200 - NOTAS DE UM ESCRITOR NOVATO

COMO TUDO COMEÇOU

Ao final do curso “Literatura e Produção de Textos”, de duas semanas apenas, ministrado pela escritora Maria da Graça Rios, em julho de 1999, o desafio foi lançado:

— Escrevam algo, qualquer texto, qualquer gênero. Comprometo-me a ler, comentar e dar qualquer tipo de orientação. — Quem prometia era a própria Graça Rios, com a simpatia que lhe é particular.

Havia ingressado naquele curso por mera curiosidade, mesmo porque se destinava a pré-vestibulandos. Mas assisti, com interesse, todas as aulas. Ao mesmo tempo em que li, por indicação da professora, um livro de contos da Editora Ática: “Quem Conta Um Conto”, uma antologia feita por encomenda da editora, na qual os autores escrevem um conto baseado na fotografia de uma casa velha. Quando a professora fez o convite, pensei: Vou escrever um conto sobre aquela foto da casa velha. Se os escritores podem, porque eu não posso também?

Direto no computador, escrevi, em 25 e 26 de agosto, “A Casa Que Virou Mausoléu”, meu primeiro conto escrito seriamente, por assim dizer, de modo profissional. Levei-o à Graça Rios, que, depois de lê-lo, me interpelou:

— Mas... o senhor já escreveu contos anteriormente?

— Não —menti-lhe — É a primeira vez que escrevo assim, depois de suas excelentes aulas.

— Pois então, o senhor não vai parar mais. Vai continuar escrevendo.

— Mas, para que?

— Para publicar. Em revistas, livros. O senhor tem potencial.

Fizemos um acordo: todos os meus contos seriam revisados por ela, que se comprometeu a comentar meus trabalhos, me dando orientação, inclusive, com relação à edição de um livro.

No ano de 1999 trabalhei timidamente, com cuidado, procurando idéias e obtendo-as com certa facilidade. A inspiração foi se revelando bem devagar. Entre 25 de agosto e 25 de dezembro escrevi nove contos. Se fiquei satisfeito em escrever “A Casa...”, me surpreendi deveras com a produção de “Vadinho Vai à Venda”, também escrito inspirado em fotografia: ao deparar-me com foto de uma birosca no interior do Nordeste, onde se viam, ao lado de balcões e prateleiras com alimentos, bebidas e artigos diversos, caixões de defunto para serem vendidos. Na mesma venda onde se comprava comida, comprava-se o caixão para o enterro de quem morria de fome.

“Vadinho Vai à Venda” é mais do que um conto. Ao mesmo tempo que descreve a tragédia dos que morrem não têm o que comer, há o lirismo da mãe e sua criança de peito, mais o panorama do sertão agreste. Tem vida, tem morte, tem cor e tem revolta, neste conto simples, o quarto conto , escrito em 4 de outubro de 1999.

No mês de janeiro de 2000 nada escrevi. Mas as idéias foram se formando. Organizei um “arquivo de idéias para contos”, feito de anotações sumárias das idéias que me atropelavam, para serem desenvolvidas mais tarde, com vagar.

Ao retomar à atividade, já tinha em mente uma meta: escrever um conto por semana. Fui escrevendo, escrevendo, sempre no computador. Graça Rios ia revisando os contos. A cada vez que lhe levava uma remessa (geralmente dois ou três contos) ela comentava os contos que revisara. Assim, cada visita que lhe fazia, era uma verdadeira lição de literatura. Que eu procurava aprender in totum. Ao fazer os acertos, no texto computadorizado, ia aprendendo, pela própria experiência, mais e mais sobre a danada gramática da língua portuguesa.

Em 2 de agosto de 2000, exatamente ao completar o primeiro ano de atividades como escritor de contos, havia escrito 46 contos, quase chegando à meta que me havia imposta ( um conto por semana). Em 31.12.2000 cheguei ao conto # 64, tendo, assim, atingido e superado aquele desiderato, ou seja: 55 contos escritos num ano!

Podem pensar que estou mais interessado em produção do que qualidade. Não é bem assim. Ao longo de todo o ano, procurei sempre as melhores idéias no meu “arquivo”, que abrange desde reminiscências de minha vida, recortes de notícias de jornal, bem como causos pitorescos, anedotas bem desenvolvidas, sonhos, e até perfis psicológicos (vide “Gente Fina é outra coisa”, “Maria Ceguinha” ou “João Bandanha”). Sempre que possível, dramatizando ou dando um desfecho, um arremate final que liquida com a história de modo surpreendente. Procuro fazer com que o leitor, ao final, “fique olhando para a parede, procurando a mosca invisível da surpresa”, conforme recomendava Monteiro Lobato aos escritores novatos.

Em janeiro de 2000 nada escrevi porque passei a maior parte do mês em viagem de recreio, com minha família. Mas sob o ponto de vista literário, foi um dos melhores, pois re-encontrei Silvia Maria Aguiar, velha conhecida de encontros exotéricos. Conversa vai, conversa vem, ela se prontificou a revistar também meus contos e me por em contato com professores e coordenadores da área de literatura de diversos colégios em BH para os quais trabalha. Assim que tivesse meu livro publicado, claro.

PROJETO LITERÁRIO MILISTÓRIAS

Durante o ano de 2000, tendo comprovado minha capacidade de escrever um conto a cada semana, tive idéias a respeito: escrevendo um conto por semana, produzo no mínimo, cinquenta 50 por ano. Em dez anos, escreverei quinhentos e em vinte anos, escreverei mil contos. Mil histórias. MILISTÓRIAS. Veio então a denominação de todo o meu projeto como escritor de contos: PROJETO LITERÁRIO MILISTÓRIAS.

A LOUCURA DO CRISTAL — MILISTÓRIAS # 1

Em 2001 comecei a apresentar meus originais para editoras, procurar quem editasse meu primeiro livro. Editora MAZZA foi a primeira procurei. A diretora e proprietária Maria Mazzarelo me disse francamente:

— Não vou engabela-lo. O “primeiro livro”, sendo de contos ou de poesia, o autor jamais encontra editora que o lance. Tem de ser por conta própria.

Visitei ANDRÉ DE CARVALHO em seu “Armazém de idéias”. A proposta que me fez, considero-a obscena:

— Edito seu livro, sim. — Pegou o lápis, fez algumas contas — Por R$ 5.000,00, fazemos uma edição de 1.000 exemplares, você fica com 500 e eu com 500. Por 5 anos, detenho os direitos autorais, tudo o que conseguir em outros segmentos (TV, teatro, etc) será meu. Ah! E para a noite de lançamento, você me fornece 1 caixa de uísque.

E assim foi. Cada vez menos esperança de encontrar um editor. Em maio, resolvi lançar meu livro. Se posso escrever, posso editar, pensei. Entre os diversos orçamentos (Enny me acompanhou em algumas editoras, situadas em bairros distantes) o que mais me conveio foi o da Gráfica Geraes, que, por ironia, estava há apenas dez quarteirões de casa, no Alto da Barroca.

Fiz a seleção dos 25 contos que queriam publicados Dei preferência aos primeiros contos, mas o conto que deu título ao livro é o de número 43, escrito em agosto de 2000. Pedi a Graça Rios um texto como prefácio. Procurei o desenhista Rubem Filho, também aqui pertinho, no Grajaú. O primeiro orçamento da Grafica Geraes data de 4.6.2001. Negociamos bastante, até que em início de julho contratamos a edição de 1.000 exemplares do “A Loucura do Cristal”. Em 10 de agosto recebi os exemplares, todos com defeito: faltando a folha de rosto. Devolvi a edição e ajudei na solução do problema. A folha de rosto, tal como se vê na primeira edição do ALDC é idéia minha: uma folha foi impressa e inserida nos exemplares, sem mutilação e com total aproveitamento do material impresso. Em 17 de agosto recebi, finalmente,995 exemplares (faltaram 5) de “A Loucura do Cristal”.

A etapa seguinte foi o lançamento do livro: aconteceu no dia 2 de dezembro de 2001, às 10 horas de um domingo, na Biblioteca Pública Infanto-Juvenil de BH. O lay-out do convite foi feito pelo Alexandre Gobbo.Foram impressos e distribuídos 330 convites em BH. A “festa” foi uma beleza: buffet farto, contadores de história dramatizaram alguns contos do livro, e a presença de mais de 50 pessoas. Foram vendidos 22 exemplares, cuja renda foi suficiente tão somente para pagar as despesas do buffet. Foi um dos dias mais felizes de minha vida.

A DISTRIBUIÇÃO DE “A LOUCURA DO CRISTAL”

Se a edição do livro foi difícil (enquanto fiquei atrás de editoras), a distribuição iria ser uma verdadeira “pedreira”. Desde setembro me coloquei em campo, procurando distribuidoras de livros. Por ser uma edição independente, não consegui o interesse de nenhuma distribuidora. Passei eu mesmo a percorrer as livrarias de BH, oferecendo exemplares em consignação. Em setembro de 2001 visitei mais de 30 livrarias e bancas de jornais, em BH e SSParaíso, deixando cerca de 100 volumes consignados. Um trabalho danado, que não teve retorno. Além do extravio (não houve devolução) de 8 exemplares. Ao mesmo tempo, enviei exemplares de cortesia a centenas de pessoas: amigos, conhecidos, editores, jornais. Pouco retorno. Entre 17 de agosto (data em que a edição “consertada” chegou em minhas mãos) e 31 de dezembro/2001, havia baixado no estoque (vendas/ofertas/consignações) apenas 200 exemplares.

PROJETO MILAMIGOS DE MILISTÓRIAS

No início de 2002, dei início a um projeto de distribuição de ALDC que chamei de Milamigos: Envio um ex. do livro, com carta, oferecendo o livro por R$ 15,oo. Na “Fase I”, em fevereiro, enviei 50 exemplares, tive um retorno (pagamento) de 23 ofertas, o que me deu um lucro de R$ 82,50. Na Fase 2, lançada em setembro, apenas 7 pagamentos, com um prejuízo de R$ 187,40. Foi o fim do projeto.

ARQUIVO DE IDÉIAS

Os trabalhos com a edição e a distribuição do primeiro volume, longe de me desanimar, me incentivaram a escrever cada vez mais. No arquivo de idéias ia procurar os temas os mais variados.. Esse arquivo de idéias é um repositório de tudo que me ocorre à mente ou que chega ao meu conhecimento, e que possa ser transformado em contos: sonhos que me impressionem, causos ouvidos aqui e ali, fotografias de alto impacto visual, reportagens, histórias de mistério, de assombrações, de crimes e de terror. A cada idéia dou um número, faço um resumo e arquivo. Quando desejo escrever um conto, percorro rapidamente esse arquivo, e lá está a inspiração que preciso. Quando se trata de eventos atuais (reportagens, por exemplo), sempre há o acréscimo de novas informações, que vão sendo agregadas até que haja material conclusivo para uma boa história. Quando escrevo este depoimento (primeira semana de 2003) tenho uma coleção de 680 idéias registradas, das quais aproveitei 200 em contos escritos até então, havendo um “estoque” de 480 idéias para serem aproveitadas. E a cada semana registro duas ou três idéias novas.

AS REVISORAS: SÍLVIA MARIA E GRAÇA RIOS

Graça Rios é a revisora oficial de meus contos. Cobra-me R$ 5,oo por página, o que lhe rendeu, nestes dois anos e meio, um total de R$ 2.635.oo. Silvia Maria revisou apenas 15 contos, cobrava-me R$ 1,oo por página, mas não tinha muito tempo, e logo terminou nosso trato. Continua, porém, me ajudando e fez o prefácio do Milistórias 2-A Babel da Torre.

Graça Rios me ajuda muito: a cada visita, quando recebo contos revisados e entrego novos originais para revisão, ela me dá verdadeiras aulas de literatura. Ficamos conversando por meia hora, ou mais, sobre os contos. Tenho muito a lhe agradecer, embora, como está acima registrado, ela ganhe um bom dinheirinho pela atividade.

ESTATÍSTICAS

Mantenho um registro estatístico de produção, conforme a quantidade de palavras em cada conto. Até o número 200 (inclusive com este depoimento que ainda estou escrevendo), temos a seguinte constatação:

Conto com maior quantidade de palavras: # 199-A cidade Perdida de Xingupurá— 4.915 pls

Conto menor: # 47- O Papagaio Morreu – com 322 palavras (piada recontada).

Dia de maior produção: 24.12.2001— Nesse dia escrevi, em uma sentada (começando na madrugada e indo até o meio dia) 3 contos infantis de Natal: #133— O Caçador Arrependido, # 134— O Burrinho que não era burro e # 135— A Estrelinha de Belém. Jamais havia cogitado de escrever histórias infantis, mas naquela manhã tive realmente a ajuda de alguma entidade: acordei com as idéias e escrevi os contos como se estivesse psico-digitando. Eu mesmo fiquei impressionado com o fato.

Contos escritos em 1999 (a partir de 25.8.99) — 9 contos com 13.924 palavras

Contos escritos em 2000 (52 semanas) — 55 contos com 101.555 palavras

Contos escritos em 2001 (52 semanas) — 72 contos com 121.262 palavras

Contos escritos em 2002 (52 semanas) — 64 contos com 104.501 palavras.

PARTE FINANCEIRA

Mantenho um registro acurado de todas as despesas com o Projeto Milistórias:

-Pagamentos feitos até 31.12.02 — R$ 10.166,88 (*)

-Recebimentos até 31.12.02— R$ 1.446,00,

-DEFICIT R$ 8.720,88.

(*) — Maiores pagamentos —

Revisão de textos à Graça Rios — R$ 2.635,00

A Loucura do Cristal— Custo ed.— R$ 3.827,00

ALDC- Despesas de distribuição— R$ 1.153,15

ABDT- Pago gráfica ed.7oo exs.— R$ 2.800,00

Ativo— 612 exemplares de Milistórias 1 – A Loucura do Cristal —

700 exemplares de Milistórias 2 – pagamento efetuado à gráfica.

CONCURSOS LITERÁRIOS

Tenho participado de inúmeros concursos literários:

— Prêmio Banco Real de Talentos da Maturidade –1999-1o ano – conto:“Vadinho Vai à Venda.”

— Idem, 2000, 2o. ano – conto: O Índio Surdo

— Idem, 2001, 3o. ano – conto: Ano que vem tem mais

— Idem, 2002, 4o. ano – conto: Peripécias da Polícia Montada.

— Concurso Cidade de Belo Horizonte(Prefeitura de BH)— 2002 – 9 contos inéditos

— Concurso Literário Newton Paiva 2002 — conto: Os Ciganos

MILISTÓRIAS 2 – A BABEL DA TORRE

Em 19 de janeiro de 2oo2 dei inicio à seleção de contos para edição do volume 2 da série Milistórias. Passei praticamente o ano todo procurando editor para o livro, e só em dezembro, ciente de que não encontraria editora, assumi a editar por minha conta e risco.

Em 15 de outubro visitei Nilo Beleza, que me apresentou orçamento. No dia 17 do mesmo mês tive orçamento da Gráfica Geraes, com a qual contratei a edição de 700 exemplares, pagando antecipadamente o valor de R$ 2.800,00(em 8.11.2002)

Nos meses de novembro e dezembro trabalhei na revisão dos originais e da boneca, sendo que em meados de dezembro já estava tudo pronto para rodar a edição, exceto o registro ISBN, que ainda estou tentando obter. Tudo leva a crer que no mês de MARÇO/2oo3 o livro “A Babel da Torre” já esteja impresso.

PROJETO CLAM

— Idéia seguinte: oferecer aos leitores que já conhecem A loucura do Cristal, a participação em um “Clube de Leitores Amigos de Milistórias”, mediante pagamento anual de 20 reais e com direito a recebver os dois volumes a serem editados em 2002 (A Babel da Torre e Pelos Caminhos da Vida). Alem de receber o boletim Milistórias, de publicação aleatória. Tudo para ser posto em prática a partir de janeiro de 2003.

ATIVIDADES ANO A ANO

1999 – Iniciando – Escrevi 9 contos. O nº 1 não tem diálogos; o nº 2 é o melhor do ano.

2000 – Escrevendo – Escrevi 55 contos. Destaques para # 25-Fome e # 42- A Loucura do Cristal (baseado em depoimento de ex-garimpeiro na Chapada dos Veadeiros)

2001 - Milistórias 1 – Além de escrever 72 contos (20 além d meta de 1 x semana),

trabalhei na edição e distribuição de “A Loucura do Cristal”.

2002 – Milamigos – Escrevi 64 contos (também superando a meta de 52 x ano) e trabalhei a idéia de “Milamigos”, que foi um fracasso.

PLANEJAMENTOS PARA 2003

2003 – Projeto CLAM – Clube de Amigos de Milistórias - A fim de conseguir 500 sócios para o Clube mantenedor de minhas futuras edições –

Milistórias 2 – A Babel da Torre- Já paguei a edição de 700 exemplares, já está formatado, as revisões efetuadas e aguardo apenas o registro na Biblioteca Nacional (ISBN) para autorizar a imprimir.

Milistórias 3 – Pelos Caminhos da Vida – Vou editar no 2o. semestre. O projeto é lançar 2 títulos por ano, a partir de 2003.

Boletim “Milistórias”– Estou trabalhando para uma edição trimestral.

Antonio Roque Gobbo –

Belo Horizonte, 4 de janeiro de 2003 –

CONTO # 200 DA SÉRIE MILISTÓRIAS

Antonio Roque Gobbo
Enviado por Antonio Roque Gobbo em 06/05/2014
Reeditado em 07/05/2014
Código do texto: T4796074
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