Resposta à Altura do Atrevimento.

O prefeito Humberto Mota, eleito por grande margem de votos no primeiro sufrágio municipal após o Estado Novo em 1948, estava saindo de sua farmácia no Centro e resolveu dar uma passada no Bar do Comércio, de propriedade do senhor João Bessa. Desde que assumira a prefeitura de Maranguape, trabalhava duro para governar com os minguados recursos do erário municipal. Logo no primeiro dia de gestão, teve de tirar do próprio bolso para pagar aos garis. Os pobres se reuniram e foram falar com o prefeito sobre a situação deles, estavam devendo no comércio e sem recursos para manterem suas famílias. Condoído, Humberto Mota mandou buscar na Drogaria Ceará, de sua propriedade, o dinheiro: três mil cruzeiros. Assim pode saldar a dívida da prefeitura, através de um empréstimo. Antes de fazê-lo, abriu o cofre e viu que não tinha nada dentro; desolado, balançou a cabeça e tomou uma providência.

Entrara para a política antes por influência dos amigos e fregueses da farmácia do que propriamente por vocação, porém agora que fora eleito queria mostrar serviço. Tinha ideias e queria pô-las em prática. Naquele sábado, pensando em como iria realizar a promessa de campanha de pôr luz em Maranguape e nos problemas acumulados da semana, saiu da Drogaria Ceará com o intuito de tomar um gole de café acender um cigarro.

Ao chegar foi atendido pelo proprietário cordialmente e logo foi despachado. No balcão Humberto Mota saboreava o café aos poucos para não queimar a língua, uma vez que o liquido descia quente e um pouco amargo, conforme seu gosto. Já estava terminando quando ouviu alguém se dirigir a ele.

- Não é, seu prefeito? – perguntou uma voz que vinha do interior do recinto.

- É! – respondeu Humberto Mota sem atinar muito bem o que fosse.

Imediatamente, num tom de ameaça a voz retrucou.

- Pois é, porque se não confirmar, toma mão na cara!

Foi demais, Humberto Mota ficou vermelho de raiva e muito indignado com o que acabara de escutar. Olhou para o interior do bar, de onde partira a voz e reconhecera Pedro Mavignier, rábula conhecido na cidade, acompanhado por João Brígido, morador do bairro da Outra Banda e valentão conhecido por todo canto da cidade, de quem partira a ameaça ao prefeito. Sem perder seu moral, Humberto Mota se dirigiu à mesa e falou sem alterar a voz.

- Se você vai dar na minha cara, estou aqui! – disse calmamente e continuou. Vamos! Eu não sou homem de falar alguma coisa e não fazer, mesmo que eu me dê mal... Se você se acha capaz, venha dar na minha cara! – e deixou à mostra o revólver calibre 38, cano duplo, comprado já com o intuito de se defender de sujeitos abusados como aquele, através do palitó escuro de um único botão, muito em moda entre os cavalheiros elegantes e bem vestidos da época.

O agressor ficou sem ação e Humberto Mota, percebendo que se tratava de um sujeito sem préstimos, simplesmente descarregou toda a sua indignação, apelando até mesmo para palavrões e gestos obscenos (o que não era de seu feitio); bastante alterado, deixou o João Brígido mais rente que o chão e este ficou simplesmente olhando sem reação, todo acuado.

O prefeito saiu do bar, aliviado, e foi para a farmácia trabalhar. À noite, depois de fechar seu estabelecimento, João Bessa apareceu dizendo a Humberto Mota que estava vendo a hora acontecer um crime de morte no bar dele e que o prefeito podia se prejudicar.

- Aquele sujeito é um covarde! Ele só dá na cara de um bêbado igual a ele. Em cara de homem ele não dá, não! – e fechou a porta de ferro da farmácia para ir embora para casa.

Moysés Severo
Enviado por Moysés Severo em 12/08/2013
Código do texto: T4430627
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