...Uma segunda chance...

Acordei com a sensação de que os meus passos não estavam sendo controlados por mim. Ignorei esse sentimento, me arrumei, tomei café e sai. Tranquei o portão e atravessei a rua sem olhar para os lados. E foi neste exato momento que algo inacreditável aconteceu. Eu fui colocada de volta para dentro de casa. Não sei explicar direito como isso se sucedeu. Num piscar de olhos eu estava do lado de fora, e no outro eu estava de volta à minha garagem. Confesso que fiquei um tanto assustada com este acontecimento, afinal, eu nunca tinha passado por algo semelhante. Com as mãos trêmulas, abri o portão novamente, sai para a rua e o fechei. Como um movimento involuntário, caminhei em direção ao outro lado da rua, porém, ao colocar o primeiro pé para fora da calçada, fui posta para dentro de casa outra vez. Entrei em desespero e fiquei me perguntando o que estava acontecendo. Sem obter nenhuma resposta convincente, eu respirei fundo e resolvi sair de novo. Abri o portão, sai e o fechei, mas, dessa vez, antes de atravessar, olhei para um lado, olhei para o outro e caminhei desconfiadamente. Para a minha surpresa e felicidade eu consegui chegar do outro lado. Sem entender o que estava acontecendo, continuei no meu percurso. Caminhei tranquilamente pela calçada até que cheguei num ponto onde eu não conseguia passar. Era como se uma força invisível não me deixasse prosseguir. Então, tentei fazer um desvio pela rua, entretanto, antes que eu colocasse o segundo pé para fora da calçada, eu fui lançada contra o portão. Apavorada com este fato, fiquei sem reação, andei de um lado e de outro tentando encontrar uma saída, mas, não existia alternativas. Foi quando percebi que o trecho onde eu precisava passar, era uma garagem, onde a entrada e a saída de veículos aconteciam constantemente, então, olhei para dentro e vi que nenhum carro iria sair, olhei para fora e vi que nenhum carro iria entrar, foi ai que atravessei. Atravessei com tamanha facilidade que fiquei confusa. Olhei para trás, para cima, para baixo e para os lados, na esperança de que tudo isso fosse alguma pegadinha, na esperança de que alguma câmera estivesse me filmando e eu estava participando de algum programa de comédia da televisão. Porém, não achei indicio algum de que tudo isso não passava de uma brincadeira. O que me restou foi prosseguir o meu trajeto. Com preguiça de andar até a passarela, pulei a grade de proteção e esperei o momento exato para sair correndo até o outro lado da pista. Quando a oportunidade chegou, dei o primeiro impulso para correr, mas, eu não conseguia mover minhas pernas. Juntei todas as minhas forças para tentar mexê-las, porém, elas não me obedeciam. Fiquei apavorada e meus olhos se encheram de lágrimas. Eu queria gritar por socorro, mas não havia ninguém por perto. Tentei me acalmar. Aguardei minhas pernas voltarem ao normal por si só, mas isso não aconteceu. Fiquei ali, paralisada da cintura para baixo durante um bom tempo. Até que tive a ideia tentar virar de costas e despular a grade. Fui virando lentamente. Primeiro a cabeça, depois o pescoço, em seguida os ombros, logo após o busto e por ultimo o quadril. Senti minhas pernas novamente e consegui me virar. Com medo de que as pernas travassem outra vez, pulei o mais rápido que pude e me sentei no chão. Depois de um tempo, levantei-me e fui para a passarela. Subi as escadas degrau por degrau. Por segurança atravessei a passarela segurando no corrimão e finalmente cheguei do outro lado. Olhei para o relógio e percebi que estava atrasada para chegar ao trabalho. Tentei correr para ganhar tempo, mas eu não consegui. Eu sentia minhas pernas se movendo, porém, eu não saia do lugar. Só me restava caminhar. O máximo que eu pude fazer foi dar uns passos mais apressados, até que cheguei num cruzamento com o farol vermelho. Não avistei nenhum carro se aproximando e resolvi atravessar. Logo no primeiro passo, eu fui lançada sentada na calçada. Levantei-me assustada e tentei atravessar correndo. Fui lançada outra vez. Levantei-me novamente, aguardei o farol ficar verde, esperei todos os carros pararem, olhei para a esquerda, para a direita, para frente e para trás e atravessei na faixa. Caminhei mais um pouco e cheguei ao meu destino. Cumpri com todos os meus deveres, e no final do dia, percebi que a sensação estranha de estar sendo controlada por alguém havia desaparecido. Senti-me livre e dona dos meus passos. Sai do trabalho, caminhei um pouco, cheguei ao cruzamento, ignorei o farol, olhei para um lado, olhei para o outro, não vi nenhum carro e sai correndo. Em segundos eu escutei uma freada, dei um grito e senti uma pancada. E neste momento eu acordei. Acordei trêmula, assustada, ofegante e com o coração disparado. Levantei-me da cama e apalpei meu corpo para certificar-me de nada havia me acontecido. “Ainda bem que foi apenas um sonho”, eu pensei aliviada. Arrumei-me, tomei o meu café e sai. Tranquei o portão, e antes de dar o primeiro passo para fora da calçada, eu olhei para um lado, olhei para o outro, vi que não havia carro nenhum e atravessei a rua.

Aline de Melo
Enviado por Aline de Melo em 18/08/2013
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