SOLUÇÃO SEM CULPA
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“Ouça, vá viver a sua culpa com outro bem.
Hoje, eu já cansei de pra você não ser ninguém...”.
(Maysa).
“De que vale a gente fazer planos?
Quando a gente encontra quem se quer,
o destino vem com seus enganos
e faz da nossa vida o que quiser...”.
(Kátia).
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Era uma vez um casal brasileiro... O chefe da família, funcionário de uma empresa multinacional, seria promovido com um excelente salário, caso aceitasse se transferir com a família para outro país. A dona da casa, além de cuidar dos três filhos e da organização do lar, sempre aconselhava o marido a não desperdiçar boas oportunidades de evoluir profissionalmente. Por isso, ela o aconselhou a aceitar a proposta de mudança. Logo, a família viajou para o Japão.
Os seis primeiros meses do casal após a mudança foram maravilhosos. No sétimo mês, o marido começou a mudar de comportamento. Passou a dormir fora de casa e deixou de dar a atenção devida a esposa e aos filhos. Não foi difícil para a dona de casa saber que seu marido estava tendo um caso com uma gueixa. Após descobrir o endereço da dita cuja, ela foi lá, fez escândalo e ameaças à “concorrente”, acusando-a de estar “destruindo um lar feliz” e determinou: -“Afaste-se do meu marido!”. A gueixa, com toda a paciência oriental, respondeu: “Ora, seja razoável... Eu nunca fui, e nem pretendo, ir até a sua casa. Mas, não vou impedir que seu marido entre na minha, quantas vezes ele me procurar.”. Mal acabou de pronunciar as últimas frases, a gueixa recebeu um violento bofete da mulher descontrolada, que se foi bradando impropérios.
A esposa e a amante ocultaram do pivô da briga a dramática ocorrência. Ele continuou a visitar uma e a morar com a outra. O receio de perder o marido fez a esposa transferir a culpa do seu drama familiar para a gueixa que insistia em manter a “falida sociedade conjugal”. Ela passou a tratar o marido com uma desconfiança dissimulada, dispensando-o, de forma obcecada e doentia, uma pseudo atenção carinhosa e submissa, uma conduta desprovida da espontaneidade necessária para que ela reacendesse a antiga chama da paixão na qual ambos se aqueceram durante anos.
Sem conseguir o intento de reconquistar o marido, a esposa adoeceu, e passou a culpar a gueixa, a empresa onde o marido trabalhava, o país para o qual haviam se mudado; culpou a tudo e a todos enfim, pela sua enfermidade sentimental. Orientada por uma velha e sábia vizinha, a adoentada foi se aconselhar com um honorável mestre budista. Após ouvir o drama da infeliz, o mestre contou a seguinte história:
“Certo dia, uma mulher adoeceu. Pelos sintomas apresentados, suspeitou que estava com dengue. Antes de procurar um médico para confirmar o diagnóstico e tratar a doença, ela exigiu que a secretaria de saúde enviasse um técnico para investigar se nas casas vizinhas, da direita e da esquerda, haviam reservatórios do mosquito causador da doença. Não foram encontrados focos nas casas “suspeitas”. Só após satisfazer tal curiosidade, a mulher procurou atendimento médico tomou as medicações sintomáticas necessárias, ficou em repouso e, em uma semana, recuperou-se da doença . Ela se arrependeu de ter suspeitado dos vizinhos, e entendeu que quando se tem um problema em casa, não adianta transferir a culpa para as casas alheias. O certo é alguém tentar resolver seu próprio problema, ao invés de perder tempo tentando procurar culpados. Nem a propósito, o ônus da culpa pela doença da protagonista da história cabe ao mosquito, e não aos vizinhos”.
Ao ouvir a narrativa do mestre budista a dona de casa brasileira, sem conseguir dissimular a impaciência, perguntou: -“Então, o senhor quer dizer que eu sou a culpada por meu esposo ter me traído?”. Inabalável, o mestre respondeu: - “Ora, veja só... Você continua dando importância ao que é menos importante. Eis o seu principal erro e, também, a sua única e maior culpa. Ao invés de buscar culpados para o problema que o aflige. Concentre-se, apenas, em tentar resolver o seu problema, e encontrará uma solução.”.
A solução que a dona de casa brasileira encontrou foi comunicar ao marido que, há tempos, já sabia estar sendo traída por ele. E, decidida, afirmou: “Cansei de tentar manter nosso casamento. Hoje, resolvi cuidar da minha saúde e do bem estar dos nossos filhos. Exijo que você me conceda o divórcio. Meu advogado manterá contato. Vou deixar o Japão e voltar ao Brasil a tempo de desfrutar das alegrias do Carnaval.”. Incrédulo, o marido implorou a reconciliação, prometeu encerrar o relacionamento extra-conjugal e jurou manter a paz familiar. A esposa respondeu: “Não quero mais viver ao seu lado. Nada irá encerrar a desconfiança que continuarei sentido por você. Meu sentimento de culpa acaba aqui e a nossa história conjugal também”. De fato, acabou mesmo...
Paulo Marcelo Braga
(Belém, 11/03/2006).