O Recado

Depois da lida pesada do dia ainda tinha tarefas inadiáveis todas ditadas pelo dever, pela saudade, pelo amor ou por generosidade. Sim Mariema, antes de poder fechar os olhos para dormir, ainda tinha três Ave Maria por cada defunto da família, um Pai Nosso pelo Filho e pelo Marido, duas Salvé Raínha pelos tios e vários Credo para, em nome dos ateus com quem fazia a vida, os libertar de sanções divinas. Muitas vezes adormecia a meio das rezas e, outras, perdia o sono e ficava, a seguir, a noite inteira a tentar solucionar problemas. Depois, estafada, chegava do trabalho, ajeitava o jantar, cuidava da roupa e arrumava a casa para repetir o ciclo a que convencionava chamar vida mas segura de que viver era algo bem diferente. Um dia, porém, de tão cansada, mal se deitou, adormeceu. Foi então que, desamparada, se sentiu ao colo de alguém e escutou uma voz meiga que lhe garantia: “ Mariema, já trabalhas tanto, já amas tanto, já sofres o suficiente e, por isso, mereces este segredo. Os mortos já chegaram e ninguém precisa de os entregar aos cuidados do Pai. Os vivos terão de fazer a sua parte mas, é claro, podes pedir-me pelos mais especiais. O resto, minha querida, transforma em oração. Diz-me só que Me amas, que confias em Mim ou, se estiveres com muito sono, envia-Me só um beijo e adormece sem culpas. Quero-te sempre feliz”. Mariema seguiu o conselho certa de que o Senhor, através dos sonhos, dá os seus melhores recados.

Edgardo Xavier
Enviado por Edgardo Xavier em 17/07/2013
Reeditado em 18/07/2013
Código do texto: T4390898
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