A tocaia

Já era de tardinha, quando não é mais dia, nem chegou a noite,e, o lusco-fusco provoca uma tristeza que vai invadindo a alma.Hora bonita da Ave-Maria, com os inos tocando, chamando para a missa, alvoroçando as beatas e os fieis.Sentado no último banco da igrejinha, meio escondido pelas sombras, estava Dario.Ele pensava na vida e na morte.Seus olhos avermelhados pelo choro contido, miravam tudo a sua volta, ansioso, querendo guardar na retina, cada detalhe do lugar.Ali, ele foras batizado e fizera a sua primeira comunhão, junto aos coleguinhas do grupo.Ele, como os outros jovens do lugar, gostava de, nas missas de domingo, paquerar as meninas, agora porem, nervoso, contava e recontava as imagens dos santos, os anjinhos gorduchos pintados no teto, as arandelas de vidro fosco, e, até os vasos manchados de azinhavre no altar.Aquele era um lugar cheio de lembranças boas, pena que, contrastando com a paz do local, havia a sua gente, vingativa e rancorosa.Ele tão diferente de todos fora o escolhido para cumprir um ato que abominava.

Na sua casa, no calendário preso atrás da porta da sala, estava marcado , com tinta vermelha, aquele dia, e a ele só restava cumprir uma triste missão.Logo ele, que era pacífico, detestava a violência, uma alma pura.Certo que ele atirava muito bem, mão firme e certeira, mas nunca matara nem um passarinho, só quebrava garrafas ou furava

latas vazias,agora já era tarde e ele não sabia como escapar

da sua triste missão.Teria que cumprir a ordem dos seus e depois, sumir por uns tempos.Olhando o relógio de pulso viu que já era hora de seguir o seu caminho.Rogando um perdão antecipado, fez o sinal -da-cruz e juntou os seus poucos pertences.Quando saiu da igreja pegou logo o rumo para fora do povoado, não haveriam despedidas, abraços ou votos de boa sorte.Ele dispensara tudo, sofria, não deram a menor importância a sua dor,vingança era a meta e o ódio morava no coração do seu povo.No dele não!.sentia-se magoado pela sua fraqueza e não ter podido escapar daquela missão, imposta com autoridade em reunião da família.

Maldita hora em que o seu irmão fora se meter com mulher dos outros, mas ele era mesmo um irresponsável , e a tal criatura era a amásia do homem mais rico e poderoso do lugar.Por causa disso, ele, Dario, de alma branda ,iria se tornar um matador.Seguia ele pela noite para vingar a morte do irmão, furado que fora,como um porco, em véspera de festa. Já fora do povoado ele seguiu por uma picada que atravessava a mata, contornando a estrada de terra que levava a fazenda do homem poderoso, que, mais cedo ou mais tarde iria passar por ali.O tal homem não sofreu pena nenhuma, continuava livre como uma ave, batendo as asas da sua arrogância dourada.

Enquanto caminhava Dario podia ouvir o murmúrio das águas correndo por entre as pedras cobertas de musgo, do riacho da sua infância, onde passara bons momentos com os seus amigos.Agora, tudo que lhe fora caro na sua vida jovem, seria passado, e, ele não sabia o que podia esperar do seu futuro.Quando chegou no lugar , previamente escolhido, tirou do saco de brim, sua velha espingarda, da mochila, a munição, com tudo preparado , sentou-se atrás de um arbusto para esperar .A noite não era das mais escuras e ele sabia muito bem o que fazer.Tudo fora planejado pela família.Ali pertinho, uma coruja começou a piar, e o jovem sentiu um arr epio passar pela sua espinha.Lembrou-se das histórias que contavam ,sobre os seres estranhos que vagavam à noite pelas matas, cumprindo suas sinas, e ele teve medo.

O piar tétrico da coruja fez com que ele encarasse todo o horror do ato que iria praticar, dar fim a vida de um homem, um ordinário, mas um ser vivente.Não seria um crime por dinheiro, ou por ódio da parte dele, mas por obediência e covardia.Um pau mandado!Não adiantava querer argumentar que, a mulher continuava bem viva, perdoada que fora pelo amante, perdido de paixão, e que, o seu mano, tão moço, dormia embaixo de sete palmos de terra, mas ele não queria matar, só viver a sua vida.As horas foram passado lentas e a noite ficou mais fria.Os olhos de Dario começaram a pesar e a sua cabeça , várias vezes, pendeu para o lado, suas mãos , segurando firme a espingarda, ficaram geladas e dormentes.

O homem não vinha, mas uma hora ele teria que passar por ali.A espera foi dando tempo de Dario pensar que vingança, só gera vingança

e aquilo podia se tornar em uma matança sem fim.Por que ele, tão pacifico, fora o incumbido de matar?Ele só desejava paz e não era justo ter que sacrificar sua vida, seus ideais e mesmo o seu futuro .Não matar era o certo e aceitar ordens daquele tipo era errado.Não matar não seria covardia, ele tinha direito de escolher o seu destino.Seu irmão jamais quis ouvir ou atender conselhos, agiu como queria e se deu mal,pois era um leviano.Houve morte e dor, mas a vitima verdadeira seria ele, Dario, que iria sujar suas mãos com o sangue de um cabra safado, que lavara sua honra de corno de uma vadia, com amorte do seu mano, cabeça dura.

Ainda havia tempo de mudar a sua sina, por que não?Com as mãos trêmulas de emoção e alivio, ensacou novamente a espingarda, pegou a mochila úmida de sereno, esticou as pernas duras pela prolongada espera e tomou , novamente, a picada por onde viera, só que, não seguiu rumo ao povoado, estava deixando para trás uma parte importante da sua vida, mas, sentia-se como um novo homem, livre e feliz!

lucia verdussen
Enviado por lucia verdussen em 22/06/2013
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