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Ela procurava passar a imagem de uma atendente atenciosa e gentil. Frequentemente recebia galanteios de grande parte da freguesia masculina. E, quando a conversa tomava rumo diferente, pedia licença para atender outro freguês. Nunca se apresentava como proprietária da Suport Informatic. Talvez por medida de segurança, pois, não se sabe exatamente a intenção das pessoas que chegam a um  balcão de informática. Jovens buscam por uma Lan House nos fundos de uma loja de fachada, onde possam fazer apostas e navegar sites pornôs. Outros,  procuram por informações, afinal, informação e informática têm a mesma raiz, o mesmo conceito etimológico: prestar suporte a. Daí a loja chamar-se SUPPORT INFORMATIC — um jogo etimológico com tom americanizado, para desviar a atenção do MADE IN CHINA gravado na embalagem e no fundo das peças que ela vendia.

Muitos fregueses retornavam, sob o falso pretexto de fazer levantamento de preços e compravam alguma coisa barata de que não necessitavam. Tudo para ver aquela encantadora balconista, repetir a mesma frase: “Volte sempre...”

 Os lábios carnudos da vendedora, contornados com batom mel-avermelhado tinham curvatura semelhante a dois acentos circunflexos, um com o vérticepara cima e o outro com vérticepara baixo, ligeiramente abertos, prontos para jogar um beijo. Todo dia ela pegava o metrô no Largo do Machado e descia na Estação Carioca. Via pessoas apressadas. Rostos de diversas feições, feições de diversos rostos fervilhavam na rua como formigas em formigueiro. Pobre Talita, morta de desgosto e cheia de tristeza de ver sua mocidade desabar como uma estrela cadente... Estava  cheia de vontade de dizer à rosa dos ventos que a vida não presta. Que as pessoas são árvores que andam, criaturas artificiais que vivem a mesmice do dormir e acordar, uma rotina, um caminho que não leva a lugar nenhum. Ou não. A vida é uma grande tela pintada com estilo e arte, uma paisagem de gente de todas as raças, mulheres de todas as taças à procura de marido. Há homens de short e de camisa regata, outros de terno e gravata, pendurados nas barras do trem como roupas no varal.Ela não pleiteava um herói de pancadaria em  teatro de mamulengos. De modo algum  invocaria frei Gaspar de Santo Antônio, mas o próprio Santo Antônio casamenteiro de Pádua para lhe conseguir um marido. E, embora não alimentasse sonhos de princesa, queria um casamento simples, com poucos convidados e uma banda tocando a valsa nupcial. Queria se casar na noite, na rua, no céu, no mar, mesmo e ainda que fosse com um vesgo, até mesmo um galo-de-campina... Estava cansada de comprar os beijos de Valdivino com o salário da loja.

Era festa do padroeiro  o coração acelera: dindãodindãodindão. O sino toca anunciando Deus  na  Trindade  de  três notas Teo-Deo-Céu. A lira  de dez cordas recorda os Dez Mandamentos como eco gravado, no coração. Bate o sino no campanário: dim... dão... dim ...dão. Toca o coração da menina badalando igual sino dim...dão, dim...dão.Bate o badalo, toca o sino bate o coração-menino na  festa do padroeiro.O sacristão toca o sino. Dim... dão... dim...dão... O vigário começa a procissão. O coração bate igual sino: Dim...dão...dim dão. Na festa do padroeiro o santo casamenteiro promete para o solteiro um par para seu coração dindãodindãodindão.