Última Resposta
Por tanto tempo eu tenho esperado.
E agora não tenho mais tanto tempo para esperar.
Por décadas e agora por quase um século eu procurei uma resposta para a única pergunta que me fez chorar. Velho, deitado e prestes a morrer, não restou muito de mim para essa resposta satisfazer.
Não me entenda mal, orgulho eu tive de sobra. De tudo aquilo que fiz, de tudo que comecei, de tudo que, por mais que eu quis, eu não terminei. A minha Vida fez jus a tudo aquilo em que eu acredito ou acreditava. Fui fiel a meus pensamentos, mesmo que eles não fossem sempre fiéis a mim.
Eu servi o mundo como um vassalo serve a seu mestre. Mas isso me fez bem, me fez sentir completo. E enquanto a pergunta não voltava, eu me fazia feliz.
Ela sempre voltava.
Como uma pessoa sádica que quer fazer de tudo para não acabar com sua própria diversão, que massacra, judia, humilha e enlouquece seu alvo. De minha própria mente eu fui escravo.
E de tempos em tempos eu mentia para mim, na esperança que eu pudesse esquecer que estava procurando a resposta e acabasse trombando com ela em algum canto escuro nos paradigmas da vida.
Eu vivi, eu sonhei, eu sorri, eu chorei. Aprendi coisas que ninguém mais que conheço sabe. Todos que souberam estão mortos, e agora só me resta esperar que o mesmo aconteça a mim.
Enquanto tão envolvido com essa emoção de viver, com a satisfação de fazer o bem ao mundo, mesmo muitas vezes sem o bem receber, eu ainda assim era adepto da ciência. A lógica e o raciocínio foram meus maiores mestres. Meus sentimentos se tornaram mais intensos, mais maleáveis, mais únicos e mais adoráveis. Eu aprendi a usar a lógica com a graça do sentimento, tornando meu espírito livre em algo mais puro e mágico.
Não digo, no entanto, que não sofri com isso. Por mais milagroso e incrível que seja, optar pela lógica é optar por um caminho tão doloroso quanto recompensador. Pois se acredita naquilo em que teorias podem explicar e, em tantos anos, nada pôde responder minha última pergunta.
Eu sabia qual seria o final disso. Sabia que, enquanto lembrasse da gloriosa vida que tive, a depressão iria bombardear-me com toda força que possui, como um preço que se paga pela felicidade que este caminho lhe trás previamente. Mas agora é como se nada realmente fizesse sentido.
Todos meus amigos, amores e familiares estão devidamente lacrados e cuidados num cemitério especial e dedicado a eles. Cada parte de seus corpos recebendo os devidos cuidados para que durem, quem sabe, por até um século. Não receberei, no entanto, tal tratamento.
Quem sabe isto seja o resto de honra que me resta. Não quero me sentir um covarde diante a morte.
Tentei inúmeras vezes me apegar a uma crença. Qualquer uma. Não saber o que se esperar depois de sua mente deixar de responder é algo horrível. Não saber o que realmente significa "SER" só acontece quando você tenta se perguntar o que é "NÃO SER".
Como "Não Ser"? Pois se pensa que é, já era. E se era, por que não é mais? Como pode não ser mais? E se não deixou de ser, como não pode se fazer presente? E se não for, de fato, de uma forma incrível, o que é o "Não Ser"?
Não há como pensar no "NADA". É assustador dizer que o NADA existe, pois ele é cheio de significado e, por ser assim, ele deixa de ser o que promete ser. Tentar pensar no nada é um ato que fracassa no exato momento em que se começa.
Mas não acreditar numa crença significa, no meu caso, acreditar na Morte. A Morte com seu sentido puro, magnífico, temível e sádico. A Morte como tornar algo existente em algo inexistente. A Morte como o Fim.
O ser humano é maldito por se sentir tão importante! É maldito por pensar e ter a consciência suficiente para formular lógicas e sentimentos sobre os instintos de sobreviver e fazer com que a espécie sobreviva. Tudo se transforma, não é? Mas se algo se transforma, ele deixa de ser o que era. Eu definitivamente não quero deixar de ser.
Feliz é aquele que consegue acreditar! Ah! Como é feliz! Como deve ser maravilhoso deitar em seu leito de morte e ter segurança ao se despedir da vida!
Eu gostaria muito que houvesse a pós vida! Mesmo que fosse para sofrer ou arder nas profundezas de um lugar horrível para onde vão as pessoas que não acreditavam em sua existência.
Porque... Afinal de contas... Eu quero poder dizer que existo.
E, se existe, não pode deixar de existir, pois existiu.
Não posso aceitar que o "NADA" seja a última resposta de minha última pergunta...
Ainda assim... Nada mais vem a mim...
Em breve não poderei dizer que existo, mas será esse o fim?
É ainda pior porque todos se foram! Todos os outros antes de mim. E quantos outros também não se foram assim? Quantos são lembrados? Quantos ainda existem, mesmo em memória?
Eu quero ser. Eu quero finalmente entender o que é "ser" para que possa finalmente entender o que é "deixar de ser".
É no momento em que menos temos tempo onde tudo parece ser eterno.
Saber que deixarei de existir...
Simplesmente...
Me faz questionar se um dia existi.
Eu acho que, quando descobrir, se descobrir, se é que vai sobrar algo de mim para descobrir... Essa é a única resposta que não poderei revelar para outro alguém. A última resposta não é serva de ninguém.