Inspiração de um poeta
De repente me veio uma vontade grande de escrever algo bonito, tocante ao coração das pessoas; talvez algo sobre amor ou tristezas da vida, mas não sei ainda ao certo que cunho meu texto terá.
Dou mais um trago no meu cigarro, tomo um gole grande da minha cerveja, cruzo as pernas e fico em posição de "o pensador". Parece-me que algo vem à minha mente. Logo começo a digitar no teclado, e parece que vai sair algo bom. Mas... penso um pouco mais e vejo que está uma bosta, não merecedora de um mísero aplauso.
Bem, devo conseguir... Afinal, muitos conseguem, e por que não poderia eu conseguir? Tomo mais dois goles e penso nos amores passados - naquele em especial -, porém não quero escrever algo muito melancólico, coisa que de certo aconteceria se por ela escrevesse.
Dou um longo trago e repouso minha mão em minha perna, olhando a fumaça saindo do cigarro, e, subitamente, me vem esta ideia: "O cigarro é como a nossa vida: dá-nos um grande prazer, mas a cada trago, o seu tamanho diminui, assim como a nossa vida. A fumaça que sai do cigarro é a vida se esvaindo do nosso corpo. Dependerá de cada um decidir se fará um trago mais longo, acabando com o mesmo mais rapidamente, a fim de degustar o cigarro intensamente, ou dar tragos curtos, num tentativa de aproveitá-lo durante um maior período de tempo".
Mas quem eu quero enganar? Isso também está horrendo.
Então o que poderia ser escrito por mim capaz de fazer as pessoas sentir aquela vontade louca de continuar a leitura? Daquele tipo onde a pessoa para de ler do nada e pensa: puta que pariu, que livro foda. Tenho que continuar essa leitura.
Tomo um gole grande da minha cerveja e mais um trago do meu delicioso cigarro. Penso: nossa, que cigarro mais gostoso.
Olho para os lados, tentando achar inspiração em qualquer coisa. Não acho esta bendita ou maldita inspiração. Parece que nada à minha volta faz sentido.
Ao olhar para a janela, vi o breu do céu e me lembrei daquilo que li um dia sobre a linda paisagem de estrelas, ofuscadas da nossa visão de um maravilhoso cenário, por causa de todas a luzes da cidade; e me fez aludir à situação: nossos objetivos, nossos sonhos e desejos são como as estrelas ofuscadas, e as dificuldades que nos é proporcionado durante nossa caminhada na vida, os problemas que criamos para nós mesmos, as pedras que estão no caminho, são as luzes da cidade ofuscando nossa vida.
Quando alguém quer ver as estrelas em sua plenitude, ele sai da cidade e vai pra um local mais afastado, dando-lhe, assim, melhor visão; metaforicamente, quando temos problemas em nossas vidas, devemos nos esquivar das coisas que nos ofuscam, a fim de termos um melhor panorama.
Depois de ter pensado nisto, encostei-me sofá e comecei a rir. Dei um riso de orgulho. Olhei para a parede e logo apertei o backspace do notebook.
Meu cigarro acabou e logo acendo outro. A cerveja quase no final.
Lembrei-me daquela música do Vinícius de Moraes, do álbum de Tom Jobim, Serenata do Adeus. Porra, essa musica é de uma genialidade estupenda. Seleciono-a e dou play. Fecho os olhos, canto ao ritmo, sentindo a música invadir minha alma. "Ah, mulher, estrela a refulgir, parte, mas antes de partir, rasga meu coração. Crava as garras no meu peito em dor e esvai em sangue todo o amor, toda desilusão". Palavras de descrição cabíveis não caem em minha boca para Vinicius. Ele sabia escrever sua dor.
Foi - é - ele meu maior ídolo, minha inspiração de como escrever a tristeza. Empolguei-me. Selecionei mais uma música dele, e mais outra, e mais outra. Ah, foda-se essa porra de texto! Vou apreciar um pouco de Vinicius de Moraes. Não consigo evitar demonstrar a emoção de ouvir Vinícius. Canto e canto. Fumo vários cigarros sem parar.
A cerveja acaba mais rapidamente, e nossa, já terminei de beber uma caixinha? Sorte minha de ter uma a mais ainda lacrada. Abro a caixinha e guardo as latas na geladeira. Apanho uma. O cigarro na metade. Dou um longo trago.
Repouso no encosto do sofá, pensando nas minhas possibilidades de escritura, e de repente meu irmão aparece ao meu lado logo mudo de janela pra ele não perceber que estou escrevendo e pergunta: Irmão, o que fazes aqui sozinho? E eu, com vergonha de dizer que estava a tentar escrever algo, disse estar ouvindo música e a ler sites aleatórios, de humor ou qualquer outra coisa.
Ele diz: Hum... Boa noite, então. Digo: Obrigado, você também.
Retorno ao meu cigarro. Ótimo cigarro. Dentre tantos outros, esse, em especial, é o que mais me agrada, apazigua minha mente de uma forma sem igual. Voltando à minha tentativa de escrever, olho livros, vários livros, na estante, sem tê-los eu lido algum deles. Que desperdício!
Faço isso com certas coisas que me aparecem no dia-a-dia... Coisas que poderiam ser de utilidade máxima ou, se não, que poderiam servir-me de experiência, mas lá os deixo, sem nada fazer. Devia eu e pegá-los e lê-los todos! Acrescentando na minha vida informações das mais variadas.
Pensando bem, isso me parece uma metáfora das oportunidades que aparecem para nós durante a vida. Devia nós aproveitar cada oportunidade que nos aparece, seja ela boa ou não. Só teremos a ganhar. Isso já é o suficiente para apostar todas as fichas.