Precisa-se para casar
Eu estava na redação do jornal quando aquele sujeito chegou querendo publicar uma nota na seção: negócios e oportunidades. Mostrou-se educado e muito afoito, eu não pensei que daria no que deu, mas as aparências enganam, não é mesmo?
- Bom dia.
- Bom dia. Posso ajudá-lo?
- Eu gostaria de colocar uma nota no jornal.
- E do que se trata?
- É um anúncio de algo que eu quero arrumar. O senhor pode publicar?
- Posso sim. Preciso lê-lo, fazer a correção e depois mandar para a impressão.
- Mas é de graça?
- É sim. Desde que não seja propaganda.
- Quantos dias sairão publicados?
- Sete dias. Está bom para o senhor?
- Está ótimo, já que é de graça mesmo. Mas não me chama de senhor que não sou tão velho assim.
- Desculpe-me, é só por educação.
Enquanto eu preenchia uma ficha ele ficou me perguntando como funcionava o jornal, quem fazia as matérias e mais um monte de coisas que nem vale a pena dizer, até que finalmente me passou uma folha de papel toda amassada onde estava escrito o bendito anúncio, o qual não me deixou ler direito, pois continuou falando o tempo todo e gesticulando com as mãos. Falou-me que trabalhava na feira vendendo verduras e legumes, que ele mesmo os plantava e que um dia faria uma propaganda da sua barraca no jornal. Mesmo com todo aquele falatório, acabei lendo o papel e nele estava escrito, sem tirar e nem por, exatamente o que segue abaixo:
“Precisa-se para casar no dia 27 de janeiro próximo.
A papelada já está toda pronta e já foi tudo acertado com o padre. Vai ter até uma festinha para meus amigos, já que eles irão pagar tudo. A data já foi marcada e os convites já foram distribuídos. Só que para me casar e realizar meu sonho por completo, preciso de algo que ainda não tenho e que para mim realmente é essencial num casamento e sem ela o padre não me casaria.
Não é que sou muito exigente, mas já procurei muito e não achei nenhuma do meu agrado ou do meu jeito.
Uma vez arrumei uma japonesa, só que ela era bem maior que eu. Fiquei então pensando na multidão de convidados que veriam entrando na igreja com ela, que era realmente enorme, com certeza eles ririam de mim.
Depois arrumei uma portuguesinha, só que ela era preta, não tenho nada contra a cor, mas dou preferência para uma branca.
Conheci um rapaz que havia se casado com uma italiana, não a queria mais e a cederia para mim, caso a aceitasse. Ela era muito bonita e estava perfumada, só que tinha um problema, era muito folgada, deve ser isso que fez o cara se livrar dela, ouvi dizer que outro rapaz gostou dela e acabou levando.
Teve um amigo meu que me empurrou uma pequenina, era frágil e feia. Não aceitei. Ficaria todo encolhido entrando com ela na igreja.
Conheci uma moça muito simpática que me ajudaria, ou seja, queria quebrar o meu galho, mas nem tudo é tão bom como se pensa, ela me pediu um dinheirão, então desisti dela.
Já quase desistindo, encontrei um sujeito que havia se casado há uma semana, então pedi a dele emprestada. Ele quase me bateu, me disse que não emprestaria coisa nenhuma, que aquilo não era coisa que se pedia emprestado para ninguém.
Fui então numa casa de noivos e noivas, onde fui atendido por uma moça muito gentil que me explicou que ali eu não acharia o que precisava.
Pensei no meu sonho se realizando, me via entrando com ela na igreja grudada no meu braço e meus amigos, que se casaram com a primeira que apareceu pela frente, morreriam de inveja.
É por isso que venho através deste anúncio pedir para todos os rapazes casados ou solteiros que se casarão por esses dias, que queiram me ajudar, para que me arrumem uma. Casarei-me com ela só depois de vocês, não quero antes, posso até pagar um preço camarada, mas se me emprestarem agradeço. A cerimônia será simples, eu a pego, me caso e em seguida a devolvo, não passarei a lua de mel com ela. É claro que as noivas deverão aprovar o que estamos fazendo, não quero provocar nenhuma briga no dia do casamento de ninguém. Não vou fazer nada com ela, só me casar mesmo, o noivo pode até assistir ao casamento.
Os interessados podem me procurar na feira, é só perguntar pelo Miltinho, pois lá todo mundo me conhece. Vou agradecendo e já digo minhas preferências: ela precisa ser formosa, não precisa ter saído em revistas de moda, ter etiqueta e ser fina, muito menos ser estrangeira, basta que seja bonita, de tamanho médio e de cor branca ou pelo menos clara. Prometo tratá-la com muito carinho e cuidar bem dela.
Sem mais demora obrigado”.
Quando terminei de ler quase falo uns palavrões para o sujeito.
- O senhor pode me explicar o que é isto? - perguntei indignado.
- É o anúncio que quero publicar. - respondeu-me assustado.
- Eu sei que é um anúncio. E o senhor quer uma noiva emprestada?
- Noiva? Que noiva? Não quero nenhuma noiva emprestada.
- Mas é o que diz aqui no seu texto.
- Não. O que eu quero é uma camisa.
A conversa demorou uns quinze minutos e entre perguntas e explicações o infeliz mostrou o meu erro e percebeu o dele. Pelo que ele havia escrito dava a entender que pretendia uma mulher para se casar, mas na verdade desejava somente uma camisa emprestada ou alugada. Ele ficou tão ansioso para consegui-la que se esqueceu de citar em sua carta a palavra “camisa”, deixando-me confuso, pois tudo que escreveu dava a entender outra coisa.
Logo depois de tudo sanado, escrevi outro anúncio, que saiu publicado no jornal, e mais de dez pessoas se interessaram em ajudá-lo.
A nota saiu assim:
“Precisa-se de uma camisa para casar, deve ser na cor branca, mangas longas e de tamanho médio. Os interessados em emprestá-la ou alugá-la por um bom preço liguem para o jornal ou procure o Miltinho na Rua dos Fofoqueiros 1200”.
O anúncio só foi publicado um dia, o bastante para ele ganhar a camisa que tanto sonhava, entretanto não foi feliz, sua noiva fugiu com o vizinho. Hoje em dia ela está casada e tem três filhos. Enquanto o Miltinho ainda continua na feira, só que agora na condição de mendigo.