O urro do burro
A Revolução botava o Brasil nos trilhos - enquanto eliminava as ferrovias - e o
Missanta nem hesitou: com os quarenta e cinco contos que a Companhia lhe pagara de
indenização reformou a casa e comprou uma carroça. Não ia mais dar burradas.
A casinha ficou um brinco, com sua laje escondendo aquelas telhas enfumaçadas,
cheias de e picumãs. O que se viam agora eram as belas estrelas vermelhas que lhe
dera na cabeça pintar, sem nada ter a ver com um Prestes ou um PT que ainda levaria
tempo pra germinar.
O sustento agora, além de uns cobres que haviam sobrado e foram colocados na
poupança, viria do burrinho pro qual não haviam de faltar capim ou carreto. E o
chicote entrou em ação.
Missanta, que era Antônio por batismo, mal se lembrava que ganhara o apelido ainda
piquitito quando, tentando abrandar a brabeza do pai, reagia com choro e sangue
gritando, ou querendo significar, "assim você me sangra, pai". Do me sangra ao
missanta, a mudança não fora tanta. Já o burrinho, aguentou só mais um tantinho.