Os pecados que não confessamos
Maria nunca foi uma mulher extremamente religiosa, sempre frequentou as missas aos domingos, mas nunca passou disso. Porém, certo dia, quando estava em sua casa, refletindo sobre a vida, decidiu que estava na hora de se confessar. Resolveu ir até a igreja que ficava a alguns metros de sua casa, lá encontraria o padre Inácio, homem de muita fé e que celebrara seu casamento e o batismo de seus filhos. Chegou à igreja bem sorrateiramente, com olhos baixos e observadores. Parecia está com vergonha da sua resolução. Na verdade, o que Maria estava sentindo, era mais uma angustia, por não saber exatamente por onde começar a sua confissão. Tinha tantos pecados, mas tantos, que deveria tê-los anotado para não se esquecer. Caminhou alguns passos até o altar, onde o padre se encontrava rezando, devoto e concentrado. Limpou levemente a garganta, buscando chamar sua atenção. O homem virou-se e sorriu ao vê-la.
-O que a traz a casa de Deus, minha filha?-Perguntou o homem enquanto se levantava.
-Vim me confessar, Senhor Padre- Respondeu ela.
-Que bom! Vamos até o confessionário, lá falaremos melhor!
Os dois caminharam até um canto da igreja onde eram recolhidas as confissões. O padre vestiu sua batina e Maria ajoelhou-se, fazendo o sinal da cruz.
-Então, minha filha, que pecados cometestes?
-Bom senhor padre, na verdade, eu não sei!-Maria olhou para o chão, buscando, talvez, nas pedras marmóreas da igreja, uma resposta para suas angustias.
-Não compreendo! Como não sabe?-O padre Inácio franziu o cenho.
-Não sei, se eu fosse levar em consideração tudo o que dizem ser pecado, eu teria que passar dias diante do senhor!
-Filha, o que você entende por pecado?-Perguntou o senhor.
-Algo que foge as regras estabelecidas por Deus!
-Assim é. Isso é pecado! Por tanto, o que dizem ser pecado, ou melhor, o que o homem diz ser pecado, nem sempre o é!
-O senhor entendeu! É isso que me atormenta, nunca sei se estou pecando ou não!
-Diga um exemplo, filha!
-Bom senhor padre, tenho vergonha de lhe falar sobre essas coisas. -Maria baixou os olhos, de repende o chão da igreja lhe pareceu acusador, pois refletia seu rosto avermelhado de vergonha.
-Não tenha receios, o que disseres aqui, aqui ficará.
-Bom, como o senhor sabe, eu sou casada, tenho dois filhos!
-Sei bem, fui eu quem celebrou seu matrimônio e quem batizou seus filhos
-Bom, eu poderia ter mais filhos, bem o senhor sabe... Mas....
-Mas você não quis por isso os evitou certo?
-Como sabe?-Maria arregalou os olhos diante da perspicácia do velho padre
-Ora, minha filha, você não é a primeira a vim a mim com essas perguntas!- O velho sorriu. -Vou te esclarecer.-O velho padre se ajeitou em sua cadeira de madeira e aguçou os ouvidos.-Deus nos disse em seu evangelho: “Crescei e Multiplicai” , ele disse isso a Adão e Eva, lá no Éden.
-Sei disso!
-Pois bem, assim eles o fizeram, tiveram filhos e povoaram a terra. -O padre estava observando a reação de Maria.-Os tempos foram se passando e o homem continuou a povoar a terra e assim o faz até hoje. Porém, os tempos modernos, não permitem mais que um casal tenha uma quantidade absurda de filhos, o que implica dizer, que o homem criou métodos eficazes para evitá-los.
-Sim, métodos esses, que a Igreja condena veementemente.
-Sim, mas entenda minha filha. A igreja condena a quebra do mandamento de Cristo, o “Crescei e Multiplicai”, mas imagine você, se todos os casais do planeta, imbuídos por um desejo avassalador de cumprir esse mandamento, resolvesse gerar um filho a cada ano!? Aonde iríamos parar?
-Sei disso Padre, mas se a igreja condena, é porque é pecado, certo?
-Não necessariamente, afinal, os tempos mudaram! Como eu disse, não se pode mais colocar dez ou vinte filhos no mundo, é necessário mais do que pão e amor para manter essas crianças! O que a Igreja condena, como já te expliquei, é a quebra do mandamento, por exemplo, casais que optam por não ter filhos...
-Estão quebrando o mandamento?
-Sim, se eles podem gerar filhos e não o fazem, é porque estão indo de encontro à ordenança de Deus, por tanto, cometem pecado!
-Então, pelo que entendi, aqueles que já geraram filhos, mas usam métodos para prevenir a chegada de outros, por não ter condições de sustentar adequadamente essa nova vida, não estão pecando! Mas aqueles, que podendo gerar, não o fazem.Pecam!
-Exatamente isso!Espero que tenha compreendido!
-Sim, compreendi...-Maria fez o sinal da cruz.-Qual a minha penitência?
-Nenhuma, afinal, você não pecou!-Padre Inácio sorriu-Vá com Deus, minha filha! E lembre-se, sempre que tiver uma dúvida, me procure, terei todo o prazer de tirá-la!
-Obrigada, senhor Padre!
Maria saiu da igreja completamente aliviada. Sentia-se mais leve, pois agora sabia que não estava pecando. Saiu da igreja, mas quando pôs os pés fora dela, lembrou-se de perguntar mais uma coisa...Mas isso é conversa para outra história!
Carolina Antunes da Silva.