Até tu?
18:30h, Sérgio e Paulo, dois amigos inseparáveis, se deslocavam como sempre ao restaurante próximo ao seu prédio, um pequeno conjunto residencial perfeito para pessoas divorciadas ou que, por opção, preferiam morar só, é perfeito, pequeno e prático, bem servido ao seu redor.
Ambos eram vizinhos, colegas no passado, no presente estreitaram sua amizade. Iam sempre juntos ao pequeno restaurante, que na verdade parecia mais um boteco. Mas o que perdia na aparência, ganhava no sabor das refeições que ali serviam. Os dois adoravam almoçar ou jantar, e o preço era bastante convidativo.
_ Porra, Paulo, é gostosa a comida, mas é foda aguentar dona Rita com sua música e sua pregação, querendo nos converter, né?
_ É, mas enquanto o sabor e o preço forem daquele jeito, não tô nem aí, foda-se!
_ Mas que é chato pra caralho é!
_ Tô nem aí!
Chegaram, fizeram os pedidos e dona Rita servindo e pregando, de vez em quando solta um hino que mais parece um gemido de unha encravada. Nesse dia, estava mais inspirada que nunca e o clima, que deveria ser de degustação, começou a ficar com um ar depressivo e melancólico, os clientes nada diziam, apenas escutando e dona Rita em êxtase, falava, falava, falava...
_ Cala a boca, sua porra doida!!!-gritou Sérgio tão alto e de maneira inesperada, para surpresa de todos e talvez dele mesmo.
De repente, foi aquele silêncio. Todos olhavam para Sérgio e dona Rita, o que aconteceria? ninguém teria coragem de enfrentá-la, apesar de muitos, naquele momento, sentirem inveja de Sérgio.
_ Você acredita em quê?_ gritou dona Rita.
_ Sou ateu!_ respondeu Sérgio no mesmo tom.
_ Eu até entendo não acreditar em Deus, mas ser ateu!!! Já pra fora do meu restaurante_gritou dona Rita.
_ E vou mesmo sair dessa merda, sua maluca! gritou Sérgio saindo.
Nisso dona Rita vira-se para Paulo:
_ Ei, mocinho, você é parceiro dele, saia do meu santo lar agora!
Paulo olha para Sérgio, olha para a comida, pensa, olha para dona Rita.
_ Jamais, dona Rita, não ando com herege, glória ao Senhor!