Croniquetas Curtíssimas da Desértica Curitiba Versão 2014.

“A natureza é ciclíca.

O ser humano é que não aprende.”

Geraldo Töpera

—Não acredito que os motorista e cobradores fizeram greve de novo a poucos dias do carnaval!

—Eita, porra! Sindicatozinho mais combativo esse dos caras, não?

—Sem dúvida! É assim que se faz greve. Para tudo! Simples assim. Minha geração derrubou um presidente, bicho, e essa pirralhada de hoje em dia que só fica na “telinha” e na “telona” fazendo bandalho, quebradeira, bebedeira e tirando fotinho digital pra aparecer bonito no Instragram? Só falta postar a legenda: “manhê, não fique preocupada, viu? Tô na manifestação, ti amo”, ora veja....

—Parece um nazista falando...Cê não acha as manifestações legítimas?

—Legitimidade não vem ao caso. Qualquer manifestação popular é válida desde que exista pauta. Pergunta pra esses babacas que tiraram diplominha da faculdade anteontem e essas cocotinhas gostosinhas que passaram em concurseco público ou tiraram a OAB na semana passada contra que eles são tão do contra? Aí um zé mané desses te responde: “Sou contra tudo” ainda usando aquela pose de socialista tão ultrapassada, e você repete e pergunta tipo: “Contra tudo o quê”? E eles viram pra você com aquela expressão que foi VOCÊ que enlouqueceu. Um cu de firula desses utiliza do transporte público? Nem precisa me responder que não, que vão pra “facul” com o carrinho do ano que ganharam do papai e da mamãe quando passou no vestibular em faculdade pública porque teve a manha que viver pra estudar até se formar. É com eu disse. Nada vai mudar com esse povinho bunda que habita essa terra de ninguém. Não adianta teorizar. O saco encheu. A samsara girou. E o “Gigante” acordou, brincou o “São João”, tomou um porre daqueles e voltou a dormir. E a gente que pagou a conta. Os motorista estão dando o troco. A temível “Vingança do Pipoqueiro”, sacou?

—Acho que sei aonde você quer chegar? Mas não tem saída? Você acha mesmo?

—Claro que tem saída, irmão! Aeroporto Internacional de Curitiba que fica em São José dos Pinhais , vulgo Afonso Pena! Com destino a Buenos Aires, Montevidéu e onde mais você puder desembarcar!

*

—Quem tá aí?

—Só eu e o serviço...

—Como você chegou aí?

—Há quanto tempo você trabalha comigo? Oito anos? Não foi até comer coelho com arroz arbóreo o tomar cerveja no meu apartamento no meu aniversário? Onde é que eu moro? Vim andando, como venho todos os dias. São só cinco quilômetros ...Você sabe que eu não dirijo.

—Ah, então segura a minha bronca que sem ônibus está foda. Não vou trabalhar hoje, pode deixar que amanhã – se a situação normalizar, eu faço o meu serviço. Pode deixar tudo na minha mesa que eu me encarrego, não esquente a cabeça, faz o seu que eu faço o meu, ok?

—Mas, minha querida, cadê seu carro?

—Na garagem da minha casa, ora? Onde mais? Meu marido vai sair com ele mais tarde. E não é dia de greve ônibus? Não vou colocar meu carro na rua num dia como hoje, de jeito nenhum!

—...

*

—Nem fui trabalhar hoje...

—Nem eu.

—Se amanhã for como hoje também nem vou. Fiz isso naquele outra greve dois anos atrás.

—E o teu patrão?

—Come na minha mão, o trouxa. Ele sabe que se eu pedir as contas daquela bosta que ele comanda tudo vai pro saco. Eu que boto aquela piazada e a peãozada pra rebolar, comigo na “voz ativa” esse povo pula miudinho e dá o sangue e o suor e as lágrimas e ainda me pagam um misto frio com uma média e um pastel de queijo e me agradecem.Eu mantenho o emprego deles e eles fazem tudo eu mando. Quem mantém as engrenagens funcionando por lá? Oito anos de firma, rapá! Só meu chefe tem mais tempo de casa que eu e tem só quatro anos a mais. Ninguém aguenta o negócio. Nem me importo. Nem quero saber quem envernizou a asa da barata contanto que eu veja o meu rico dinheirinho no fim do mês e que me paguem em dia.

—Ah, vá!

*

—O que cê tanto fuça na internet, homem?!

—Tô vendo se tem busum pra ir trabalhar, mulher! Porra, mas será a cobra? Eu falo birmanês nessa casa? Não te disse que eu tenho um texto pra entregar pro “maravilha” que está me pagando e a nossa comida e as tuas contas e a merda do teu batom até sexta feira? Segunda já é “festim da carne”, prenúncio de “ano novo brasileiro”. E essa agora? Também, quem mandou ser gente fina e sair do apartamento do centrão porque a minha esposinha queria uma casinha com cerquinha branca no meio “da suburbia”?

—Você tem que querer parecer inteligente toda hora? Você sabia desde ontem a noite que os caras iam parar! Todo intelectualóide, escritor, poeta, colunista, letrista de banda punk, cantor de cabaré, música de estúdio requisitado, dois livros lançados, a caminho do segundo disco autoral e não se programa pra uma greve de ônibus? Porque tem que ir pro escritório? Bota a moringa pra funcionar e se vira! Manda a criatividade pra cabeça e escreve esse bosta desse texto!

—Como eu vou escrever com você quixotando pela casa, ouvindo essa droga de Led Zeppelin? Parece que tem bicho carpinteiro? Afinal, cê vai trabalhar?

—Evidente, Einstein! Acha que sou você? A loja é minha, afinal. Vou vender meus incensinhos e nem preciso do teu texto pra comprar meu batom e uma caixinha de cerveja pra você de lambuja. E quem mandou me apresentar essa “merda de Led Zeppelin”? Agora aguente!

—Babe, você me deu uma ideia genial! Vou escrever um texto falando da dificuldade de um escritor para fazer seu trabalho e de como existe um preconceito com as pessoas que não se enquadram na “linha de montagem” do sistema vigente! Babe, você é genial! Sabia que eu tinha acertado em me casar com essa lindeza de esposa que eu tenho! Vou começar agora mesmo! (levanta-se da cadeira e estala um beijo nos lábios vermelhos da moça ). Vai, prepara um suco de tomate com vodca pra esse escritor que vou mandar um texto infernal! Vou até pedir uma graninha a mais. Vai, babe, capricha no drinque! ( E começa a digitar em seu computador pessoal ).

*

Geraldo Topera
Enviado por Geraldo Topera em 26/02/2014
Código do texto: T4707145
Classificação de conteúdo: seguro
Copyright © 2014. Todos os direitos reservados.
Você não pode copiar, exibir, distribuir, executar, criar obras derivadas nem fazer uso comercial desta obra sem a devida permissão do autor.