Pelos de pêssegos

Tudo corria bem na colina de Andradas, arredores de Cruz Alta, Chile, tempo bom, dia ensolarado e gostoso de se sentir, sentei perto de um Ilex paraguariensis, para descansar, tinha trabalhado na plantação de frutas.

Flana chegou perto de mim sem eu perceber e tascou-me um beijo, senti um calor daqueles de assustar, pensei estar sentindo um AVC, abracei a também, com as mãos bem fortes, mas sempre olhando para a colina, desconfiado.

Flana perguntou-me:

-Ramiro você gosta de mim?

Respondi com a voz embargada:

-Claro minha querida Flana, mas as vezes fico pensando, esse nosso amor as escondidas, é certo?

-Claro que é meu amor, deixa que logo, logo vou contar para o Aramis, ele tem que entender!

Assim nos beijamos e nos despedimos, ela sumiu na mata de Ilex, e eu tratei de voltar ao batente, o coração estava a mil, as pernas tremulas cambaleavam, ziguezagueavam.

Cheguei na plantação, minha tia Bina, parte de pai, me perguntou:

-Ramiro... por onde andavas... estás bem?

Respondi:

-Sim tia estava na sombra de uma árvore pensando a vida.

-Você sabe da responsabilidade que a Natônia deixou pra mim, desde que foi morar em Bela Vista, você ainda estava pequeno, não sabe?

-Sim tia e agradeço pela agrado que a senhora sempre dedicou a minha pessoa, junto com o tio Patrício, sou grato por isso, os considero meus pais.

-Flana estava por lá?

Não sabia o que responder pois ela me olha nos olhos:

-Tia vou terminar de fazer as podas do pessegueiro, beijo.

Ela me olhou com desconfiança e baixou o rosto, parecia chorar.

Retirei me e fiquei um pouco apreensivo.

Horas mais tarde chegou Ramom, em seu cavalo, todo pomposo, era o dono da plantação e de vastas terras e vinhedos, e pai de Aramis.

-Como vai as coisas compadre Patrício, os pessegueiros estão bonitos hein?

-Sim compadre Ramom, eu a Bina e o Ramiro, não deixamos as responsabilidades ultrapassarem os compromissos feitos pelo senhor aos Hortifrutigranjeiros, vamos colher bem mais do que no ano passado.

-Retirou-se da plantação e encontrou com Flana, que estava chegando, assim que se encontraram ele perguntou:

-Flana e ai seu casamento com o Aramis, tudo preparado?

Flana com o olhar distante e triste:

-Sim senhor Ramom estou bordando as toalhas e os lençóis, pois tenho tempo só á noite.

Nesse momento Aramis chegou e abraçou Flana por trás, meus olhos tentaram não ver, mas a vontade era de ver. Senti meu coração flamejante, parecia que ela gostava de me fazer ciume, me olhava de um jeito estranho.

Chegou seis da tarde todos foram para suas casas, eu não conseguia tirar aquela visão de minha mente, peguei uns pêssegos e parti para a colina, na mesma árvore deitei-me, pensativo, escutei uns estranhos pisados, levantei-me e fiquei de prontidão.

Eis que do meio da mata surge uma figura, corpo esguio, feminina, firmei as vistas, era Flana.

Perguntei:

-O que fazes aqui?

Flana respondeu:

-Vim te ver de novo, estou morrendo de saudades!

-Você não?

-Olha Flana, minha tia está desconfiada, já não sei mas o que responder!

Com o rosto cheio de dúvidas me indaga:

-E você tem coragem de contar?

-Não sei Flana, pois não tenho herança e sou apenas agregado da fazenda.

-Você não, é filha do Gonçalo compadre do Ramiro, e seu casamento é quase que uma promessa não é?

Flana ficou pensativa e baixou a cabeça, parecia que não lembrava dessa promessa.

Disse-me:

-Você não vai arranjar outro amor vai?

Não sabia o que responder:

-Olha acho que é melhor a gente não se encontrar.

Flana saiu desesperada descendo a colina, quase tropeçando nas próprias pernas.

Pensei em ir atrás, mas o sentimento de não estar atrapalhando o casamento dela foi mais forte.

Cheguei na casa dos meus tios e deitei, na manhã seguinte chegou uns visitantes ao vinhedo do senhor Ramiro, tinha uma bela moça, cabelos loiros, boca carnuda, rosto arredondado, um rubor nas bochechas, parecia um pêssego maduro, pelos dourados, bem granado, chamava-se Querubina.

Minha tia pediu para eu mostrar a plantação, seguimos parreiral adentro, minha alma parecia ter visto um anjo, não conseguia tirar os olhos daquela bela moça.

Nos conhecemos e começamos a namorar, ela visitava o sitio a cada quinzena, íamos para o parreiral, colhíamos cachos de uvas e nos deliciamos, a boca ficava vermelha com a tinta das uvas, ela ficava mais bonita ainda, e seguíamos naquele efervescente romance.

Um dia quando ela me visitou, Flana estava com Aramis no vinhedo, peguei na mão de Querubina para que as duas não se encontrassem, pois temia a reação de Flana.

Seguimos para a plantação de pêssego que estava todo florido, peguei algumas flores e coloquei no cabelo de Querubina, nesse instante Flana estava na plantação de pêssegos e viu aquela cena, saiu correndo, chorando, chorando.

Aramis montou em seu cavalo e foi a sua procura chegando lá no alto da colina Flana estava caída, desmaiada, Aramis não sabia o que fazer, pegou ela nos braços e desceu a galope em seu cavalo, a velocidade era tanto que o cavalo tropeçou, e caiu em cima de Aramis e Flana esmagando seus ossos, corri para ajuda-los, mas o fim foi trágico, ouve uma comoção geral na região de Cruz Alta.

Assim depois de pouco tempo casei-me com Querubina, tivemos duas filhas, Clarita e Sandara, ambas lindas, uma família tão bonita e perfeita. Só eu não estava, parecia que estava faltando alguma coisa, a cabeça me condenava.

O que ninguém sabia é que todos os dias, subia a colina e me encontrava com Flana.

Meus pensamentos percorria aquela árvore de Ilex paraguariensis, como se ela fosse as folhas e flores e eu os galhos e as raízes.......

Vander P

Vander P
Enviado por Vander P em 14/04/2013
Reeditado em 07/11/2024
Código do texto: T4240451
Classificação de conteúdo: seguro
Copyright © 2013. Todos os direitos reservados.
Você não pode copiar, exibir, distribuir, executar, criar obras derivadas nem fazer uso comercial desta obra sem a devida permissão do autor.