Um novo amanhecer
Mariana acordou se sentindo leve, espreguiçou-se e saiu da cama. Tomou um cafezinho, acendeu um cigarro e sentou-se na sala aproveitando aquele momento esplendoroso que sucede o despertar de um novo dia.
Quando acabou de fumar, resolveu se olhar no espelho e pensou: Nossa, ainda estou inteira, nem pareço ter a idade que tenho. Meu rosto ainda tem traços bonitos, meus olhos se parecem à cada dia mais com os do meu irmão e meu pai; o tipo mingnon facilitou o envelhecer sem aparentar a idade que tem. O jeito despojado de se vestir, o ar blasé, o jeito de sorrir. Realmente como já ouvira diversas vezes, o tempo foi generoso com ela.
E foi nesse estado de espírito que começou a fazer planos. Havia tanto ainda para ver e fazer no mundo. Fugir da vida e das pessoas? Para quê? Por que esconder a beleza que ainda possuía? Não havia motivos para isso.
E ainda por cima era uma mulher culta e que não suportava fofocas e futilidades. Tinha muito ainda a oferecer ao mundo. Afinal, os amigos dos filhos a apreciavam tanto. Algo deveria ter. Sim, sabia que chamava a atenção das pessoas, e não era pelo cabelo curtíssimo, mas pelo conjunto, pelo seu jeito de andar e de se vestir. Vários foram os elogios que sempre recebeu, alguns foram ouvidos não por ela, mas pelo marido e filhos, que se sentiam orgulhosos e a chamavam para sair e exibi-la a todos.
Sempre valorizara o intelecto e se orgulhava dele, mas hoje percebeu que havia muito mais do que se orgulhar: a aparência. Ainda bonita e inteligente. Ela que sempre rejeitara espelhos, passou a perceber que olhar-se a fazia bem. Não era à toa que por diversas vezes teve aborrecimentos por ser admirada, ainda era passível disso.
Mariana ligou o som e resolveu que o seu dia seria muito musical. Faria tudo o que tinha que fazer e ia dar uma volta, um passeio pela cidade. Livrarias, cafés, lanchonetes, lojas de Cds e DVDs, etc. Seu aniversário estava chegando e todos em casa perguntavam o que desejava ganhar. Não, esse ano eu não quero livros, já os tenho em demasia para ler até o final da vida. Será que poderiam lhe dar mais alegria? Não, isso não vendia, só dependia dela.
O antigo namorado que sonhava em revê-la, ainda mais depois que ouvira dos amigos que ela em nada mudara durante todos aqueles anos. Mas ela achava que voltar ao passado não era algo muito aprazível. Apenas servia para elevar o seu ego, por si só já bastante grande.
Neste exato momento a campainha tocou. Quem será à essa hora? Abriu a porta e se deparou com uma de suas melhores amigas. Ela estava tensa, angustiada. Mas o que terá acontecido? A amiga descobrira que seu marido a traía. Mariana, que já passara por essa experiência aconselhou-a: ou você se separa ou vai levando a vida, mas sem permitir que ele lhe toque. Vá saber com que tipo de mulher esse homem está saindo.
E, assim como ela fez consigo mesma, levou a amiga até o espelho e disse: Olha! O que vê? A outra disse estar vendo um caco humano. Mas Mariana não deixou que ela se visse assim: Luciana, você ainda é linda, com uma pele maravilhosa, um corpo que não é de ninfeta, mas ainda está sedutora. Desista de não se amar. Se o seu marido foi em busca de outra, problema dele e não seu. Ame-se e invista em seu crescimento interior, em novas amizades. Mas, por favor, nada de virar uma religiosa devido à frustração e nem de achar que todos os homens são iguais. Ainda existem cavalheiros no mundo e eu sempre ouvi falar que o segundo casamento é bem melhor do que o primeiro. Então, vamos à vida?
Luciana sorriu e, ainda olhando-se no espelho, disse: Você tem razão, Mariana. Eu não estou acabada. Tenho o ar digno e demonstro respeitabilidade. Não vou me entregar ao desespero. Mariana sorriu, pois um dia sentira-se exatamente como Luciana, mas hoje acordou com os pés cravados no chão e a certeza de que estava viva e muito bem consigo mesma.
E as duas resolveram comemorar a liberdade. Afinal, a mulher traída é livre. O marido que carregue o peso da traição.
Campos dos Goytacazes, 22 de janeiro de 2014 – 09:27 horas