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O pai descobriu que a filha se casaria com Robert Bessone às 17:00h na Basílica de Santa Teresinha. Faltavam quarenta minutos para as cinco da tarde, quando Jeremias Palmeira pegou o carro no Aterro do Flamengo e se dirigiu em alta velocidade para a Tijuca. Entrou em contramão, cortou sinal e foi multado diversas vezes pela vigilância eletrônica. Não se importava, precisava chegar a tempo de impedir o casamento da filha. Chegar antes que Talita jogasse o buquê para trás. O velho Palmeira rezava para que a noiva se atrasasse.
Ela atrasou.
Os convidados esticaram o pescoço na direção da porta de entrada. Enfim, toca a valsa nupcial. Talita caminha lentamente, levada pelo braço de Cristiano. Uma ponta de ciúme fez Morgana lembrar-se do dia em que se casou. O noivo estava bêbado, Cristiano estava bêbado demais no dia em que se casou com ela, Morgana. Agora, para Cristiano, tudo parecia um sonho, uma felicidade clandestina que duraria até o momento de entregar Talita a Robert...
As fantasias de jovem soavam forte em sua mente, trazendo imagens de um passado não muito distante quando ele entrou na loja de informática da Rio Branco, procurando por uma lan house. A boca bem contornada pelo batom vermelho da atendente escondia a face da verdadeira dona da loja. A dona daquele bocão era também dona da loja Suport Informatic.
De longe, Morgana aguçava o sexto sentido para decifrar os pensamentos do marido que, agora conduzia Talita sobre o tapete vermelho da Basílica, andando a passos lentos como quem caminha sem querer chegar. O ministério de música para. Desolado, Cristiano entrega Talita a Robert, como Abraão entregou Sara ao faraó e sozinho volta. Sentou-se ao lado de Morgana e ela o desprezou. Não lhe sorriu, desejou matá-lo. Frei Gaspar saúda os noivos. A assembleia muito reduzida fica de pé, faz o sinal da cruz e reza o Ato Penitencial. Cumpriu-se o ritual de fé até o momento do “SIM” e então, pergunta o celebrante:
— Robert Bessone, é de livre e espontânea vontade que aceita Talita Cumi, como sua legítima esposa?...
— Sim!
Voltando-se para a noiva, repete o questionamento.
O silêncio do “sim” que não veio misturou-se com o barulho vindo da porta principal da igreja como se alguém pulasse cordas. Lá, um homem gesticulava, pulava e sacudia desesperadamente os braços. Frei Gaspar não acredita no que vê. Pensa nos proclamas que autorizou reduzir o prazo de divulgação... Jeremias continuava pulando sobre brasas, subia e descia balançando as partes vergonhosas, mal guardadas. Estava com uma camisa listrada, provavelmente, de um pijama, e na parte de baixo, uma ceroula de braguilha aberta, sem botão ou zíper. Estarrecido o frei conjecturava: “As mulheres seguram os seios quando pulam, já os homens não se preocupam com seus penduricalhos. Será por que Jeremias veio com aquele traje ao casamento da filha?” Alguém lhe passou as alianças e uma luz brilhou como lampejo: “Se alguém souber de algum IMPEDIMENTO, fale agora, ou se cale para sempre!” Um grito pula no ar como foguete itabirano: “Eles são irmãos! Eles são irmãos...”
Os convidados olharam para trás e viram um homem com roupas de dormir, ainda em pé, mas despencou em fração de segundos. Exausto como o soldado de Maratona, Jeremias Palmeira tombou. Bateu a cabeça no chão, produzindo um som fofo e indescritível que ecoou em toda nave da igreja. O sangue escorreu no mosaico. Robert empalideceu. Acabara de achar o pai e perder a noiva.Então, teve uma idéia, um gesto de carinho que não pudera receber nem dar antes. Retirou o lenço que enfeitava o fraque, enxugou suavemente o sangue que escorria da sobrancelha de Jeremias e guardou o lenço. Entre uma lágrima solta e um sorriso abafado, pensou: “Hoje perdi minha mulher e meu pai, ou não! As duas coisas juntas ou nenhuma delas”.