Negócio de Menino

(inspirado em conto homônimo de Rubens Braga)

Thiago nasceu com estrabismo, que mais tarde foi corrigido. Outra particularidade era o “pedindismo”, sua mãe passava enormes constrangimentos, pois a toda hora tinha gente dando coisa para ele comer. Ninguém resistia aquele olhar enviesado com a mãozinha gorda estendida. Com um pouco mais de um ano, usando óculos com tampão e cabelo cortado de príncipe, ficou ainda mais irresistível. Tivemos de proibir o exercício desta atividade. Toda vez que fosse flagrado pedindo alguma coisa tinha que ficar de castigo.

Um dia fomos visitar um casal de novos amigos, ao chegar a casa, o Thiago ficou maluco, o amigo era aficionado em hipismo, possuindo vários troféus com esculturas de cavalos espalhados pela casa, nova paixão do Thiago. O menino já estava cansado dos castigos e com a nossa presença, teve que desenvolver outra técnica para ganhar o troféu sem pedir.

Aí chegou perto do amigo e disse:

- Nossa quantos troféus o Senhor tem!

- É, tenho muitos.

-Quantos?

- Nem sei.

- Muitos mesmo, se nem sabe. Eu adoro cavalos – Olhando sobre o óculo tamponado e debaixo para cima. – Eu não tenho nenhum troféu.

Ao despedir dos novos amigos sai o Thiago com seu troféu, sem pedir. Um troféu até merecido, pois foi conseguido sem infringir as regras impostas.

– Eu não pedi, né pai? Ele deu porque quis.

– Falar o quê?

Até que um dia ele encontra um negociador insuperável, principalmente neste mundo agro pecuário, tinha fama de ter levado a melhor até com ciganos. Tio Calvino!

Mostraram para o Thiago, aquele senhor tem um monte de cavalos. (provocação de outro tio)

Thiago se aproxima, com aquele olhar irresistível, debaixo para cima.

-Ouvi falar que o senhor tem um monte de cavalos, Tio Calvino!

O Tio já conhecedor da fama do menino, e sempre muito atencioso com as crianças, dá corda na conversa. Pega o menino no colo, talvez para não ficar submetido àquele olhar. Responde:

-Tenho o necessário.

- Quantos?

- Ah nem sei Thiago, um dia nasce um, no outro a onça come outro...

- Se nem sabe, são muitos mesmo! Afirmando com a cabeça. – Tio, eu não tenho nenhum!

- Mas você não tem necessidade, Thiago!

- Mas eu adoro cavalos, Tio!

Espertamente o Tio doa um cavalo para o Thiago, a fazenda dele ficava a mais de 1000 km de Belo Horizonte, onde morávamos na época. O frete que se pagaria daria para comprar dois cavalos.

- Vou te dar um cavalo então, mas seu pai tem que buscar lá, tá?

O menino ficou encantado com a prodigalidade do tio.

Nunca fomos buscar este cavalo, além do frete ser muito caro, o cavalo deveria ser algum refugo e, ainda o quarto do Thiago era muito pequeno para comportar animas deste porte.

Defranco
Enviado por Defranco em 22/03/2014
Código do texto: T4739112
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