ENTARDECER NA SERRA
ENTARDECER NA SERRA
Cai a tarde. Silêncio no alto da montanha. É possível ouvir o zumbido de um besouro que passa próximo a meu rosto. Os pássaros em revoadas chilreiam, trinam, cantam seus cantos da pauta infinita, relembrando suas origens no Grande Jardim. As nuvens passam baixas, envolvendo todas as coisas, brancas, vaporosas, esgarçadas. O contraste dos grandes ciprestes de um verde carregado - de esmeraldas que refletem toda a natureza em volta de si – recebem farrapos de nuvens, ora os mais distantes parecem que são envolvidos em tufos de algodão.
Por todo lado, lá no alto, pedras e rochas esparsas, capim deitando-se ao vento frio das montanhas. Em meio às frestas das rochas – como se quisessem ver o céu, respirar o ar puro, espichar seu tronco e galhos, sobressaiam pinheiros -, os quais, submissos às intempéries do sol mais forte nas alturas, ventos mais pesados e velozes, tempestades, raios e outros fenômenos, cresciam tortuosos; revirados seus troncos, expondo sua madeira nua de uma cor cinzento-prateada. Mas eram lindos, em sua força de crescer, viver e multiplicar sua espécie, em uma forma de se perpetuar, e conseguiam, pois tais espécies desta mesma forma atravessam os séculos. A vontade era de apanhá-los da forma que se encontravam e transportá-los para nosso jardim. Ou num vaso só nosso!
A tarde já se acentuava durante essas breves divagações. O Sol vai antecipando a noite lá embaixo sobre o casario esparso, escondendo-se por detrás das serras de oeste. As montanhas mais altas como essa de Cerro Miranda, lançam suas sombras, permitindo ao Sol deixar ao longe, bem longe, alguns clarões de seus raios, em uma ou em outra montanha. Neste momento se ouve todos os sinos: mais graves das igrejas maiores, mais agudos das distantes capelas, embalando o nascer da noite que já se anuncia.
O entardecer nas montanhas...
Enternece o espírito e ao mesmo tempo nostalgia o coração. O que nos causa isto? A explicação é difusa, mas consola. - É como algo que se perde, no entanto nos ilumina e aquece. Um bem querido que perece. Uma esperança que renasce.
Ao perceberem o lusco-fusco do fim do dia, os pássaros com sua revoada barulhenta é de contagiante alegria.
Lá distante no horizonte, para quem olha os lados de oeste começa a ver no céu a imensa palheta de cores, do vermelho ao laranja, passando pelo amarelo ouro depois esmaecido. Depois o cinza-azulado, o violeta e montanhas e ilhotas, numa imensa baia. Em seguida no horizonte longínquo de um vasto oceano, vem o lilás e ao fim um intenso azul cerúleo.
A brisa se acentua mais fria, e, bem ao fundo do vale que se prepara para o descanso e ao sono, começam a brilhar luzinhas como fossem pirilampos, com o delicioso odor de mil sopas nos fogões.
Mas reparem no cair da noite, longe das luzes dos postes e clarões dos grandes aglomerados humanos! O céu é um manto azul-marinho profundo cravejado de brilhantes, com uma pérola enorme e reluzente a guiar o viajor na escuridão.
Transposição divina, que todo dia se renova e que não produz maravilha para quem só vive a olhar o chão.