Por um momento de felicidade...

Lembro-me daquela noite fria de segunda-feira na fazenda, embora o melhor seria esquecê-la.

Morava em um cômodo bem pequeno, afastada dos donos da casa.

E, sempre pela manhã ao me levantar, antes de começar a cuidar da casa, aspirava o ar fresco que vinha da montanha como se fosse um bálsamo para a minha tristeza, um aroma preparado que me ajudou a enfrentar o dia ensolarado e lindo que chegava de mansinho. Ao contemplar a natureza, namorava os pássaros, o lago, o verde do campo... enfim, tudo que alimentasse o meu ser de esperanças.

Mas, por quê, aquela noite passada? Sempre fora uma pessoa que obedecera, rigorosamente, às ordens impostas pelos meus patrões.

Oh, Meu Deus! Por quê? Eu custei tanto a conseguir este emprego e agora o acontecido implicará demissão. Mas prefiro perdão a castigo. E, atendendo ao meu coração, resolvi desabafar com a minha patroa sem pensar nas conseqÜências.

- Dona Eduarda, a senhora me perdoa?

- O que aconteceu, Ritinha? Você está tão pálida! Quero-lhe muito! Simpatizo com você desde que veio trabalhar conosco.

- Desculpe, dona Eduarda, não sei como começar... Mas, por favor, perdoe-me... A senhora foi muito boa para mim. Pagou os meus estudos, e, se hoje, eu curso uma faculdade, só tenho a agradecer, porém, traí a sua confiança.

- Fale logo, Ritinha, o que aconteceu de tão grave, minha filha?

- Estou grávida...

- Grávida! De quem?

- Do seu filho, o Cláudio.

Dona Eduarda esforçou-se para não chorar. Aquele momento era muito delicado e ela conhecia por demais seu filho, pois já não era a primeira vez que Cláudio não se responsabilizava pelos seus atos. Admitindo o erro do filho e sua culpa também, dona Eduarda me revelou:

- Rita, quem deve pedir desculpas a você sou eu. Proporcionei tudo do bom e do melhor para Cláudio, infelizmente, ele não soube conduzir a vida. Consenti nos erros dele, desinteressando-me totalmente. Tentei o diálogo, mas não adiantou. Assisti a tudo, desejosa de que ele mudasse o comportamento. Ofereci a ele a minha ajuda, porque você, Rita, não foi a primeira. Agora depende de mim... Não fique assim, querida...

- Dona Eduarda, ele quer que eu faça o aborto, mas eu não quero... Sinto muito, contudo, terei meu filho sozinha e longe daqui.

- Não, Ritinha, dessa vez não ficarei apática a essa situação. Tudo será resolvido. Fique calma! Vá para o seu quarto porque, a qualquer momento, Cláudio chegará e conversarei com ele, seriamente e determinada, como já deveria ter feito há muitos anos.

Depois da conversa com dona Eduarda, retirei-me sem saber o quê dizer. Fui para o meu quarto, pensando em abandonar aquela casa o mais rápido possível e fugir para junto de meus pais no interior. Queria ter meu filho longe de Cláudio que só quis se divertir com a empregada da casa. Ah! Mas como eu o amava...

Arrumei algumas roupas em uma mala pequena sem parar de pensar "Por que você fez isso, Cláudio? Simpatizei-me com você desde que cheguei aqui, mas não me aproximei de você porque tinha medo dos meus patrões. O que eles pensariam? Que eu me aproveitaria deles só pelo fato de serem ricos. Oh! Meu Deus! E minha mãe, aceitará essa situação? Envolvi-me por amor, entreguei-me sem pensar nas conseqüências. E agora, apesar de dona Eduarda estar solidária comigo, o que Cláudio imaginará, que eu estou me valendo da situação por interesse...?"

Estava perdida em meus pensamentos, quando vi do meu quarto, Cláudio chegar de carro acompanhado de uma moça vistosa, alta, linda e aos beijos e abraços, parecendo muito apaixonados.

Depois que entraram, saí do meu quartinho e fui até a porta da sala de jantar para tentar ouvir a conversa. Sei que o meu procedimento estava errado, mas se tratava da minha vida, do meu filho...

Assim que se acomodaram à mesa, escutei a voz de dona Eduarda.

- Cláudio?

- Sim, mamãe!

- Gostaria de conversar com você!

- Agora, mãe, vamos deixar pra depois... Ah! Deixa eu te apresentar a Gracinha! Gracinha, esta é a primeira paixão da minha vida, a mamãe! Mamãe, esta é a Gracinha, a minha paixãozinha!

- Muito prazer, dona...

- Eduarda, Eduarda é o meu nome! Mas, vamos deixar de cerimônias... Cláudio, preciso falar com você, AGORA, JÁ!

- Ah! Mãe, depois...

- Bem, se é assim, falarei a frente da Gracinha, não é esse o seu nome?

- Fale então, mãe, o que está acontecendo de tão grave que não pode ficar para outra hora?

- Cláudio, a Rita está esperando um filho seu e dessa vez você vai assumir não só a criança, como também a Rita.

- Mãe, você ficou louca!

- Louco está você...

Do lado de fora da porta, escondida, vi que a Gracinha ficou pálida...

- Cláudio, isso é verdade?

- Gracinha, meu amor, a minha mãe deve estar brincando...

- Não estou, Cláudio! Levante-se e vá levar a sua "Gracinha" em casa. Aguardarei a sua volta para que possamos conversar melhor!

- Mas, mamãe...

- Nem mais uma palavra, Cláudio. Ficarei esperando... Desculpe, Gracinha, você não tem culpa. Provavelmente é mais uma vítima.

Fiquei desesperada com as palavras de dona Eduarda. Tenho certeza de que Cláudio iria me odiar. Ele não concordaria... É claro que fui um divertimento só por uma noite... Corri apavorada para o meu cantinho e chorei muito. Acabei adormecendo... Acordei com dona Eduarda me chamando...

- Rita, Ritinha, venha à sala, minha filha, Cláudio já chegou. Gostaria de conversar com ele na sua presença.

- Dona Eduarda, por favor, estou com medo...

- Não precisa ter medo, estou aqui para protegê-la. Venha, vista um agasalho que o tempo esfriou, e eu não quero que o meu netinho sinta frio...

Por um momento, fiquei feliz, rezei muito para que tudo desse certo.

Quando chegamos à sala, a fisionomia de Cláudio era abatida, triste...

- E agora, Cláudio, falou dona Eduarda, o que você tem a nos dizer?

- Mamãe... eu sei que errei, mas não resisti aos encantos da Ritinha e aconteceu...

- Como? indagou Eduarda.

- Mãe, desde que a Rita veio morar conosco, eu me apaixonei por ela... mas...

- Agora você vai me dizer que tudo aconteceu por amor!

- Sim, mamãe, e eu vou assumir meu filho e a Rita também.

- Dona Eduarda...

- Fale, Rita...

- Deixe-me ir embora. Ele está com pena de mim!

- Não, Rita, eu te amo! Por favor! Acredite em mim! Pensei melhor e não adianta levar essa vida de farras e mulheres porque você não me sai da cabeça.

- Cláudio - perguntou dona Eduarda - você está falando a verdade?

- Sim, mamãe, e olha, pode marcar o casamento. Eu quero casar com a Rita.

Depois daquela revelação, eu não sabia se ria ou chorava. Estava tão contente que acreditei em Cláudio. Era o momento mais feliz da minha vida.

Dona Eduarda me abraçou muito sorridente, prometendo que tudo daria certo. Talvez por tê-la como grande aliada, o otimismo tomou conta de mim, fazendo com que eu realizasse o mais belo sonho de minha vida.

Hoje, meu filho tem cinco anos, porém apesar de me sentir bem ao lado de minha sogra, a tristeza será minha eterna companheira, porque Cláudio foi embora... e nos deixou...

Profª. Silvia Terezinha Rezende Macedo

Conto estruturado com a finalidade de trabalhar nas aulas de Língua Portuguesa: a norma culta, regência verbal, crase, regência nominal, tempos verbais, transitividade verbal, sinonímia, antonímia...

além da interpretação, a linguagem coloquial,o diálogo e a questões do aborto e da discriminação(temas importantes que devem ser explorados e debatidos com os alunos)