O Bar
Ele estava debruçado sobre o balcão, com as pálpebras levemente caídas e os sonhos um pouco afastados. Pelos espessos nos braços; unhas bastante curtas; cabelos ralos. Ficou a acariciar a sobrancelha enquanto olhava pela vidraça, acompanhando o balançar de uma folha seca num galho de árvore. O vento soprou mais forte, ela relutou por alguns segundos e, em seguida, caiu devagar sobre a grama seca.
O bar tinha cheiro de madeira antiga. A luz neon do letreiro mal funcionava agora, tampouco a máquina de café. As cadeiras e mesas - gastas - cheias de pó, e as toalhas todas com pequenas manchas amareladas do tempo. Era uma manhã de fim de outono, em um bairro afastado perto da rodovia intermunicipal.
Passou o pano nas louças e permaneceu pensando. Coçou a cabeça e finalmente sentou-se. Quantas não foram as brigas que ali havia presenciado? E o que dizer das histórias? E dos homens que ali viraram noites e noites a blasfemar dos problemas, das mulheres, dos amores, da vida? Ali, por aquela mobília obsoleta tocada pelo sol matutino, passaram diversas pessoas, com diversos copos de cerveja, lágrimas, sorrisos e mãos calejadas. Bilhetes, guardanapos, mal entendidos…Homens e mulheres. Alguns tímidos, outros obscenos, outros abertos. Fechados, tristes e felizes.
E o que restavam ali agora, senão lembranças e o pobre velho a sentar-se só no balcão? Vez ou outra apareciam alguns beberrões a empurrarem a porta e pedirem doses, mas só de passagem. O que pairava no ar daquele bar agora era a memória de noites, e tardes, e manhãs. Era o relógio gasto na parede; eram óculos esquecidos debaixo das mesas; eram vidros rachados e opacos. Era a sorumbática companhia de cupins que roíam o forro.
Uma senhora humilde passou pela porta e parou na frente do velho.
- Só uma xícara de café.
- Canela?
- Não, obrigada.
Virou-se e despejou o grão moído. Uma pequena gota lhe escorreu dos olhos. Era sim uma manhã de fim de outono, mas não como há anos atrás. O relógio girou os ponteiros vezes o bastante para provar-lhe que as rugas já se deitavam no rosto. Mas o café tinha de ser servido, e a cerveja tinha de ser posta no balcão, até que lhe chamassem a cuidar dos bêbados - já falecidos - lá do outro lado da vida.