Ao meu querido Tio Nelson Resende Fonseca
Contos da vida
A meu querido Tio Nelson
O tio Nelson era homem respeitado na Cidade de Três Corações, lembro dele como ex-Prefeito da Cidade e além disso, Presidente do tradicional Clube Três Corações, que fica na Praça Central da Cidade.
O local onde eu frequentava na infância, os famosos bailes de máscaras, em outros carnavais...
Mas o que impressionava é que ele era fazendeiro, como meu avó, mas plantava café a perder de vista, e na entrada da Cidade, indo da cansativa viagem do Rio de Janeiro para Minas Gerais, depois da Serra “enjoativa” da Mantiqueira, lá de longe, já se avistava o café, e o único aeroporto da Cidade. Mas a pista pouco frequentada, parecia de barro vermelho, porém, era famosa pelos seus ilustres visitantes.
Até meus pais já tinham pousado ali com um avião “Teco-teco”, desses de antigamente.
Mas agora a pista parecia para os voos de pássaros ou passagem de gado leiteiro e guardada ao esquecimento.
O conto que agora ofereço a vocês, passou justo nessa fazenda, que após a morte do “Coronel” Nelson Resende Fonseca, fomos convidados para um almoço familiar na fazenda, e encontrar por ali os primos e tios.
O almoço na fazenda é sempre bom motivo de festa, fartura e alegria.
Mas tudo por ali estava diferente...Parecia um local dos mais calados que ouvia.
Já sabíamos que o retorno à fazenda, após a sua morte, seria de menos festejar e muita conversa.
Uma laranja retirada do pé, já me serviria de alegria, como boa cidadã urbana.
Mas como sempre exploradora, sai em busca de viver mais uma vez o olhar ao carro de bois, coisa que desde menina, era a boa lembrança que sempre me divertia.
Como deixar de adorar aquele objeto de transporte dos mais inusitados?
Os bois na frente, a meninada atrás, sentada junto com os milhos, palhas, e o ranger das rodas de madeiras? Adoro andar em carros de bois!
Mas o Seu Tião, velho empregado da fazenda, e amigo inseparável de meu Tio Nelson, “que Deus o tenha”, contou-me uma história então surpreendente.
Não poderíamos deixar de falar da perda, todos sentíamos o luto pairado no ar...
Contou-me o Sr. Tião, que no dia da morte de Tio Nelson, os animais da fazenda não paravam de berrar. Começou bem cedo com o boi zebu, touro valente, esse era o preferido do Tio porque era premiado e muito provedor de novos rebanhos.
Este touro, urrou o dia inteiro até o sol se por.
E como se não bastasse, junto com ele, a vacas mugiam, o galo cantava, as galinhas cacarejavam, a d'angola fraquejava, o ganso grasnava, os porcos faziam grunhidos, os pássaros piavam, o gato miava, o cachorro latia, e dizem que até que as rãs coaxavam sem parar.
E no fim do dia, um silêncio de cantoria animal pairava no ar. Na estranheza noturna, apareceu por ali, uma raposa do campo que veio juntar-se à lua cheia e fez da noite enluarada o seu maior uivar.
E aconteceu ainda das estrelas piscarem o seu mais forte brilho, e já o recebiam como um bom amigo e orquestrador celestial.
Por que à sua passagem da terra, não foi em vão. Tudo isso, era em homenagem ao Tio Nelson dizia Sr. Tião.
Quando me despedi, fiquei com a sensação da plenitude do dia.
Afinal, concordei que os animais sentem, pressentem e há quem discorde?
Que conte então, outro conto.
Rio de Janeiro, 04 de maio, de 2013. Gisele Sant' Ana Lemos