Amor

Todos estavam a encará-lo. Mas por quê? Qual seria o motivo para tantos olhares de reprovação? Ele era apenas um homem. Havia nascido no Rio de Janeiro, onde cresceu e viveu até os 21 anos. Sempre fora bastante esforçado e estudioso, além de muito gentil. Apreciava as profundezas das pequenas coisas da vida, assim como a família e a música. No início de sua puberdade, notou algumas diferenças em relação aos outros garotos de seu convívio, porém não achou que isso mudaria alguma coisa pois, afinal de contas, ele continuava sendo um garoto como todos os outros.

O fato é que, com o tempo, as coisas foram mudando. O medo invadiu-lhe de tal forma que faziam-no sentir vergonha às vezes da própria imagem no espelho. Colocavam-no de lado; atingiam-lhe com anedotas; faziam-no recolher-se por cantos e mais cantos a olhar para o alto e pedir perdão por sem quem era. Ele se fechava. Esgueirava-se pelas ruas, andando por entre as sombras. Sentia-se posto à margem do sistema ao qual ele deveria pertencer.

Oras, ele era humano! Ele era um homem. Mais gentil que qualquer outro que pensasse diferente dele e que se julgasse superior. Ele era um homem forte e nem por isso deixava de lado sua sensibilidade aflorada. Ele também tinha seus direitos, seus sonhos e suas vontades. Era respeitoso, responsável e lutava por causas sociais. Ele era um ser humano digno de um olhar fraterno, como qualquer outro com tal personalidade.

Passou os olhos por sua volta e finalmente enxergou a impureza. A impureza que viam nele estava, na verdade, nos olhos dos outros. Aqueles olhos, vindos de corações carregados e cheios de ódio, incapazes de olhar a beleza onde ela realmente existia. Aqueles seres que se rastejavam pelas ruas a apontar os dedos sujos a homens como ele.

Por que olhavam-no com tanto desprezo? Ora, os seres humanos não são tão apegados ao amor? E que mal existe ali, então? Aquilo também era amor. Amor puro, terno e verdadeiro. Amor entre duas vidas, fossem elas quais fossem. Amor entre a pessoa que estava ao seu lado - naquele banco de praça - e ele. Aquela cena deixava de ser retrato de amor, então, apenas porque quem estava ao lado daquele homem era - não uma mulher - mas também um homem? Não, não deixava. Eram aqueles seres cheios de ódio que deixavam de ser humanos ao não conseguirem enxergar naquele banco uma das mais sinceras formas de amor.

(texto dedicado à luta contra a homofobia, feito especialmente para todos os homossexuais que já sofreram ou sofrem algum tipo de preconceito na sociedade. A todos vocês, o meu carinho)

Dona Iaiá
Enviado por Dona Iaiá em 31/03/2013
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