa de bar, no mais, chegava a ser careta, mas eles se completavam na vida.
Naquela noite, o assunto de Lauro com o amigo, estava muito chato, problemas governamentais, e o sono teimava em querer fechar os seus olhos.Tinha vontade de deitar a cabeça nos braços e dormir ali mesmo, ainda mais que o tal amigo não parava de lhe dar uma olhadas.Se ainda fumasse ela poderia se distrair com o cigarro, mas, deixara o vício quando fora viver com o Lauro, boêmio de araque , que até lhe pagara um tratamento para clarear os dentes.Ela estava tão sem poso na cadeira , que o Lauro já lhe havia feito um sinal que ela captara como para ficar quieta.Só mesmo tomando mais um chope!Durante um tempo ela ficou olhando a espuma - para ela a melhor parte da bebida -depois, virou de uma só vez, o conteúdo da tulipa, e, sobre os seus lábios ficou um bigodinho de espuma.Lauro lhe passou um guardanapo de papel, e o amigo, sem mais nem menos, falou:Sabe que você é uma dolicocéfala? - sou o que? Credo o que é isso?-Lauro , que no primeiro momento ficara surpreso , começou a rir da reação dela, e lhe explicou o significado daquela palavra, que, mais parecia um palavrão. - querida, Dolicocéfala é uma determinada forma de cabeça, quando a largura do crânio tem 4
o comprimento - isso não lhe altera em nada, pode ficar tranquila- ainda elogiou os lindos cabelos dela.
Acalmada com a explicação, que nem entendera muito bem, ela prestou atenção no assunto deles, sobre um tal de Pittigrilli, considerado no seu tempo, um autor maldito, e ele havia escrito um romance sobre um loura dolicocéfala.Depois, desinteressada ela começou a pensar que achara bom saber aquilo, e mais feliz ainda por perceber que o cara não estiveras olhando para ela com outras intenções ou falta de respeito, e que, não vira nela, o que muitos homens costumavam a ver.Já fora chamada de tantas coisas na sua vida, muitos adjetivos cruéis, mas agora , aquele homem descobrira algo diferente, só a estrutura de um ser humano, e embora, pudesse parecer algo simples,para ela, tivera uma enorme importância.
Com tanto chope que tomara, eras urgente ir ao banheiro, e, chegando lá ficou satisfeita de não haver mais ninguém, na frente do espelho se mirou por algum tempo.A pintura já havia saído bastante, mas isto não tinha importância agora, não precisava mais de retoques.Vivendo com Lauro estava fazendo parte de um mundo melhor, havia tranquilidade, amor e respeito.Ela viu nos seus olhos verdes um traço , ainda, de ingenuidade.Olhos grandes e verdes, herança de algum gringo safado que seduzira uma mulher, membro distante de suas família, lá no Nordeste.Hoje, eram olhos bem vindo, de gata angorá, jovem e bonita.Começou então rir de si mesma.Estava se sentindo confiante, um mundo novo se abrira para ela.Aquela noite iria mudar, ainda mais, sua vida, daria mais valor a si mesma, aceitaria o conselho de Lauro em aprender algo, ter uma profissão digna, mudar muito dos seus valores , tornar-se, finalmente, uma nova mulher.Aquele homem não vira nela só um rosto bonito, mas um tipo marcante, uma mulher dolicocéfala.
Nesse estado de espirito, voltou para a mesa, os dois homens pararam de conversar e a olharam, alguma coisa parecia diferente na mulher.Lauro, com carinho, tomou a mão que elas lhe estendia.Na porta do bar, despediram-se do amgio, e foram os dois, de mãos dadas, caminhando pelo calçadão, admirando os primeiros raios de sol que faziam brilhar, no novo dia, as águas tranquilas do mar.