Humpf!

O pior castigo que o chefe poderia dar seria me mandar ao banco às três e meia de uma sexta-feira. Seria pior que mandar fazer o café. Seria pior até que hora extra no sábado. Enfim, seria o pior castigo que existe. E ele fez isso justamente depois de passar o dia todo me atazanando:

- Marcinho, cadê os papéis que pedi pra você pegar pra mim?

- Deixei na sua mesa, doutor Fonseca.

- Marcinho, onde você tava agora a pouco? Procurei e não te encontrei em nenhum lugar.

- Tava no banheiro, doutor Fonseca.

- E por acaso você ficou os últimos quinze minutos lá? Você tá com dor de barriga, é? Marcinho, Marcinho, tô de olho em você, menino.

- Sim, doutor Fonseca.

- Você ainda está aí Marcinho? Eu não te mandei ir ao banco?

Cheguei ao banco em uma correria só. E pra variar, a fila estava enorme. Desisti até de contar quantos estavam na minha frente, pois acima de trinta pessoas só desanima a gente. E nem me lembrei de trazer algo pra ler, para fazer o tempo andar mais depressa. Eu até nem me importaria de pegar uma fila quilométrica se todos os que estivessem lá fossem uns Marcinhos da vida como eu. Mas nem todos são assim. É aquela velhinha que tem preferência, que passa na sua frente com cinqüenta papéis para pagar.

- Ô tia, idoso tem preferência mas isso aí já é abuso!

- Eu estou no meu direito.

- Sei, e a senhora quer que eu acredite que todos estes impostos de empresa são seus? Garanto que alguém lá fora te deu déizão pra senhora vir pagar as contas dele. Fala sério, acertei ou não acertei?

- Humpf!

- Humpf!

E ainda dizem que existe lei pra acabar com a fila. Que o banco é multado se demorar mais que trinta minutos. Mas pra onde vai essa multa? Pro meu bolso é que nunca veio! E onde está este pessoal do PROCON numa hora dessas, quando mais precisamos deles? Vai ver lá no PROCON também tem fila nas sextas-feiras à tarde.

Se pelo menos houvesse algum conhecido na fila pra quebrar esse galho pra mim. Afinal, são só duas continhas pra pagar e um depositozinho pra fazer. Mas não vi nenhum rosto familiar. Enquanto isso, uma morena espetacular abordou o cara que estava na minha frente e pediu para ele pagar uns papéis pra ela. Não resisti.

- Oi.

- Oi!?

- Você tá entrando na minha frente também, mas você eu deixo, viu princesa?

- Obrigada.

- Será que não rola o número do seu celular não?

- Que isso cara! Você tá mechendo com a minha namorada? - encrencou o cara da frente, que não era maior do que eu, mas parecia bem mais nervoso.

- Nã-não, é só uma brincadeira. É pra descontrair a fila.

- Sei. Humpf!

Ufa, dessa vez fora por pouco. Brigar depois de tanto tempo na fila, seria perigoso até o segurança me colocar pra fora. O que eu iria dizer depois pro doutor Fonseca? Mas esse mané iria ver só se a gente estivesse lá fora. Ah, o bicho iria pegar pro lado dele! Encheria a cara dele de porrada, isso sim!

Uma hora, trinta e sete minutos, doze segundos e alguns milésimos depois, chegou a minha vez. O banco já fechou, e eu olhei com ar de superioridade para o último da fila. Coitado! Eu estarei quase em casa e ele ainda estará nesta fila. O bom é que poderei ir direto para casa e terei a desculpa pro seu Fonseca que fiquei no banco até depois das seis. Afinal, todos sabem como é fila de banco na sexta-feira.

O importante mesmo são aqueles segundos que a gente espera antes do caixa chamar "Próximo!" e que são como esperar por uma recompensa dada aos ganhadores das Olimpíadas. Aproveitamos cada momento, olhamos para cada rosto, todos pensando como sou sortudo. Ainda divagando nesses pensamentos, ouvi uma voz alta atrás de mim:

- Todo mundo parado, isso é um assalto! Vão colocando as carteiras, bolsas e celulares aqui nesta sacola.

Eu não acreditava. Isso não poderia estar ocorrendo comigo. Não ali. Não naquele momento. Meu coração disparou, meu rosto começou a suar, não ouvi mais nada, minhas pernas começaram a andar automaticamente até o cidadão.

- Pára aí moleque, senão meto uma bala em você!

Com um golpe rápido e certeiro não sei como, tomei a arma do bandido. A minha raiva era tamanha que só consegui dizer:

- Vai pro final da fila e fica quieto, que agora é a minha vez. Depois que eu pagar as minhas contas, te devolvo o revólver. Ora essa. Humpf!