Aniversário

Sua Sogra chegou a porta do pequeno escritório que ele tinha em casa e lhe disse, a Estelinha está vindo e disse pra voce se aprontar que nós vamos ao aniversário da Dona Evilásia. Ele estava ali, absorto naquele resto de trabalho do fim do dia, aquelas coisas que não se pode adiar. Respondeu: tá, vou tomar banho pra gente ir. Esticou o corpo, deu os últimos toques no teclado do "notebook", ajustou algumas coisas, desligou a máquina, o ar e as lampadas e pensou "Salve-se quem puder" chega de trabalho por hoje, amanhã pela manhã resolvo tudo que faltou. Trancou a porta ouvindo o barulho do carro sendo estacionado.

Stélinha veio batendo o salto daquele seu jeito sempre animado, rindo e resmungando, transpirando trabalho o tempo todo. Ele lhe deu aquele beijinho de cumprimento olhou no relógio e indagou, chegou mais cedo? Sai, correndo pra gente ir ao aniversário. Ele disse: Vou tomar banho. Ha!! não vai não, vamos chegar lá muito tarde. Ha!! vou sim, ele respondeu, se não me esperar vai sózinha. Stélinha resmungou um pouco, saiu batendo salto na direção da cachorra labrador da familia. Ele olhou a cachorra saltando alegre sobre Stélinha, que dizia "cadê o bebê da mamãe, cadê o bebê da mamãe, ficou com saudade da mamãe? Pensou consigo: "bem que eu gostaria de ter um tratamento desse" Sofia, a cachorra, era mais bem tratada que todos da familia. Era o jeito de Stélinha, que na verdade era uma mulher que cuidava de todos e da casa com maestria, a cachorra era um desabafo pra ela, um mimo, um relax. Sempre abanando aquele rabão branco como se fosse um leque, batendo no sofá, nas cadeiras, nas portas, derrubando e quebrando tudo, era um desastre de alegria sem fim.

Entrou no banheiro e deu graças a Deus pela água fresca escorrendo pelo corpo e lavando todo o suor e poeira do dia calorento. Esticou os braços, apoiou sobre o box sentindo aquela cachoeira benfazeja escorrendo pelo corpo todo. Aquilo não durou nem cinco minutos e Stélinha já estava gritando "vai ficar até amanhã aí?". Tirou a última espuma de sabonete a contragosto, ficaria ali pelo menos mais vinte minutos. Enxugou-se e saiu.

Entrou no carro, ajustou os espelhos, ligou o ar condicionado no máximo, para dar aquele choque no calor da carroceria, andou dois quarteirões e já ouviu a Sogra, Dona Adelaide reclamar "tô com frio", teve vontade de responder "quando a senhora morrer isso acaba" mas preferiu ser educado e atencioso, afinal, ela era a mãe de Stélinha, valia a pena ficar de boca fechada.

Atravessou a cidade calado, ouvindo Stélinha tagarelar sobre o seu dia e sobre assuntos e causos que aconteceram naquele dia de trabalho, pensou: Stélinha merece cada minuto do meu tempo em ouvir as suas histórias. Era assim que ela desabafava e ficava feliz, ele adorava fazê-la feliz.

Estacionou frente a casa de Dona Evilásia, destravou as portas do automóvel e ficou esperando Stélinha guinchar Dona Adelaide que pela idade, já estava com as dobradiças rangendo. Foi aquele sacrificio tirar sua sogrinha friorenta de lá.

Atravessou a rua, enquanto Stélinha e dona marcha lenta não chegavam. Tocou a campainha, do outro lado: Quem é? Aqui é o vizinho gostosão, entra vizinho gostosão e destravou o portão.

Ele levou uma garrafa de vinho Lambrusco para Dona Evilásia e um queijo provençal para Gertrudes sua filha. Dona Evilásia veio recepcioná-los no corredor de sua linda casa.

A mesa estava posta e os convidados todos sentados, ele, educadamente foi apertando as mãos dos cavalheiros e beijando as meninas, mulheres e senhoras. Gertrudes já foi dizendo, senta aqui, arrastando uma cadeira de palha bem confortável. Ajeitou-se por ali, ao lado de Stélinha e da Sogra paradinha.

Ficou ali, sentado, observando o movimento. Alguns convidados olhavam de baixo para cima e de cima para baixo, como se o ar do mundo tivesse sido feito só para eles. Alguns convidados, conhecidos, nem se dignaram a virar a cabeça e trocar qualquer palavra ou assunto do cotidiano. Ficou ali, observando Stélinha confraternizando com o povo, como se nada estivesse acontecendo.

Tomou uns goles de cerveja gelada na taça que lhe serviram, estava uma delicia. Um pouco de patê com torradas, azeitonas graúdas, amendoins torrados, daqueles grandes selecionados, rodelas de salame com limão, patês de tomates secos com hortelã, estava tudo muito bom, servido com muito carinho por Gertrudes e Dona Evilásia, dois amores de pessoas. Ele pensou: Enquanto observava os entojados comilões já satisfeitos, chupando os nacos de queijo e as azeitonas, naquele estilo de quem já encheu o bucho, "quando será que esse povo vai embora? Pareceu mágica, alguns já se levantaram para ir embora, Gertrudes, educadamente disse que já ia cortar o bolo.

Voltaram para suas cadeiras como se estivessem fazendo um favor para a aniversariante.

O bolo de côco foi colocado sobre a mesa e as velinhas indicando setenta e tantos anos foram acesas. O canto de parabéns espalhou-se pelo ar liberando sorrisos aqui e acolá. Os flashs dispararam aqui e ali, registrando o momento especial. O bolo foi cortado a jato para dispensar os intratáveis grosseirões. Ele não via a hora de dispensar as companhias tão especiais.

Os convidados foram embora e Gertrudes já veio de lá com cara de alegre, soltando um graças a Deus. Tem convidado que quando chega em sua casa, você já põe a vassoura atrás da porta para ir embora logo, infelizmente é assim.

Ficamos boas horas ali, batendo papo e rindo, enquanto destiláva-se um veneninho aqui outro ali, típico do ser humano que adora uma fofoquinha. Provavelmente, do lado de lá, fomos motivo de muitas conversas. O aniversário foi maravilhoso. Stélinha conversou tanto que o deixou com fogo nas ventas. Aniversário de meio de semana faz a gente acordar cansado.