Um Homem Diferente

Um Homem Diferente

Já era solitário em menino. Às correrias, gritos e jogos preferia ficar a pensar em coisas fantásticas, a ver o pormenor dos objetos e dos bichos. Havia uma ordem oculta, com regras fixas, com certezas que se cumpriam, rigorosas. Descobri-las era um fascínio que lhe preenchia a vida. Cresceu como qualquer outro e conseguiu, sempre, boas notas razão pela qual ninguém o incomodava lá em casa. À margem da vida doméstica e dos seus problemas, Mariano pode filosofar, ver e analisar, de modo pessoal e distinto, até ao dia em a Betina, sua prima, entendeu escolhê-lo para os devaneios e pesquisas sexuais e engravidou. Em menos de nada o casaram, arranjaram-lhe o emprego, montaram a sua casa e colocaram-no a viver aquela existência estranha. Trabalhar, conviver com dificuldade, transcender-se para, em vão, agradar a todos, dos pais aos sogros, dos colegas ao filho. Quando o acidente o deixou de novo entregue a si mesmo organizou-se melhor para voltar a ser um homem só. Desta vez ficaria mais atento, mais precavido, mais capaz de dizer não a tudo o que não estivesse dentro da sua vontade e tornou-se ferozmente egoísta. Quando decidiu, por pena, alimentar um cão abandonado e, no dia seguinte, o viu deitado à soleira da porta, percebeu que o bicho era a exceção e, como tal, o tratou. Conversava, explicava, amava e iam, juntos, ao parque, às compras, ver outros bairros da cidade e o mar. Ficou feliz quando conseguiu trabalhar em casa por ver dilatados os tempos dedicados a Exceção, nome que atribuiu ao cachorro. Passou a conversar com os donos de outros cães sobre coisas irrelevantes e, uma noite, sem dar por isso, jantava e dormia com nova companhia. Ainda gosta de ficar, horas, a falar consigo mesmo e ela respeita essa necessidade. Ela também aceitou que o cão continuasse a dormir no tapete do quarto… Eram felizes.

Edgardo Xavier
Enviado por Edgardo Xavier em 14/08/2013
Código do texto: T4433493
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